14.

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     Ainda estou de olhos fechados e grogue, quando escuto passos circulando a minha tenda. Prendo a respiração em minha garganta, criando coragem para abrir meus olhos e enfrentar meu medo. A sombra que pinta lá fora é uma silhueta alta, movendo-se com rapidez e agilidade. Eu rolo na minha cama até alcançar a borda, enfio minha mão embaixo do colchão, atinjo meu arco e o puxo para cima. A próxima coisa que procuro com rapidez e de forma estabanada é uma flecha, mas não tenho sucesso com isso. Deixo um suspiro de fracasso escapar da minha boca.

     Eu me coloco de pé em um pulo. As meias que Laia me emprestou escorregam no chão, mas mantenho meu corpo em pé. Seguro o arco com minhas duas mãos, em posição de ataque, preparada para fazer a mesma coisa que fiz com aquele soldado na Floresta, quando o arco era tudo que me restara. Eu sinto meu corpo tremer de apreensão. Calma, calma. Mas por que alguém estaria circulando minha tenda no meio da noite? Este é o problema.

     A silhueta se transforma em um corpo real de carne e ossos. À meia luz, é difícil reconhecer a pessoa assim que vejo. Aperto o arco mais forte em minhas mãos e o levanto, pronta para bater no intruso.

     Os olhos de Arin encontram os meus no exato momento em que miro com força sua cabeça. Por uma fração de segundo, ele desvia, deslizando para o lado, soltando um gritinho. Eu grito também. Deixo o arco cair no chão, como se ele pegasse fogo e queimasse minhas mãos. Por pouco, não causei um bom hematoma em Arin. Arin! Oh meu Deus!

— Pelos céus, Arin! Eu quase acertei você! — Exclamo. Minha voz soando fina como um gatinho.

     Arin está aqui. Bem aqui. Na minha tenda. Bem. Eu posso toca-lo, abraça-lo, sentir seu cheiro. Ah, pelos céus! Eu olho para ele. O mesmo já colocou uma distância segura entre nós dois, entrando na minha tenda e analisando o ambiente. Eu ainda estou parada perto da entrada, a arma do meu quase crime em meus pés. Eu analiso seus ombros retos, seus braços, suas mãos. Ele parece bem. O alívio que corre cada centímetro do meu corpo é reconfortante.

— Eu sei! Por quê?! — Sua resposta exclamada a minha pergunta me tira do transe, e pisco meus olhos para entrar em nossa conversa novamente.

— Talvez porque você invadiu meu quarto no meio da noite! — Eu retruco de forma irônica.

     Arin é quem estava circulando minha tenda como um louco no meio da noite, ciente que não confio em noventa por cento das pessoas daqui, e que até então, ele estava em Viridia, correndo risco de vida!

     De uma hora para outra, fico muito ciente que estou de shorts curtos esfarrapados, meias grossas e velhas, uma blusa surrada do próprio... do próprio Arin. Não sou uma perseguidora louca que invadiu a tenda de Arin e roubou sua blusa! Oscar me deu. Estou fazendo um estoque de roupas minhas, emprestadas de outras pessoas. A da vez foi a de Arin. E eu não devolvi.

— Acabei de chegar e você é a primeira pessoa que eu queria ver. — Ele dá de ombros, tentando não dar a mínima para suas palavras. Por um instante, nós apenas nos encaramos. — Prometo que tomei banho antes de vim aqui.

— Idiota. — Murmuro, escondendo o sorriso dos meus lábios com minha mão direita.

     Este é Arin. Mascarando um momento sentimental com uma piada. Só que não caio mais em sua tentativa de enganação. Sei quem é Arin. Sou a primeira a ver Arin. Ele acabou de chegar e veio aqui, me ver, falar comigo. Não sei como deveria me sentir sobre isso, mas meu coração está muito, muito feliz.

— Eu tenho tanta coisa pra te falar! Tipo, fofocas do mais alto escalão! — Ele vibra, gargalhando e jogando os braços no ar. — Coisas que você nem imagina!

     Eu cruzo o espaço que nos separava e paro na frente dele. Abro um sorriso curioso, e empurro seu ombro levemente. Não é suficiente. Tocar seu ombro não é suficiente. Por que Arin nao me abraçou ou fez algo assim? Pelos céus!

Espinhos negrosWhere stories live. Discover now