Além do Tempo

By GihCross_27

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O amor não escolhe clásse social, personalidade, etnia... não escolhe hora, nem lugar. Ele simplesmente acont... More

1 - O Encontro
2 - O Encontro part. 2
3 - Primeiro dia de aula
4 - Divergências
5 - Confusões de Sentimentos
6 - Sentimento de Mudança
7 - Conflitos
8 - Descobertas
10 - Orgulho Ferido
11 - Mesmos Erros de Sempre
12 - Condescendência
13 - Abstinêcia
14 - Amor a Prova de Balas
15 - Oceano
16 - Estou Pronta
17 - Voltando a Realidade e Conhecendo o Perdão
18 - Tudo ou Nada
19 - Decisão Tomada
20 - Minha Dona
21 - Cartas na Mesa
22 - Minha Rainha
23 - Toda Sua
24 - Acertando as Contas
25 - Tudo muda... Tudo passa
26 - Dores e Conquistas
27 - Um Pedido, A Viagem
28 - Noite Feliz
29 - Intolerância
30 - Londres
31 - Curtindo a Vida
32 - Lá Ville Lumière - A Cidade Luz
33 - Au Revoir!
34 - Certezas
35 - Sua Para Sempre!
36 - Lua de Mel e Outras Coisas
37 - Desprezo é a Arma
38 - Ponto de Impacto
39 - Vida que Segue
40 - Fidelidade
41 - Danou-se
42 - Sou Órfã!
43 - Descontração
44 - Noite na Boate e Despedida
45 - Noite das Garotas
46 - O Ano Em Que Ela Não Viveu
47 - Bons Ventos
48 - Promises of Love
49 - Recatada e do Lar
50 - Mais Um Ano
51 - Sonhos de Amor
52 - Naxos
53 - Antio Athína
54 - Cult
55 - Memórias
56 - Novos Caminhos
57 - Ciclos
58 - Desencontros
59 - Mary Margaret
60 - Febre
61 - Notícias
62 - Desenterrando
63 -Você é Minha Luz
64 - Acasos não são Acasos - part 1
65 - Acasos Não São Acasos part 2
66 - Visitante
67 - E o Tempo Seguia
68 Inconsequência
69 - Motivos
70 - Lutar
71 - Esperança...?
72 - Provações
73 - Confronto
74 - Destino
75 - Destino parte 2
76 - Reviravolta
77 - Transições
78 - Ansiedades
79 - Sombras do Passado part 1
80 - Sombras do Passado part 2
81 - O Preço da Vida
82 - Milagres do Paraíso
83 - Finaly part 1
84 - Finaly part 2

9 - Sentimento de Esperança

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By GihCross_27


Sábado seguinte Regina estava sozinha com Dolores, como habitual, e a aula foi bastante puxada. Estava distante de mim, mas achei que fosse a ansiedade por um bom resultado. 

A segunda prova de cálculo se aproximava, era muita matéria, e ela queria muito passar direto. Na hora do almoço, Dolores recebeu um telefonema urgente de casa e pediu para se retirar mais cedo. Disse que precisaria faltar na segunda e na terça. Regina permitiu e deu ordens para que André a levasse de carro em casa. Se seu pai reclamasse, ela assumiria a responsabilidade. 

Dolores agradeceu, não quis entrar em detalhes de seu problema e foi embora com André. A morena ficou em pé na porta vendo-a partir e depois entrou. Cheguei perto e parei em frente a ela.

- Será que aconteceu alguma coisa muito grave? Ela não quis entrar em detalhes e eu me preocupei. Será que precisará de dinheiro? Dolores vive tendo problemas e não são invencionices!

- Você saberá. Certos problemas vêm à tona a gente querendo ou não. – passei a mão em seu rosto. "Hoje eu vou jogar com tudo!" – Você é uma pessoa apaixonante, sabia? Sempre atenciosa e preocupada com todos.

