Capítulo 42

1.9K 195 41
                                    

Pov's Liz Gray

Nove dias se passaram rapidamente, então o meu aniversário chegou.

Na manhã do dia 10 de fevereiro, quando acordei, não me senti diferente, nem ao menos me senti adulta.
Só tinha aquela sensação estranha de que era um dia diferente. Não especial, apenas diferente.

Nunca gostei de aniversários.
Porque a minha família fica em cima de mim o dia todo, como se fosse grande coisa, e porque nunca tem muita gente que se lembre.
É um pouco triste que todo ano só a minha família se lembre do meu aniversário. E teve uma vez que até o Lucas se esqueceu.

É o preço á pagar por ser tão insignificantemente insignificante no mundo.

Pela janela pude ver que o dia amanheceu naturalmente cinzento como em toda manhã de fevereiro, mas sem chuva ou neve. O que, na verdade, é uma coisa bem dificil de acontecer nessa época do ano, então o dia começou bem.

Suspirei e enterrei a cabeça nos travesseiros. Odeio ser o centro das atenções, detesto ser abraçada, detesto ter que ouvir aquelas coisas chorosas sobre estar crescendo e ter orgulho que a minha mãe sempre diz. Odeio a indiferença do meu pai e o fato dos meus aniversários serem uma droga.
E por mais que eu tente, ninguém me deixa esquecer que é o meu aniversário.

Lá embaixo a minha mãe deve estar finalizando um bolo de baunilha com recheio de creme, o meu preferido, e aposto que tem um embrulho ao lado do bolo. É a única parte desse dia em que me sinto feliz. Não pelo bolo ou pelo presente, mas porque a minha família ainda não desistiu de mim mesmo que eu não dê a devida atenção á tudo isso, todos os anos.

Decido que tenho que me levantar de uma vez. O despertador no meu criado-mudo marcava 8:54, o quarto estava relativamente claro porque as cortinas da janela já estavam meio abertas e Beatrice não estava mais na cama.

Calcei as minhas pantufas rosa e desci, ainda de shorts largos de pijama e uma camiseta branca que dizia Bazinga!, que comprei em uma lojinha barata.

A exata cena que imaginei foi a que encontrei lá em baixo.
Papai estava na cabeceira da mesa comendo um pãozinho, mamãe arrumava uma cereja em cima do bolo, e Beatrice e Harry tinham xícaras nas mãos.
Me surpreendi ao ver Harry ali tão cedo, ele é sempre o último a acordar.

Quando entrei na cozinha não houve um coro de "parabéns para você", eu pedi para minha mãe parar de cantar quando fiz doze anos, ao invés disso mamãe apenas me abraçou. E em seguida Beatrice e em seguida Harry.

- Feliz aniversário, linda. - Harry sussurrou no meu ouvido, eu corei e murmurei um "obrigada".

- Vem aqui, Lizzie. - o meu pai chamou. Me inclinei para ele, e ele me abraçou.

O seu abraço é tão desengoçado quanto o meu, e eu quis desesperadamente acabar com o clima sentimental entre família. Mas eu curti o abraço do meu pai. Só acontece uma vez por ano, quando ele se vê obrigado a fazer isso.
Nem no natal isso acontece.

- Feliz aniversário.

- Obrigada pai.

- Certo, senta e come o seu bolo. - a minha mãe disse e eu me apressei a sentar. Amo esse bolo e o meu estômago está roncando.

- Aqui o seu presente. - ela me passou um embrulho pequeno e retangular antes de cortar um pedaço de bolo.

- Obrigada gente. - sorri para eles.

Abri o embrulho com carinho e com as duas bochechas coradas, e descubro que o meu presente é um...celular novo?

Estava esperando um livro ou algo mais barato. Isso, isso deve ter custado uma fortuna.

- Mãe. - falei em tom repreensivo - Obrigada, mas isso deve ter custado uma fortuna!

- Não pense nisso.

- Mãe...

- Apenas aceite, Liz. - estranhamente foi o meu pai quem disse.

