͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏39. beatriz ⋆✴︎˚。⋆

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A pequena Dandara está no banco traseiro da caminhonete. As enfermeiras dão tchau da entrada da maternidade. Estou com uma sacola cheia de amostras grátis aos meus pés. As mãos de Beto estão no volante. Mas estamos parados.

— Por que estamos parados?

Beto vira os olhos vermelhos para o banco de trás.

— Tem um bebê aqui dentro, Beatriz.

— Eu sei.

Ele engole em seco.

— Que loucura. Eles não deviam deixar a gente sair do hospital com um bebê. Nunca tive nem bichinho de estimação.

Eu não deveria rir do Beto. Na verdade, meio que dói fazer qualquer coisa que não seja ficar sentada bem paradinha, numa postura um pouco reclinada. Mas sua expressão frustrada e um tanto aterrorizada é tão pouco característica dele que não consigo conter uma risadinha. Cubro a boca para abafar o som, porque nas quarenta e oito horas desde o parto aprendi rapidamente que sono é um bem precioso e escasso demais para pais de primeira viagem.

— Adoro saber que é você que está em pânico. Liga o carro, Beto. A família atrás da gente quer ir embora.

Ele espia pelo para-brisa traseiro.

— Eles já têm dois filhos. Vamos seguir o carro deles.

— Não vamos.

De mansinho, me estico na direção da cadeirinha de Dandara e abaixo um pouco a manta, porque, embora ela esteja dormindo e eu não tivesse nada que perturbá-la, quero ver seu rostinho bonito e enrugado de novo. Ela está com a boquinha ligeiramente entreaberta e os punhos cerrados ao seu lado.

— Vamos pra casa — digo com firmeza. — Quero abraçar minha filha.

A sensação de vazio nos braços é estranha. Sim, é isso mesmo, Beto e eu temos só vinte e dois anos de idade. Não temos empregos estáveis. Moro com uma avó rabugenta e um padrasto nojento. Beto mora com um cara cujo sonho é ser figurante no seriado Entourage. E agora temos uma filha juntos.

Mas, olhando o rostinho bonito de Dandara, tudo o que consigo pensar é em como a amo e em como amo Beto.

Me acomodo de novo no banco e vejo Beto ligar a caminhonete e dirigir devagar. Ando mais rápido que isso, mas pelo menos estamos em movimento. Ainda assim, levamos cerca de quarenta e cinco minutos para chegar em casa, porque Beto mantém uma velocidade constante de dez quilômetros abaixo do limite.

— Minha surpresa foi que você não acelerou nem quando o policial mostrou o dedo do meio e buzinou.

— Aquele idiota deveria levar uma advertência — retruca ele. — Fica aí, vou te ajudar.

Nos últimos dez meses, aprendi que Beto tem mesmo um tesão em me ajudar a saltar da caminhonete, e, não vou mentir, estou me acostumando com isso.

Ele tem esse cavalheirismo antiquado. Sempre abre a porta para mim. Eu tenho que caminhar na parte de dentro da calçada, para o caso de um assaltante armado nos abordar de carro. E ele segura até o meu casaco para eu vestir.

Mamãe Sobral fez um bom trabalho. Tenho muito que aprender com ela. E, como estamos presas uma à outra pelo filho dela e por esta criança, decidi que a gente vai se dar bem. Não importa quantas farpas ela dispare na minha direção, vou engolir e provar a ela que sou boa o bastante para ser a mãe da sua neta.

— Será que eu devo colar um daqueles adesivos de “bebê a bordo”? Assim os babacas atrás de mim podem aprender a ter um pouco de paciência, em vez de enfiarem a mão na buzina como se estivéssemos no meio de uma merda de uma emergência — resmunga Beto, enquanto me ajuda.

A Conquista | BETRIZ Where stories live. Discover now