Ela corou e virou o rosto para o lado: - Boba!

- E fica ainda mais linda coradinha.

- Pare, Emma… Você fica dizendo coisas assim para mim…

- Assim como? – virei seu rosto em minha direção novamente.

- Que sabe que mexem comigo.

Apoiei uma das mãos na porta e com a outra segurei seu rosto delicadamente, acariciando seu rosto com o polegar: - E são só minhas palavras que mexem com você?

Ela olhou para mim fixamente: - Pena é que nada mexe com você. – tirou minha mão de seu rosto e se afastou de mim.

- O que quer dizer? "Cuidado com o que vai dizer agora, Swan". Ela estava de costas para mim. Aproximei-me por trás e falei bem próximo ao seu ouvido: - Acha que… não sinto nada?

Se afastou e me olhou de frente.

- Seu corpo sempre sente. Seu coração é fechado.

- O que é isso, Regina? – não entendia porque dizia aquilo.

- Por que me beija e depois se afasta, agindo como se nada estivesse acontecendo? Percebo que parece evitar de me encontrar na faculdade. Você ficou duas semanas sem me ver e não me deu um telefonema sequer, Emma! – encostou-se à parede – Aposto que teve com quem passar o tempo.

- Por mais que eu tente você não sai da minha cabeça, será que não entende isso?

- Eu não entendo você!

Cheguei novamente perto dela e apoiei as duas mãos na parede. Curvei o rosto para perto do rosto dela e perguntei:

- Que parte de mim você não entende, linda?

- O que você quer?

Aproximei-me dela. Nossos lábios se tocaram levemente em um beijo que quase aconteceu. Beijei seu pescoço de cima a baixo. Beijei seu queixo, suas bochechas, sua testa. Puxei-a para junto mim, agarrando-a pela cintura, mordi sua orelha e sussurrei: 

- Você é especial, Regina! 

Começamos a nos beijar e nos perdemos assim por muito tempo. Levei-a até seu quarto e chegamos lá ainda aos beijos. Deitamos na cama e fiquei sobre ela. Apoiei-me com os cotovelos para não fazer peso e nossas pernas se entrelaçaram. Ela estava de vestido. Passei uma das mãos por sua coxa e ela me interrompeu quando senti o cós de sua calcinha. Subi a mão pelo abdômen e parei na base do seio sem saber se deveria continuar. O telefone toca. Nos assustamos e ela levanta da cama com um salto. "Maldito telefone que sempre me atrapalha!"

- Hello? André? Yes, quer dizer, sim. Stay here for… Fique um pouco aí com eles e ajude no que puder. Não, não vou precisar. Tchau.

Sentei na cama e sorri para ela.

- Calma, querida. André não pode ver pelo telefone. – rimos - Notícias de Dolores?

- Era com o pai dela. Parece que foi atropelado estava no hospital, mas receberá alta logo. Pedi para que André ficasse com eles. – sentou do outro lado da cama.

- Está com medo de mim?

- Acho que as coisas estão acontecendo rápido demais. Isso me assusta!

"Vai devagar, Emma, vai devagar!"

Reparei em uma bela foto onde ela, talvez com uns 13 anos, se encontrava no meio de um grande campo de girassóis. Estava com os cabelos soltos bagunçados pelo vento e um belíssimo sorriso.

- Que foto linda! Esse é o tal campo de girassóis que sua avó mandou fazer?

- Lembra-se que lhe disse isso? – perguntou surpresa. 

"Não sei porque, mas lembro de cada palavra que já me disse" - Sim eu lembro. É esse?

- Sim, é este. – levantou-se e pegou o porta retratos. - Vovó Granny esteve passeando pela França com meu avô, pouco antes de ele morrer, e ela amou a visão do amarelo sem fim dos girassóis franceses. Daí conversou com minha tia avó, Eva, elas são irmãs, e ambas gostaram da idéia de fazer um campo igual na fazenda. Acho que, no fundo, ela queria manter uma lembrança bonita dos últimos bons momentos passados com meu avô e a irmã fez uma gentileza à ela. Além do mais, o vovô George adorava aquela fazenda e fazia questão de que passássemos os natais sempre lá.

