SOB O MESMO CÉU

Capítulo 86

Capítulo 86

A partida de Jessie dessa vez não gerou um problema para nós. Não foi motivo de grande tristeza. Não, de jeito nenhum. Eu estava orgulhoso dela. E orgulhoso de mim. E do relacionamento sólido que havíamos construído juntos até ali. Era incrível o quanto tínhamos amadurecido desde a primeira vez em que nos distanciamos.

É claro que havia uma certa apreensão, afinal eram seis meses de uma distância absurda entre nós. Mas ela estava indo atrás de seus sonhos, e eu estava realizando os meus. Decidi não ficar triste com sua partida, e me surpreendi ao descobrir que a tristeza, assim como a felicidade, às vezes é só uma questão de escolha.

Escolhi ser feliz e me dedicar ao trabalho que amava. E aquilo me fez tão bem! Eu acordava pela manhã e ia dormir à noite me sentindo realizado, não importando o lugar onde estivesse naquela hora. Estava focado em meu trabalho como nunca antes. Já tinha entrado no ritmo e estava me sentindo ótimo comigo mesmo. Fazendo novos amigos, conhecendo pessoas e lugares novos a cada dia. E, é claro, também ligando regularmente para minha mãe, para saber como ela e Meggie estavam.

O verão era uma época linda para se voar. Não apenas pelo clima, mas também pelo momento alegre que representava para a maioria das pessoas. Crianças viajando de férias com seus pais. Jovens retornando da universidade para sua terra natal, para estar com suas famílias. Muita gente estava de férias, os voos eram sempre lotados e a alegria era quase sempre contagiante. Muitas vezes ao pousarmos, algumas crianças iam até a cabine pedir para tirar fotos, e eu via seus olhinhos brilharem como os meus brilhavam quando tinha aquela idade. Passei o feriado de 4 de julho trabalhando e apreciei a beleza dos fogos de dentro da cabine do avião, enquanto sobrevoava os mais diferentes estados.

É óbvio que sentia falta de Jessie. As primeiras semanas foram as mais difíceis, eu acho. Mas nós conversávamos sempre que possível, apesar das incríveis sete horas de diferença no fuso horário que nos separavam. Encaixávamos nossas ligações periódicas aonde desse. Algumas vezes lá era dia, enquanto onde eu estava era noite. Ou vice versa. Às vezes era até difícil acreditar que estávamos sob o mesmo céu, enquanto eu olhava as estrelas, e ela o sol nascente. Mas era isso que nos fazia sentir mais próximos: o pensamento de que, apesar de toda a enorme distância, ainda estávamos ambos sob o mesmo céu.

Eu adorava ouvir suas incríveis histórias lá da capital dos Emirados Árabes. Como na vez em que ela me contou que havia avistado um casal de baleias-azuis em alto mar. Ou quando ela disse que, durante seus frequentes mergulhos, via espécies que a maioria das pessoas nem sequer sabia da existência. Ela estava deslumbrada, e era lindo de se ver!

No meu aniversário eu estava num hotel em Chicago, onde ia passar mais uma noite em serviço "longe de casa". Jessie me ligou em uma chamada de vídeo. Ela estava radiante. Bronzeada, com o cabelo já um pouco mais comprido do que eu me lembrava, as maçãs do rosto ligeiramente mais finas, e um brilho indescritível nos olhos azuis. Nós conversamos por horas.

— Sammy, eu estou apaixonada! — Jessie falou em um determinado momento.

— Sério? Eu deveria me preocupar? — perguntei. E ela riu.

— Claro que não, seu bobo! Digo que estou apaixonada por meu projeto de pesquisa. Por acaso eu te contei que agora faço parte da patrulha das tartarugas?

— Você tinha me dito que estava pensando em entrar.

— Eu entrei. E é uma das coisas mais incríveis que já fiz na vida! Fiquei sabendo de alguns alunos que participam da iniciativa através do professor Holland, na aula de Mudanças Climáticas Globais, e decidi me voluntariar.

— E o que vocês fazem exatamente?

— Nós ajudamos na preservação da espécie das tartarugas-de-pente, que está criticamente ameaçada. Patrulhamos a praia de Saadiyat para garantir que as tartarugas-mãe não apenas cheguem à costa para botar seus ovos, mas também que seus filhotes fiquem protegidos até que estejam prontos para voltar  para o mar.