͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏26. beatriz ⋆✴︎˚。⋆

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O telefone pesa como um tijolo nas minhas mãos. Tenho que marcar a curetagem logo, ou vou perder o prazo. Merda, devia ter feito isso há um mês. Estamos quase no final de fevereiro, e já estou com quinze semanas. Não sei por que demorei tanto.

Quer dizer, sei. Porque não consigo me decidir. Metade do tempo, acho que vou ficar melhor sem uma criança. O resto do tempo, não consigo tirar a imagem do caixão de Beau da cabeça.

Sinto o rosto molhado e, irritada, limpo as lágrimas com uma das mãos. Ótimo. Estou chorando em público. Seria de imaginar que eu já tinha chorado tudo o que podia chorar no velório de Beau. Aquilo foi muito difícil.

Sabia que ia ser má ideia estudar no Starbucks hoje, considerando como meus hormônios têm me deixado nos últimos tempos, mas não queria estar em casa se finalmente criasse coragem de ligar para a clínica. Ainda não contei da gravidez para a minha avó e não queria que ela descobrisse.

Pela primeira vez na vida, me sinto completamente perdida. Não vejo Beto desde a nossa caminhada no parque, e faz mais ou menos uma semana que parei de responder a suas mensagens. Nos últimos dias, não tenho conseguido me concentrar em nada além da decisão iminente.

E não é só Beto que tenho evitado. Só fui a um almoço semanal com Hope e Cora desde que Beau morreu. Tenho posto a culpa no aumento das horas de trabalho, mas acho que elas não estão acreditando.

— Beatriz?

Ergo a cabeça. Joanna Maxwell está de pé diante da minha mesa. Está com uma xícara de café numa das mãos e uma bolsa branca bonita na outra. Vestida com seu casaco de lã azul-marinho, ela parece mesmo a estrela da Broadway que um dia vai ser.

— Joanna. — Fico de pé e lhe dou um abraço. — Como você tá? — Seus ossos parecem galhos finos sob o meu toque. Dou mais um aperto antes de soltá-la.

Ela sorri palidamente.

— Vou indo.

— O que está fazendo em Boston? O musical tá viajando o país?

— Não, continua em cartaz em Manhattan. — Um rubor lento sobe por seu pescoço. — Eu… hã… saí da peça.

O espanto me cala por um segundo.

— Saiu?

— É. Tive uma oportunidade de fazer uma coisa diferente e aceitei. — Suas palavras são um misto de rebeldia e constrangimento, como se ela estivesse cansada de ter de justificar suas escolhas, o que certamente não tem a ver comigo.

— Ah, que bom!

Mas estou confusa, porque quando eu saía com Beau ele dizia que trabalhar na Broadway era o sonho de Joanna.

— Não é? Sou jovem, então, se existe uma hora para experimentar coisas novas, é agora.

Experimentar coisas novas me apavora, mas concordo com a cabeça, porque não sou a menina que perdeu o irmão querido.

Sou só a menina grávida.

— Com certeza. O que você vai fazer?

— Tô gravando uma demo — admite.

Não faço parte da galera das artes da Briar, então não tenho ideia do que ela está falando.

— Ah. Legal.

A incompreensão deve estar bem evidente no meu rosto, porque Joanna acrescenta:

— É basicamente um material que posso mandar para o pessoal que faz pesquisa de talentos nas gravadoras. Eles vão ouvir, e, espero, alguém vai me oferecer um contrato de gravação. Se não funcionar, vou cantar covers e publicar no YouTube, talvez tentar ganhar visibilidade assim. Tá tudo meio em aberto.

A Conquista | BETRIZ Where stories live. Discover now