26- Ladeira Abaixo

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O tempo parece não passar dentro dessa história, é repetitiva a ideia, mas é verídica, afinal, era essa a sensação que eu tinha na vida real. Sophia havia ficado sem falar comigo e isso havia me deixando triste, pois realmente gostava daquela pirralha mimada de vinte anos, mas cria que seu motivo era muito fútil e bobo e que não podia baixar a guarda, eu não faria nada de errado, principalmente com ou contra ela em especial.

No intervalo da aula de quinta-feira, dia vinte e três de junho de 2016, chamei, ou fui chamada por Alice, para irmos lanchar no Subway, como já havíamos feito antes. Sabia que ela gostava, já que era vegetariana, quem não gostava era eu, mas isso não importava não é mesmo. Quem pagava o lanche? Na maioria das vezes eu porque sou dessas e não falo pra reclamar da menina, falo apenas pra mostrar mais um pouco sobre o como eu sou, porque tudo que fiz, fiz porque quis, porque queria agradar, gostava de vê-la sorrir e sabia que, devido a sua depressão e seus demais problemas, sorrir era algo que fazia pouco.

Não me lembro se comentei, mas uma vez ela me disse que nunca está bem, por mais que esteja sorrindo e brincando, ela nunca está bem e todo momento de felicidade que sente depois se transforma em tristeza, como se não merecesse ter vivido algo bom, então lhe proporcionar algo agradável sempre me fazia me sentir bem, independente da putaria, literalmente sexual, que sonhava em fazer com ela.

Lanchamos, como sempre ela montou o sanduíche num pão grande que seria dividido pra nós duas, sempre também com um cookie de, e com gotas de, chocolate. Não lembro como o assunto surgiu a respeito da minha desavença com Sophia, mas Alice me perguntou o porquê de estarmos sem nos falar... gelei... afinal, o motivo a envolvia. Fiquei apreensiva, mas acabei dizendo:

– Ela ficou puta porque me chamou pra fazer alguma coisa com ela no domingo e eu disse que não podia porque ia na sua apresentação, aí ela não gostou e disse que não queria que eu fosse.

– Mas por que ela não queria? – A partir daqui eu já estava suando frio.

– Ela sabe o que eu sinto por você. – Confessei.

Juro que gostaria de lembrar exatamente as palavras que foram ditas e ouvidas, não que tenham sido muitas, mas realmente gostaria. Confesso que aquele segredo estava me consumindo, eu estava começando a sentir uma fidelidade à ela que nem sabia de onde vinha se há poucas semanas meu coração girava em despeito e chateação, mas estava sentindo e achava que não devia ter contado sobre a gente pra Sophia porque poderia estar colocando-a em risco e meu desejo sempre era de protegê-la, inclusive de mim, se fosse possível, por mais contraditório que isso fosse em relação a várias de minhas ações.

– O que mais você contou? – Ela me perguntou.

– Nada. – Menti. – Falei do que eu sinto, falei que te quero, mas não falei do que houve. – Respondi séria enquanto a olhava.

Aquela foi a única vez em que realmente menti pra Alice, mas do jeito que estava a conversa, na verdade por como estava sua expressão facial, tive medo de que aquela informação piorasse ainda mais as coisas. Pra mim Sophia era inofensiva e não falaria nada, pensava que poderia confiar nela, mesmo que não fosse um pensamento livre de desconfiança, e não sei mesmo o que deve ter acontecido por trás dos bastidores antes ou depois disso... – Respirou fundo. – infelizmente eu só tenho como saber o que houve na minha história, o que nem sei direito, mas só tenho como saber o que houve aos meus olhos.

– Não podia ter falado pra Sophia, ela vai falar disso pros outros, ela não é de guardar as coisas. – Reclamou Alice.

– Calma, acho que não vai fazer isso não, se fosse pra fazer já teria feito, de qualquer forma não vai te prejudicar e se alguém insinuar algo a gente nega.

Alice sabia que eu estava apaixonada por ela, sabia que a queria, falei com todas as letras e palavras, Sophia também sabia, inclusive que havíamos tido um envolvimento sexual, mas agora Alice sabia que Sophia sabia do que eu sentia... é muito "sabia" num parágrafo só, mas a história é tão complexa quanto, só sei que estava rolando uma aproximação entre elas e o que eu não sabia era o que motivava tudo aquilo... amizade pura?... interesse sexual de alguma das partes?... interesse invejoso/vingativo de alguma das partes?... ambas as últimas opções?... todas as opções?... nenhuma das opções?

Subimos atrasadas pra última aula de história que teríamos antes da prova. Entramos na sala, ela já estava escura por causa do vídeo que seria apresentado e os demais já estavam sentados, com isso fomos para o fundo, onde haviam duas cadeiras de plástico sobrando.

Nossa sala era retangular, as cadeiras estavam encostadas em uma das paredes maiores enquanto o vídeo seria passado numa das pontas da sala, com isso eu acabava ficando virada pra Alice, pois me sentei na última cadeira. Lembro que apoiei meu cotovelo no encosto da cadeira dela e lembro dela me olhar, umas duas vezes, dentro daquela escuridão, e sorrir... não sei se só eu sentia, mas eram em momento assim que parecia haver algo no ar, um clima talvez, mas podia ser apenas o meu sentimento me fazendo enxergar coisas que não existiam, por isso falo com um pesar, não com orgulho, pois, como diz a letra de uma música "o Destino deve estar nos olhando, com aquela cara de quem diz: eu tentei, juntar vocês dois. O Destino deve estar nos olhando, decepcionado... que pena... que pena".

Amanda me fazia tanta falta... tanta coisa acontecendo, nós nos falávamos todos os dias como sempre e não podia falar de nada do que estava me acontecendo, lhe contava apenas do trabalho, que por sinal estava um inferno, meu chefe/tio estava cada vez mais aborrecido com meus horários, lembrando, ou informando, que ele foi um dos motivos que me fizeram trocar pro turno da noite.

Eu sabia que seria demitida a qualquer momento e minha cabeça estava surtando pensando na mensalidade do curso e ainda tinha toda essa outra história me angustiando... sentia muita saudade de Amanda, mas Amanda ainda me amava e estava começando a me revelar isso... minha melhor amiga ainda me amava depois de dois anos de rompimento enquanto eu estava sofrendo por outra pessoa sem ela saber... sem ela poder saber... eu não sabia o que fazer, sobre nada, ou sobre tudo, me sentia sobre uma bicicleta sem freio descendo ladeira abaixo... minha idade?... estava a dez anos com a mesma idade, era o que sentia, pois o tempo... ah o tempo... ele não passava.


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LGBT - Aos Meus Olhos - 2016 Parte 1Where stories live. Discover now