Depois de uma pausa, em que encarei fervorosamente o meu pai, falei:

- Ok... ãh, obrigada. De verdade.

Abro a caixinha.
É um Iphone de última geração. Não quero mesmo pensar em quanto deve ter custado porque a minha família tem um orçamento curto e eu me sentiria super culpada se eles gastassem dinheiro que não tem comigo.

- Aqui o seu bolo.

- Valeu mãe. - sorrio e como um pedaço do bolo.

Sim. Ainda é o meu preferido.

*

Harry e eu estávamos sentados no sofá. Perigosamente perto.
E eu digo perigosamente, porque o meu pai estava na sua poltrona á apenas alguns passos de nós.

Mesmo assim ele não parecia se incomodar com a nossa presença. Ou mais especificamente com a presença do Harry.

A minha mãe sempre foi a desconfiada, a que vê problema em tudo. O meu pai sempre agiu como se não fossêmos problema dele, e eu prefiro pensar que ele faz isso porque somos, a maioria, meninas, e a mamãe, sendo uma mulher, sabe lidar melhor com todas nós. E não porque ele não da a mínima para o que acontece com a gente.

Eu estava configurando o meu novo celular, enquanto o Harry não estava fazendo nada de útil. Acho que ele só não tinha nada para fazer.

Alguns minutos depois, meu pai saiu da sala. Eu o segui com o olhar até a cozinha, onde ele pegou as chaves do carro no chaveiro e saiu batendo a porta.

Nem a minha mãe, nem Beatrice estavam em casa. Tinham acabado de ir á casa da Sra. Carter no bairro ao lado.

E depois que a porta bateu, eu me lembrei da época em que o meu pai estava descontrolado com o vício.
Ele bebia todos os dias. O dia todo. Todas a vezes que encontrava uma brexa de tempo livre ele ia para um bar qualquer. E A minha mãe tinha o díficil trabalho de tentar trazer ele de volta á si, porque Beatrice e eu éramos pequenas, e ela não podia trabalhar. Consequentemente, ela não podia deixar que todo nosso dinheiro ficasse em bares. Nunca fomos ricos.

Eu tinha seis ou sete anos, e ainda me lembro da bofetada que ela levou ao tentar impedi-lo de sair. Doeu em mim ver a cena, como se eu tivesse levado uma bofetada também.

Meu amargo devaneio acabou rápido, quando me lembrei que Harry estava bem ao meu lado.
A sua voz rouca me chamou a atenção.

- O que foi? - perguntei.

- Tenho uma coisa para te dar.

- Sério?

- Sim.

Harry enfiou a mão no bolso do jeans e tirou de lá uma corrente prata. Em seguida, ele estendeu a palma da mão e me mostrou um pingente de cruz.

- É... é pra mim?

- Sim.

- Ah Harry... Não precisava. Eu não te dei nada no seu...

- Não se preocupe com isso. - sorriu - Quer que eu coloque?

- Uh... sim. Por favor.

- Claro. Vira. - ele pediu e eu me virei de costas para ele. Ainda sentada no sofá, em cima dos meus próprios joelhos dobrados.

O coque mal feito que eu fiz de manhã facilitou a vida de Harry, e ele encaixou o feixo sem dificuldades.

Acariciei o pingente entre os dedos. Eu já tinha visto ela algumas vezes no pescoço do Harry, mas nunca fora nada demais até então.
Soltei a corrente. Ela era fria contra a minha pele e o pigente quase caiu dentro do meu decote avantajado.

Antes que eu pudesse pensar em qualquer coisa desagradável sobre o meu corpo, Harry me interrompeu com um beijo no ombro.

- A minha irmã me deu quando eu fiz dezessete anos. Eu não tirei ele do pescoço durante todo o ano que eu fiquei fora de casa.

- Isso é bonito, Harry. Tem certeza de que quer mesmo me dar?

- Sim. Não vou aceitar de volta.

*

Prisoners - h.sOnde as histórias ganham vida. Descobre agora