- Esta é a avó que você me falou que freqüentava a igreja contigo e que você gosta muito?

- Sim. Ela é mãe do papai. Ontem mesmo estivemos ao telefone por um bom tempo. Nós nos falamos toda semana. Morri de saudades e coloquei esta foto no porta retratos. Também são belas lembranças para mim.

- Quantos anos tinha? Imaginei uns treze.

- Pois acertou. – sentou-se ao meu lado.

- Seu avô morreu há muito tempo?

- No dia do meu aniversário de onze anos. - vi seu rosto entristecido e me deu vontade de abraçá-la, mas me contive, não queria lhe assustar mais depois do ocorrido entre nós.

- Que chato, Gina! - olhou-me pelo jeito que a chamei. - Como foi isso? Quer dizer, se você quiser tocar no assunto...

- Não tem problema. Foi do coração, que já andava mal. Ele era um homem muito nervoso, ansioso e o trabalho mexia muito com os nervos dele. Durante a era da Dama de Ferro ele vivia chateado com as decisões políticas de nosso país. Dizia que Tatcher estava entregando a Inglaterra para os Estados Unidos e tentava usar de suas influências para convencer outros militares a agir a seu lado. Ele acabou sendo forçado a...a...Deus, eu não sei a como dizer em português. Ele foi... uma pessoa que pára de trabalhar antes da época certa.

- Ele foi forçado a se aposentar. Ir para reserva, já que era militar. 

- Isso! Minha avó inventou a viagem à França para distraí-lo, mas não deu certo. Ficou muito nervoso, agitado, inconformado e daí, seis meses depois, morreu de ataque cardíaco.

- Eu entendo o que ele sentia. Vê este nosso governo brasileiro entreguista? Eu também fico doente! Vira e mexe eu me envolvo nos movimentos estudantis, junto à Ruby, aliás, como aconteceu em 91 e no ano passado. Deprimente é você ver seus representantes políticos entregarem o país nas mãos desses especuladores internacionais. Mas, e qual era a força armada e a patente dele?

- Ele era um dos mais antigos almirantes vivos da Royal Navy.

- Uau!

- Foi muito triste para nós perdê-lo. Ele e vovó sempre foram mais meus pais que os meus verdadeiros pais.

Segurei suas mãos e beijei-as.

- E pior foi quando você veio pro Brasil, porque acabou perdendo a companhia de sua avó. Não foi?

- Eu chorei muito quando soube que nós iríamos nos mudar.

Ficamos de mãos dadas.

- Eu entendo. A solidão sempre fez parte de minha vida e sei como ela é cruel. Minha avó me cria desde os meus cinco anos, mas não é muito ligada a mim. Conversamos pouco, ela nunca me deu muita abertura para me aproximar e me batia bastante. Acredita que só parei de apanhar quando fiz dezoito anos? – acabei rindo.

- Por que??? O que fazia para apanhar até os dezessete? – também riu.

- Ah, não tinha muito motivo. Na infância era por causa da minha "levadice" e na adolescência nem sei pelo que. Uma cerca diferente do que ela queria, uma parede mal pintada, uma louça sem enxugar direito, sei lá. Acho que ela me batia pelo hábito e depois perdeu a graça na minha maioridade.

- E seu avô?

- Morreu muitíssimo antes de eu pensar em poder conhecê-lo.

- Eles são os pais de quem?

- Minha mãe. 

- Ela tinha esses olhos verdes como os seus? - corei.

- Meu pai deveria ter. Não ela. Mas eu nunca a vi, nem por fotografia. Vovó foi quem me disse que seus olhos são negros. Parece que herdei dela a cor de pele e os cabelos e olhos do meu pai.

