͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏ ͏06. beto ⋆✴︎˚。⋆

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O treinador apita e nos dispensa, e o treino acaba de forma positiva. Mais ou menos. Os jogadores da defesa são convidados a ficar até mais tarde, como de costume, e não deixo de notar a frustração nos olhos de Basilio e Ronaldo. O’Shea precisa pegar leve, se quiser ganhar o respeito do time.

No vestiário, tiro a camisa suada e os protetores e deixo cair a calça do uniforme no chão reluzente. As instalações aqui são de última geração. O vestiário é enorme, com armários de couro acolchoado e sistema de ventilação de alto nível. Quase não se sente o cheiro de meia velha.

Ulisses aparece do meu lado e tira o capacete. O cabelo escuro está molhado de suor e grudado na testa. Quando ergue o braço para afastar a mecha do rosto, vejo as labaredas tatuadas em seu bíceps. Elas quase me deixam com vontade de fazer uma tatuagem também, mas aí me lembro da cagada que Henry fez na perna depois da nossa primeira vitória no Frozen Four. Três anos depois, ele passa a maior parte do tempo de meias compridas para esconder.

— Acha que um dia a gente vai lembrar como se joga hóquei de novo? — pergunta, com ironia.

Rio, desanimado.

— A temporada acabou de começar. Vai dar tudo certo.

Ele não parece convencido. Nem Luis Claudio, que se arrasta pelo vestiário com um olhar amargurado.

— A gente só piora — rosna o calouro e, em seguida, bem ao estilo de um garoto de dezoito anos, arremessa uma das luvas contra a parede.

Dou uma olhada em volta depressa e suspiro de alívio quando não vejo o treinador. O homem ia ter um troço se visse um de nós fazendo cena no vestiário.

— Relaxa, garoto — diz Henry Hollis, aluno do terceiro ano. Está sem camisa e abrindo a calça. — Quem liga que a gente perdeu um treino coletivo?

— Não é só o treino — retruca Topete. — É que a gente é uma merda.

Henry deita a cabeça de leve.

— Você transou ontem, não transou?

O calouro de cabelos escuros franze a testa.

— O que isso tem a ver?

— Tudo. A gente passou vergonha naquele jogo, apanhou feio, e ainda tinha uma fila de mulher pronta pra te chupar. Ganhar ou perder, não importa — somos jogadores de hóquei. A gente manda nesta faculdade, cara.

— Você fala como se não tivesse ambição — comenta Ulisses, tentando conter o riso.

Henry dá de ombros.

— Ei, nem todo mundo tem tesão em virar profissional que nem você. Tem gente aqui muito feliz de fazer isso só pra pegar mulher.

Um suspiro pesado ecoa da outra ponta do banco comprido que se estende diante dos armários. Colin “Fitzy” Fitzgerald, um gigante do terceiro ano, com o cabelo desalinhado e mais tatuagens que um motoqueiro, se aproxima e dá um tapa na bunda de Henry.

— Você não sabe falar de mais nada? — pergunta Fitzy.

— Pra quê? Pegar mulher é a melhor coisa que tem.

Ele tem razão. Infelizmente, não vou saber o que é isso por pelo menos… o quê, um mês? Dois? Não sei quanto tempo meu pau vai precisar para esquecer Beatriz Dourado. Se ficasse com alguém agora, ia só comparar a menina com Beatriz, e isso não seria justo com nenhum dos envolvidos.

— Ah — começa Henry, de repente. — Falando em mulher…

Ulisses revira os olhos. Sem disfarçar.

— Vou dar um pulo em Boston esse fim de semana — continua Henry. — Ficar na casa do meu irmão. Alguém topa? Beber, ir numas baladas, pegar geral. Vai ser demais.

Nosso capitão fecha a cara.

— Tem jogo no sábado.

Henry o dispensa com um gesto da mão.

— A gente volta antes.

— Acho bom. — Ulisses dá de ombros. — Mas não posso ir. Já marquei com a minha namorada este fim de semana.

Seu rosto adquire uma expressão distante, uma mistura de admiração e felicidade pura, e ele segue para o chuveiro.

Reprimo a inveja que me sobe até a garganta. Faz um ano que Ulisses e Glorinha estão juntos, e parece que essa aura de amor nunca vai se desgastar. Ele está tão apaixonado pela namorada que é quase enjoativo. O mesmo vale para Ronaldo, que recentemente voltou com Camila e se declarou para ela num programa de rádio.

Parece meio… errado, acho, que os dois maiores pegadores que conheço tenham sossegado. De todos nós, sou o cara que mais curte compromisso. Quando entrei para a Briar, achei que na semana do trote iria encontrar a mulher dos meus sonhos — a mulher —, namorar com ela pelos próximos quatro anos e a pedir em casamento depois da formatura. Mas as coisas foram bem diferentes. Namorei um monte de meninas, dormi com um monte delas também, mas nenhuma era a mulher.

E Ulisses e Ronaldo encontraram exatamente isso sem nem estar procurando, filhos da mãe sortudos.

— Beto? — insiste Henry. — Boston? Fim de semana só dos caras? Topa?

Minha primeira reação é dizer não, mas minha mente tropeça na palavra Boston. Sei que Beatriz disse que não queria me ver de novo, mas… Será que ela ia me dispensar mesmo se a gente se esbarrasse por acaso pela cidade? Quer dizer, ela mora lá, e como sei seu endereço… Quem sabe, né? Com uma pesquisa rápida na internet talvez consiga descobrir algum bar alucinante no bairro dela para ir com os caras. Talvez a gente se esbarre. Talvez…

Talvez você esteja virando um stalker?

Abafo um suspiro. Tudo bem, meu cérebro está definitivamente pisando em território perigoso. Mesmo ciente disso, não consigo me conter e respondo:

— Claro, tô dentro. Não me importaria de ver um jogo do Bruins num bar ou algo assim.

— Eu também — decide Fitzy. — Quero passar numa loja de video games no centro da cidade. Eles têm um jogo de RPG que não tô conseguindo encontrar em lugar nenhum na internet. Vou ter que dar o braço a torcer e gastar dinheiro.

O olhar horrorizado de Henry vai de mim para Fitz.

— Um jogo do Bruins? Uma loja de video games? Como é que sou amigo de vocês dois?

Arqueio uma sobrancelha.

— Prefere que a gente mude de ideia?

— Não. — Ele solta um suspiro. — Mas vocês podiam pelo menos tentar fingir que estão nessa pra pegar mulher.

Dou um riso de escárnio e um tapinha em seu ombro.

— Se isso faz você se sentir melhor, então tudo bem. A gente tá nessa…

Olho para Fitz, convidando-o a completar comigo.

— … pra pegar mulher — terminamos em uníssono.

A Conquista | BETRIZ Where stories live. Discover now