32.

222 18 0
                                    

— Você pode parar de olhar para mim como se eu fosse uma criança, sabe? — Atlas resmunga exatamente como uma criança faria. Eu bagunço seus cabelos antes que ele tenha a chance de fugir.

— Não estou te olhando desse jeito. — Minto descaradamente, e ele sabe, porque estreita os olhos de maneira debochada.

      Como uma criança não é o certo nem a forma como eu explicaria meu olhar. É mais como um irmão mais novo — mesmo que tenhamos a mesma idade. Eu olho para Atlas e vejo um irmão que preciso cuidar e proteger, eu devo isso à Rainha, a Theo, ao próprio Atlas. Jamais poderia esquecer do que ele fez por mim. Mesmo que não tivesse me ajudado tanto e sido um ombro amigo em vários momentos durante minha breve estadia no Palácio, ele ainda seria o garoto bondoso e gentil que mereceria ser protegido. Atlas se preocupa e é cuidadoso, está sempre querendo ajudar e só não faz mais isso, porque frequentemente é visto apenas como um garoto novo. Mas eu não o vejo assim.

      Atlas conhece cada pedaço escondido do Palácio. Sua curiosidade excessiva e o tédio devido a sua condição de segundo filho, o fizeram descobrir cada detalhe de sua casa. Inclusive uma sala especial cheio de aparelhos velhos. Quando eu contei do meu plano, ele automaticamente lembrou de ter visto algo parecido entre as bagunças esquecidas do Palácio, e se colocou a disposição para ir. Eu hesitei. Se algo der errado, não sei como o Rei agiria com ele, visto que Atlas não é seu filho preferido nem o mais habilidoso no combate. Porém, é o mais lógico porque ninguém conhece o lugar melhor que ele. Por isso, é ele que vai com Arin até lá.

— Talvez dê tempo de tirar uma soneca no meu quarto. — Ele murmura, abrindo um sorriso relaxado.

      Arin se junta a nós. Não consigo encarar de forma relaxada como os dois. Eu estou nervosa.

— Fiquem juntos o tempo todo. — Desvio o olhar de um para o outro, e finalizo olhando para Atlas. — Volte inteiro. — Digo a ele, mas o mesmo não está mais prestando atenção em mim, apenas balançando a cabeça de forma distraída.

       Sua atenção já foi toda e unicamente para Lucy. Quem não olharia para ela? Nossa nova rotina de vida fez bem a ela. Seus cabelos estão sempre soltos agora e enormes, seus olhos verdes estão vivos e brilhantes, e ela anda com uma confiança de quem finalmente se encontrou. Nós duas compartilhamos o luto e ela esteve comigo o tempo todo nos últimos quatro dias. É uma característica sua cuidar das pessoas o tempo todo, e faz isso tão naturalmente, que você aceita seus cuidados. Eu deixo Atlas babar por Lucy e me viro para Arin.

— Tenha cuidado. — Digo de forma séria. Arin abre um sorriso. Covinhas. Malditas covinhas. — Estou falando sério! — Reviro meus olhos.

— Quando que eu não tenho cuidado? — Ele ironiza. Eu cruzo meus braços de forma irritada e comprimo os lábios.

      Arin me dá nos nervos. Quando não está acelerando meu coração por amor, ele está acelerando meu coração de nervoso. As vezes, sinto vontade de sacudi-lo, como agora e enfiar na cabeça dele o quanto eu preciso dele vivo. O quanto ele precisa voltar para cá. Sei que estou, aos poucos, destruindo todos os muros que ele construiu durante a vida, e sei que ele está me deixando realmente criar raízes em seu coração, mas detesto a forma como ele encara sua própria vida. Como se não fosse importante.

— Ei... — Ele ri de forma distraída e me puxa mais para perto. Não estou preparada para ceder ainda. — Vou ter cuidado, vou cuidar do príncipe mais novo e vou voltar com seus aparelhos. — Ele repete, e eu vou aos poucos deixando que meus lábios se transformem em um sorriso. — Céus, você é impossível.

— E você adora. — Dou de ombros e deixo uma careta convencida tomar meu rosto.

— Talvez. — Eu enlaço meus braços em seu pescoço e o beijo, o trazendo para mais perto de mim.

Espinhos negrosWhere stories live. Discover now