- Também não conhece a família de seu pai? – perguntou com muita delicadeza.

- Nada sobre eles.

Beijou-me o rosto carinhosamente.

- Você não tem culpa de nada, querida. – acariciava meu rosto devagar.

- Por que me diz isso, Regina? - falei baixo a encarando.

- Porque você tem vergonha disso. Não tenha! Foram as escolhas deles, os erros deles e não os seus. Você é uma pessoa maravilhosa que eles tiveram a infelicidade de não conhecer melhor.

Aproximei-me e a beijei nos lábios. Ela segurava meu rosto com as duas mãos e eu apenas toquei sua cintura de leve. Foi um beijo carinhoso e longo.

- Está diferente!

- Eu? Por que?

- Parece mais segura, como se não tivesse mais medo.

- Ainda morro de medo. Só estou disfarçando melhor... - sorri

- Eu gostaria de conhecer tudo de você. – disse timidamente e segurou minha mão.

- Quer passar o dia comigo amanhã no morro? Eu viria aqui cedo te buscar. Seria como daquela outra vez em que você foi lá.

- Minha mãe chegará em casa umas 22h, porque viajará amanhã saindo daqui às 8:00h. Se você viesse às nove, estaria tudo bem.

- Ótimo! Você veste uma roupa simples e confortável e eu te levo.

- Minhas roupas não são assim, Emma Swan? – disse com sua voz rouca e sorriu.

- Nada! Você é a mulher mais sofisticada, – beijei-a – linda – mais uma vez – e elegante que eu conheço. – beijei-a pela terceira vez.

- Obrigada, mas você deveria dizer moça. Não sou uma mulher. Não ainda. – beijou-me e se levantou.

"Não ainda, mas vai ser... e minha!" Olhei para o relógio.

- São 19:25h. Você disse que sua mãe chega às dez... – levantei-me e abracei-a por trás beijando-lhe o rosto  – Posso ficar aqui até umas nove e pouco?

- Não! É hora de você ir. – desvencilhou-se de mim.

- Por que??? – disse choramingando.

- Porque eu ainda não entendo nossa situação e não quero você aqui para continuar a me confundir.

- E tem que entender tudo?

- Sem rodeios, Swan.

- Pena que te ensinaram português tão bem! Eu poderia te enrolar mais fácil, do contrário.

- Eu aprendo rápido! – foi me empurrando até a porta de saída.

- Já notei. Pra quem nunca tinha beijado você me deixa doida.

- Quer deixar de ser cafajeste? – gargalhou e abriu a porta.

- Então estou sendo expulsa? – apoiei-me na porta.

- Sim. Até amanhã. – continuava sorrindo.

- Você não vai se despedir de mim assim. – agarrei-a pela cintura e beijei-a em cheio na boca. Ela acabou me empurrando, fazendo um charme que eu adorei.

- Go away, Emma! - disse manhosa. Por pouco não volto e a agarro novamente.

Fui embora feliz, sorrindo sem motivo. "Ela me quer. Ela realmente me quer!"

Naquela noite caiu uma chuva forte e entrou água em nossa casa por todos os lados. Veio ainda um mar de lama que cobriu boa parte do quintal e invadiu a cozinha e o quarto. Perdemos o armário, o fogão e quase todos os móveis da sala. Não pude dormir e passamos a noite tentando salvar algumas coisas. Pelo menos o beliche, a geladeira e meus livros escaparam ilesos e nem sei como. A TV também não foi atingida. 

Durante o dia, foi só o trabalho de tirar lama e água da casa, "desenterrar" o quintal e reconstruir a cerca. Perdemos três mourões e com isso não deu para colocar a cerca do jeito como era. Muita gente no morro passou por situação igual ou pior, havendo até barracos que caíram inteiros.

