Preparem o coração!
O cap tem música e ela já está logo no início do capítulo. Dêem o play! ;)
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Ruelle - I Get to love you
Cheguei em casa e surpreendi Regina arrumando uma pequena mala.
- Que é isso? – perguntei espantada.
- Eu é quem pergunto: o que é isso? – olhou para o relógio – Isso são horas, Emma?
- Pra onde vai? – aproximei-me dela e olhei para dentro da mala.
- São Paulo. Um arquiteto norte americano especializado em projetos com estruturas metálicas e vidro estará na cidade palestrando amanhã. Quero conversar com ele e viajo amanhã cedo. – aproximou-se de mim e cheirou minha roupa – Andou bebendo? – olhou para mim desconfiada.
- Sabe que não bebo. É que derrubaram chopp na minha blusa.
- E quem derrubaram? – cruzou os braços.
- Você me faz essas perguntas todas, mas não me disse porque também chegou mais tarde em casa. E não me disse com antecedência que ia pra São Paulo. – respondi chateada.
- Eu esqueci. – hesitou e voltou a arrumar a mala.
- Ah, esqueceu? Uma mulher que antes me pedia permissão pra fazer quase qualquer coisa? – coloquei as mãos na cintura.
- E você mesmo me dizia que isso não era preciso. – olhou para mim chateada.
- E não era. Mas também não me falar nada é sacanagem, não acha? Afinal, eu pensei que a gente era casada.
- E somos. – cruzou os braços – Mas para você não conta se não houver sexo.
- Eu nem toquei nesse assunto, Regina
- Mas pensou.
- Então sabe o que eu penso? – sorri sem humor – Vou te dizer o que eu penso. Alguma coisa estranha tá acontecendo e você mudou comigo, e mudou muito, e eu queria ao menos saber o que é. Depois de tanto tempo juntas acho que merecia mais consideração, não acha? – olhei bem em seus olhos – Nós nunca brigamos, e agora tá sendo assim. Qualquer conversa vira uma discussão como a que estamos tendo agora.
Ela caminhou até a janela e permaneceu de costas olhando para fora.
- Façamos o seguinte. Volto para casa depois de amanhã e então conversaremos.
- Depois de amanhã eu vou pra Campina Grande me reunir com os caras dos vergalhões. Você não sabe porque não se interessa mais pelo que faço. – pausei - Mas volto na sexta à noite, e se quiser podemos conversar no sábado.
Virou-se de frente para mim.
- Acho que precisamos mesmo de uma boa conversa. – seu olhar era triste.
Passei a mão nos cabelos e tirei a blusa e as sandálias indo para o banheiro.
- Ainda me quer fora do quarto? – estava de costas para ela.
- Aquilo foi horrível. – pausou e ouvi um soluço sofrido saindo de sua boca - Perdoe-me!
Olhei para ela e perguntei em voz baixa:
- Não me quer longe?
- Não. – mordeu o lábio inferior – Perdoe-me, por favor.
Caminhei até ela e parei bem próxima, mas sem tocá-la.
- Não quero que me trate mal daquele jeito nunca mais. Sabe que já tenho uma dificuldade natural pra me sentir completamente aceita, então não faça me sentir ainda mais rejeitada.
- Prometo! – uma lágrima escorreu de seus olhos – Eu não acho que seja doente, e nem me irrito com o fato de me querer. Só estou cansada e fui infeliz com as palavras naquele dia. – passou a mão no meu rosto – Não acontecerá mais. Eu prometo.
Peguei sua mão e beijei-a.
- Levo você pro aeroporto amanhã.
- E dorme abraçada comigo? – pediu como uma criança receosa.
- Claro, meu amor. Não precisa pedir.
Lançou-se nos meus braços e apertou-me de um jeito como se tivesse medo de algo que estava por vir.
- Seja lá o que for que está acontecendo com você, a gente vai resolver juntas, entendeu?
Balançou a cabeça e continuou colada comigo ainda por uns bons minutos.
