͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏07. beatriz ⋆✴︎˚。⋆

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Nem sei onde mora atualmente. O que sei é que não existe razão nenhuma para Ray continuar morando aqui. Ele não é meu pai — o privilégio é do canalha que abandonou minha mãe depois de engravidá-la — e com certeza não é da família. Acho que a única razão pela qual vovó o mantém por perto é porque o seguro-desemprego dele paga um terço do aluguel. Imagino que transe com ele pelo mesmo motivo. Porque ele é conveniente.

Mas, Deus, ele é tão inútil que acho que até os vermes torceriam o nariz para ele. Quer dizer, se vermes tivessem nariz.

Só quando a mesa está posta e o macarrão fumegante pronto para ser servido é que Ray se senta.

— Cadê o pão? — pergunta.

Vovó pula da cadeira.

— Droga. Tá no forno.

— Pode deixar — digo a ela. — Senta aí.

Por mais que os comentários grosseiros da minha avó machuquem, a mulher me criou, me vestiu e me alimentou, enquanto Ray ficava sentado com aquela bunda nojenta, fumando maconha e se masturbando na frente da TV.

Lanço um olhar para trás e noto, pela primeira vez, um envelope branco enfiado dentro de sua calça de moletom. No mínimo é uma conta. A última vez que Ray escondeu uma conta da gente (porque tinha visto um monte de pornô no pay-per-view), ficamos com três mensalidades atrasadas para pagar. Nosso orçamento só funciona se não tivermos esse tipo de surpresa inesperada.

Tiro os pães do forno, coloco numa cesta e levo para a mesa. Ao me sentar, puxo o envelope das costas da calça de Ray.

— O que é isso? — pergunto, balançado a carta no ar. — Alguma conta?

— Você não andou assistindo àqueles programas sujos de novo, andou, Ray? — Os lábios de minha avó se curvam para baixo.

Ele fica vermelho.

— Claro que não. Já falei que não vejo mais essa merda. — Então se ajeita na cadeira e me lança um sorriso zombeteiro. — É pra você. — E arranca o envelope das minhas mãos para esfregar debaixo do nariz. — Pra mim, tem cheiro de gente rabugenta e metida a besta.

Um vislumbre de vermelho na beirada faz meu coração bater mais rápido e me jogo na direção do envelope, mas Ray afasta o braço, fazendo com que eu tenha que me espremer contra ele. Meu Deus, odeio esse cara.

— Dá a carta pra ela - exige minha avó. — A comida tá esfriando.

— Tava só brincando — devolve ele, deixando o envelope cair junto do meu prato.

Meus olhos se fixam no brasão carmim no canto superior esquerdo.

— Abre — instiga minha avó.

Seu tom tem um quê de ansiedade. Ela pode zombar da minha educação inútil e de meus sonhos ridículos, mas acho que no fundo está vibrando. Pelo menos isso vai servir para esnobar as mulheres no cabeleireiro, cuja netas estão tendo filhos em vez de entrar para Harvard.

Seu tom tem um quê de ansiedade. Ela pode zombar da minha educação inútil e de meus sonhos ridículos, mas acho que no fundo está vibrando. Pelo menos isso vai servir para esnobar as mulheres no cabeleireiro, cuja netas estão tendo filhos em vez de entrar para Harvard.

Só que... o envelope é tão fino. Todas as minhas cartas de aceitação para a faculdade vieram em envelopes gigantes, cheios de brochuras bonitas e catálogos.

— Ela tá com medo. Provavelmente não passou. — As palavras de Ray estão imbuídas tanto de desdém quanto de alegria.

Pego a carta e rasgo o envelope com a faca dele. Uma única folha de papel cai lá de dentro. Tem vários parágrafos, nenhum dos quais leio por inteiro porque estou só passando o olho em busca das palavras mais importantes.

A Conquista | BETRIZ Where stories live. Discover now