Reparei que minha avó trabalhava chorando discretamente e senti uma imensa dor em vê-la sofrer. Ela não costumava demonstrar sentimentos e quando chorava era porque estava muito mal. Eu não era indiferente ao seu sofrimento. Segurando uma pá velha, cheia de lama olhei para minha avó e disse com firmeza:

- Prometo que quando eu me formar e arrumar um bom emprego vou lhe comprar uma casa decente, com uma imensa TV na sala e a senhora nunca mais vai precisar passar por isso. Prometo! – meus olhos se encheram de lágrimas.

- Você vai… – olhou-me emocionada – … mas eu já não estarei aqui para ver. Mas, de onde estiver, sentirei um imenso orgulho de você.

- Não diga isso! Nós vamos ter uma vida melhor.

Ela se aproximou e me tocou no rosto: - Você vai arrumar um bom emprego, ganhar um bom salário e conhecer todos os lugares que quer. De onde estiver, vou ver isso. – se afastou rapidamente – Mas agora é hora de limpar essa sujeirada toda. 

"Eu vou conseguir!" Percebi que esse trabalho duraria o dia inteiro. Liguei para Regina e expliquei nossa situação. Disse que não poderia buscá-la. Ela entendeu e disse para que eu não me preocupasse. 

Todas as atividades normais dos moradores foram suspensas. Estávamos concentrados em arrumar a bagunça, fruto da falta de infraestrutura no morro e do desleixo dos próprios moradores.

Por volta das 14:00h, vovó e eu almoçávamos um sanduíche quando ouvimos a voz de seu Neneco chamando:

- Ô de casa! Visita pra vocês!

- Visita?? Não pode ser!

- Deixa que eu vou ver vó.

Levantei-me e fui até o lado de fora. Qual não foi minha surpresa ao dar de cara com Regina, vestindo short jeans, uma blusinha rosa e calçando um par de tênis cor de rosa. Usava um rabo de cavalo preso em um boné.

- Oi, Emma! Essa menina chegou lá na minha quitanda e daí eu trouxe ela. Pena que escolheu um dia feio pra fazer visita. O Cantagalo está de pernas pro ar.

- Oi Emma!

Não pude deixar de sorrir.

- Oi querida! – olhei para seu Neneco – Obrigado. Deixe que agora ela tá em casa.

- Até mais! - despediu-se.

- Vem aqui, sua maluquinha. – estendi a mão para que ela pudesse entrar no meu quintal – Como pode ter vindo? Não pensou no perigo? Além do mais como vou te dar atenção tendo que trabalhar? - olhei ao redor com vergonha.

- Peguei um táxi e desci no pé do morro. Vi a quitanda fui até lá e aí o moço me trouxe. Eu vim ajudar vocês a trabalhar.

- Tá brincando? - arregalei os olhos -  Você veio toda linda assim pra mexer em lama? – não pude deixar de rir - Regina, você não tem esse costume e vai se sujar toda. Olha pra mim. Tô nojenta! - Eu vestia calça jeans, tênis preto e camiseta preta. Estava suja e suada.

- Então eu vou sair daqui igual! 

Coloquei as mãos na cintura.

- Você me encanta cada vez mais, sabia? – disse em voz baixa, não conseguindo conter um sorriso bobo.

Ela abaixou a cabeça e corou. Lutei contra uma forte vontade de beijá-la, mas sabia que não podia fazer isso.

- Emma, quem está aí afinal??? – minha avó chegou à porta.

- É... Vó, lembra da Regina? É ela.

- Tudo bem, senhora?

Minha avó ficou visivelmente sem graça e começou a arrumar os cabelos curtos.

- Ô minha filha, tudo indo. Não leve a mal, mas hoje tudo aqui está...

- Eu sei. Vim ajudá-las.

- Como é???

Vovó e eu ficamos meio sem saber o que fazer.

- Entre então, menina. Já almoçou? – vovó olhou para mim.

- Já sim senhora. Não se preocupe!