☆♤☆
Voltei para Natal na sexta, porém cheguei mais tarde do que deveria por conta de um acidente na BR. Quando finalmente entrei em casa era quase meia noite. Encontrei Regina dormindo na poltrona e parei para analisá-la de perto. Sentei na mesa de centro e fiquei olhando para seu rosto, observando detalhadamente cada traço daquele perfil delicado. Parecia ter chorado, o nariz estava vermelho. Não sabia explicar porque, mas senti uma imensa tristeza ao admirá-la.
- Vamos levar essa morena pro quarto?
Levantei-a no colo e fui caminhando para nosso quarto. Ela acordou sonolenta e surpresa.
- Emmy! – envolveu meu pescoço com os braços – Fez boa viagem? Que horas são?
- Fiz sim. E é hora de dormir com minha rainha.
Ela sorriu e deitou a cabeça no meu ombro.
- Lembra de quando eu adormecia estudando e você fazia isso de me levar pra cama no colo?
- Claro que lembro, meu bem. Lembro com detalhes de tudo que vivi com você. – deitei-a na cama – Não disse que vou até escrever sobre nós?
Ela sorriu e disse:
- Só depois que eu esclerosar. Agora vá tomar seu banho e venha deitar aqui comigo.
- Pode deixar, meu amorzinho.
Dormimos abraçadas aquela noite.
E no sábado tomamos café e fizemos nossos rituais específicos. Por volta das 10:30h Regina foi para o quarto e decidi que aquele seria o momento de nossa conversa.
- Estranho quando Fran falta, não é? Senti falta de ouvi-la cantando forró. – penteava os cabelos.
- Eu também. Tomara que a neta dela melhore. – respirei fundo – Acho que agora é a hora da nossa conversa, não é?
- É. – sentou-se na cama. - Vou lhe contar tudo, uma vez que eu mesma agora sei de tudo, e não sei o que fazer.
Sentei na cama também, de frente para ela.
- Estou ouvindo. – olhei-a intrigada.
- Você falou abril, não foi? – sorriu triste – Eu me sinto estranha desde abril. Pensei que era o excesso de trabalho e que iria passar, mas não passou. Só ficou pior. Eu me sinto sempre cansada, sinto dores, meu corpo vem aparecendo manchas arroxeadas na pele, minha menstruação está com o fluxo com aumento considerável... Naquele dia em que brigamos, eu estava completamente confusa. – abaixou a cabeça – Meu nariz sangrou.
- O que? Como assim, Regina? Você foi ao médico?! – perguntei preocupada. Meu coração já estava acelerado.
- É só o que tenho feito. Por isso tenho chegado tarde. – contornou os desenhos da colcha com os dedos, com a cabeça baixa. – E fui para São Paulo fazer um exame, além de conversar com o tal arquiteto também.
- Exame de que? Por que escondeu isso de mim? Esse mal estar? Eu queria ter estado do seu lado como sempre estive.
- Eu não quis ser mais um motivo de dor para você. Sabia que sofreria e achei que se me afastasse...
- Eu sofreria ainda mais! Seu afastamento doeu mais que qualquer coisa que pudesse fazer! Pensei que estava tendo um caso.
- Isso nunca me passou pela cabeça! – olhou no fundo dos meus olhos.
- Mas me diga logo, que exame fez e o que está acontecendo? Você disse que agora sabe tudo; do que sabe? – estava agoniada.
Ela respirou fundo, fechou os olhos e encarou-me com tristeza.
- Recebi o resultado do exame ontem. Estou com câncer,Emma.
- O que??? – senti uma leve pressão na cabeça que me tonteou. Meu coração bateu apertado e minha boca secou.
- Leucemia. – derrubou algumas lágrimas dolorosas – Não sei o que fazer... Estou confusa e com medo. - sua voz saiu trêmula.
- Ah, meu amor...minha pequena! – lágrimas saíram de meus olhos – Não tenha medo e nem fique confusa! – aproximei-me dela e puxei-a para que se sentasse no meu colo – Vamos resolver isso juntas e estarei sempre do seu lado. – abracei-a com força – Eu te amo e Deus vai nos ajudar. Acredite.
Ela abraçou-se comigo, me envolvendo o pescoço e chorando como criança.
“Ah, meu Pai eterno! Por favor, eu suplico. Permita-nos vencer isso! Não deixe minha rainha ir embora, por favor não deixe!”