2.

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       Abro os olhos devagar, pisco duas vezes e logo sou atingida pela claridade dos raios de sol brilhando acima de mim. Estico meu braço para cima, espreguiçando meu corpo e esbarro no tronco de árvore, arranhando minha pele. Solto um gritinho e desperto no mesmo instante. Por um segundo, havia esquecido onde estou. Levanto meu corpo, sentando no chão e sentindo cada músculo se contorcer em exaustão. Mal consigo mover minha cabeça para o lado direito. Não me dei conta que estava passando a noite inteira apenas apoiando a cabeça desse lado, e é claro que colheria as consequências na manhã seguinte.

       Escuto a voz baixinha cantando uma canção que não conheço e levanto os olhos. Arin está distraído enquanto desmonta a fogueira, jogando galhos para um lado e espalhando as cinzas pelo chão. Ele parece calmo e muito entretido com o que está fazendo, nem deve perceber que está cantando. E ele tem uma voz bonita.

       Meu estômago ronca alto. Alto mesmo. Tão alto que chama atenção de Arin. Ele se cala e vira para mim.

— Ei... bom dia, princesa! — Ele abre um sorriso e vem até mim. — Achei o riacho. Está a menos de uma hora daqui. Vamos, vamos. Você toma seu banho e, bem, eu posso tomar um também — Ele para de falar e me olha, arqueando a sobrancelha direita como um convite.

— Nem pense. — Retruco o mais séria que consigo ficar. Arin gargalha alto.

— Depois do banho, vamos pegar algo para comer. Há uma nascente nesse riacho e podemos beber água. — Ele sorri confiante quando para de falar.

— Você... você realmente pensou em tudo. — Digo em um suspiro.

      Acabei de acordar e Arin já cuidou de todas as nossas necessidades. Ele já deve estar acordado por horas resolvendo tudo isso sozinho, enquanto eu estava dormindo! Olho para ele, que me encara de volta. Seus cabelos estão bagunçados, mas já estou acostumada, estão sempre assim. Diferente de mim, ele não parece acabado. Pelo contrário, parece vivo e eletrizado. Sua expressão muda da confiança para a cautela.

— Você estava chorando enquanto dormia. — Ele muda totalmente o assunto.

       Ah! Faço uma careta. Apesar de ter capotado em um sono pesado, não tive uma noite tão agradável. Mesmo dormindo, não consegui desligar minha mente dos pensamentos pessimistas sobre tudo isso. Tudo está meio nublado agora que estou acordada, mas lembro de ter sonhado com o momento que atirei a flecha. Também vejo flashes de Theo no meu sonho e não lembro o porquê, mas ele não estava nem um pouco feliz.

— Não estou chorando agora. Fique satisfeito com isso. — Respondo. Arin estreita os olhos. Sei que ele não esperava uma resposta que fugisse do assunto, mas não estou afim de conversar sobre.

       Levanto do chão com dificuldade, lutando para encontrar um equilíbrio. Eu juro pelos céus: este vestido fica mais pesado conforme o tempo. Ugh! Como odeio estar no meio de uma floresta com este maldito vestido! Além de estar parecendo uma noiva maluca, essa é a pior roupa para essa situação. A pior. Alçando o arco e coloco a aljava nas costas. Há oito flechas ainda, e se posso ser otimista, espero continuar assim até chegarmos a base.

— Tudo bem. Vamos. — Arin desiste e aponta com a cabeça para a frente.

      Repetimos o processo de ontem. Ele vai na frente cortando o que for necessário, eu vou atrás, arrastando o vestido e meu próprio corpo, tentando acompanhar seu ritmo. Fico tão ocupada tentando fazer isso, que não encontro forças para perguntar nada a Arin. Minha cabeça está explodindo e só consigo, literalmente, olhar para a frente.

       Como prometido por Arin, não andamos muito tempo antes de começarmos a ouvir o barulho de água caindo. É tão gostoso e aliviante, que abro um sorriso. Não muito tempo atrás, eu estava nadando num sábado no lago do Palácio, odiando estar lá porque os jovens da Corte estavam. Hoje, estou fugindo.

Espinhos negrosWhere stories live. Discover now