Regina entrou e notei que chocou com o que viu, mas disfarçou o quanto pôde. Apesar de meus protestos ela nos ajudou na limpeza. Não tinha muito jeito, pela falta de hábito, mas fazia as coisas que minha avó orientava. Fiquei com o trabalho mais pesado, do lado de fora da casa. E fomos nesse embalo até de noite.

- Emma, é perigoso essa menina ficar aqui até tarde. Leve ela pra casa!

- Eu vou levar.

- Por favor, dona Ruth, não se aborreça por minha causa. 

- Não é isso, minha filha. Aqui é perigoso, você é de fora e nem deveria ter vindo. Foi muito trabalho pra você que não está acostumada e sei bem como é difícil se conviver com essa vida aqui, quando se tem conforto. – havia uma pontada de dor em sua voz

- Acredite que foi um prazer ter vindo e ficado com Emma e a senhora. – estendeu a mão.

- O prazer foi todo meu. – apertaram as mãos.

- Vamos indo então? – perguntei.

- Vamos.

Saímos de minha casa e olhei bem para Regina.

- Como se sente sujinha como está? Eu nem me arrumei pra ser solidária contigo.

- Você brinca, mas hoje me senti viva e muito bem. – abaixou a cabeça – Aliás, como sempre me sinto quando estou com você.

Cheguei perto e cochichei discretamente:

- Não fala assim, porque não é de agora que eu tô lutando contra uma imensa vontade de dar um beijo nessa sua boquinha linda!

Ela riu.

- Safada! E como ficariam seus fãs aqui no morro?

- Inconsoláveis! - aproximei-me e disse no seu ouvido: - Eu agradeço... por ter vindo, por ter tornado o dia de hoje menos difícil pra nós, por ser essa pessoa maravilhosa que é.

- Deus nada faz em vão. Fiquei triste por ter saído de Londres, mas não teria conhecido você do contrário.

- Você acredita mesmo nEle, não é? Se Ele existe, realmente tenho que agradecê-lo por sua causa.

- E por que você duvida? Deus está em toda parte. Como pode ver uma beleza dessa e não pensar que Ele a fez?

- Conheço o Deus punitivo de minha amiga Rose e as injustiças que estão em toda parte e não consigo acreditar que alguém vê essa bagunça que aí está e não faz nada. Ela diz que, na morte, vem o julgamento e que, mais tarde, Deus destruirá o mundo pra fazer outro. Não me faz sentido. 

- Deus não é deus de punição, de destruição, de castigo. Deus é Deus de amor, de perdão, de evolução. O entendimento das coisas da vida vem com o tempo, com a sabedoria. Você não pode ver Deus, mas pode senti-Lo, como sentimos agora esse vento gostoso em nossos rostos… vento que existe, mas não podemos ver, apenas sentir.

- E como acha que Deus vê o que estamos sentindo uma pela outra? Tinker disse que Ele abomina e tem nojo desse tipo de coisa.

- As pessoas põem palavras na boca de Deus. Pode um pai amoroso abominar seus filhos? Como Ele poderia então? Quem sou eu para saber o que Ele acha? Mas creio que o mais importante é que levemos a vida da maneira mais justa e reta possível.

Pensei nas palavras dela. Regina, era tão meiga, tão doce, tão bonita, por dentro e por fora. Ela me fazia acreditar na beleza da vida. Ela acalmava minhas angústias, meus medos e meu forte sentimento de rejeição, que eu tanto escondia, mas que me consumia por demais. 

Fomos andando sem maiores problemas até o pé do morro e a levei a um ponto de táxi. Nós nos despedimos com um abraço e voltei feliz para casa. Minha avó elogiou o jeito de Regina e fiquei muito feliz em saber de sua simpatia por ela. Era para mim, no fundo, como se tivesse aprovado minha futura, ou atual (?), namorada. "Namorada??? Swan, vai tomar um banho e dormir porque você tá delirando… Isso, um banho!”

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