Capítulo 6

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Ouvir aquela notícia me abalou mais do que eu imaginava que faria. Fairbanks agora me parecia ainda mais distante. Como se houvesse se tornado apenas uma lembrança remota de uma infância feliz que eu tivera.

Sentei-me na poltrona, como um lutador que, após levar um duro golpe, precisa absorver e se recompor.

— Mãe, você acha mesmo que está fazendo a coisa certa? — falei, bem no momento em que alguém bateu na porta.

— Mas é claro, filho — ela caminhava em direção à porta enquanto falava. — Agora podemos ficar mais tranquilos em relação às despesas médicas de Megan. E finalmente começar a procurar um lugar para morar por aqui.

Baixei a cabeça, sem palavras para expressar o que estava sentindo. Megan colocou a mão em meu ombro, tentando me consolar. Mamãe colocou a mão sobre a maçaneta e, antes de abrir a porta, falou:

— É o Zane. Por favor, tentem ser bonzinhos!

— Uma péssima hora! — resmunguei baixinho.

Ela então abriu a porta e Pickford entrou sorridente. Era um homem alto, de ombros largos. Seu nariz era comprido e torto. Tinha um furo no queixo e a barba por fazer. Também parecia ter cabelos demais para a idade dele. Os fios grisalhos cobriam sua testa em um penteado jovial no estilo surfista adolescente, apesar de ele provavelmente já ter passado dos 50. Estava usando um terno ajustado, uma gravata fina e sapatos que pareciam caros demais a primeira vista. Seu perfume tomou conta do quarto tão logo ele entrou.

— Olá, minha querida — falou em um tom amigável. — Beijou minha mãe no rosto e depois fez o mesmo com Megan. Eu apenas acenei cordialmente, do outro lado do quarto. — Desculpe, não pude evitar de ouvir. Vocês estavam falando sobre procurar uma casa para morar, certo?

— Com todo respeito, senhor Pickford, isso não é da sua conta — disparei.

— Ora, filho, na verdade... — ele começou a falar, mas eu o interrompi.

— Não me chame assim! Meu nome é Hart. Para você é senhor Hart, exatamente como era conhecido o meu pai. Coisa que você não é. Então não me chame como se fosse.

— Tudo bem — ele hesitou por um instante —, senhor Hart. Mas, por favor, você pode me chamar de Zane.

— Eu não gosto de você, senhor Pickford. — Minha mãe me lançou um olhar de repreensão enquanto eu falava, mas continuei: — E nem gosto do seu nome. Então não, eu não irei chamá-lo de Zane.

— Filho! Olha o respeito! — minha mãe esbravejou.

— O garoto tem personalidade — Pickford apenas riu. — Mas, como eu ia dizendo, esse assunto é sim da minha conta. Na verdade eu trabalho exatamente com isso. Com a imobiliária Royal Estate. Eu poderia conseguir um lugar excelente, com condições facilitadas.

— Não queremos a sua ajuda — retruquei.

— Obrigada, Zane — minha mãe teve de intervir, tentando amenizar a situação. — Mas não creio que seja uma boa hora para falarmos nisso. Podemos ir andando?

— Como quiser, querida. Mas antes — ele tirou do bolso uma barra de chocolate e entregou-a a Megan —, um presente para a minha linda garotinha.

— Obrigada, senhor Zane! — ela lançou os braços em volta do pescoço dele e o beijou no rosto em agradecimento.

— Ela ainda não pode comer sólidos — eu disse, impaciente.

— Sim, eu sei — Pickford falava sempre em um tom manso. — Mas nós estamos trabalhando nisso. E este é o incentivo para ela conseguir ainda mais rápido, não é mesmo, pequena?

— É isso aí — Megan falou orgulhosa.

Ele apertou as bochechas dela e os dois sorriram. Eu me revirei na poltrona ao ver aquela cena.

Antes de sair, mamãe veio até mim para dar-me algumas orientações.

— Nós vamos jantar. Eu devo voltar em algumas horas. Mas se alguma coisa acontecer, qualquer coisa, é só me ligar!

— Pode deixar, mãe. Meggie e eu vamos nos cuidar. Divirta-se com seu namoradinho.

Ela me lançou um olhar intimidante, mas não disse nada. Logo depois saiu de braços dados com aquele sujeito.

— Por que é que você deixa esse cara te tratar feito um bebê? — falei com Megan quando ambos estávamos sozinhos no quarto.

— Ele é um cara legal — respondeu, sorrindo. — Não sei por que você o odeia tanto.

— Você mal conhece ele, Meggie! Nem você, nem a mamãe. Vocês duas ficaram amiguinhas desse homem estranho rápido demais! Não dá para saber se ele é confiável.

— Pode ser — Megan deu de ombros. — Mas uma coisa eu sei: nunca vi mamãe tão feliz!

Era estranho pensar que Meggie quase não tinha lembranças de quando nosso pai era vivo. Quando ele morreu, ela ainda era bebê de colo. Por isso parecia tão tranquila com o fato de nossa mãe estar saindo com outro homem. Mas eu me lembrava muito bem de meu pai. Me lembrava de quando ele e minha mãe eram felizes juntos, do quanto se amavam. E não via como não ficar incomodado com a presente situação. Mesmo assim, decidi evitar meus maus pensamentos e tomar conta de minha irmã.

— Eu também te trouxe um presentinho, pequena —  falei tentando imitar a voz de Pickford. Depois entreguei a Megan um  pirulito e apertei suas bochechas. Ela me fez uma careta. — Agora chega para lá que eu quero me sentar aqui. Vamos jogar Uno. Eu sei que você adora!

— Eba!

Ela encolheu suas pernas e eu me sentei na beirada de sua cama. Nós jogamos cartas e rimos juntos, até que uma funcionária do hospital veio trazer o jantar. Ela entrou, deixou uma bandeja sobre a mesinha, ao lado da cama de Meggie, e depois saiu.

— Eca! Comida de hospital — critiquei.

— Até que não é ruim — Megan falou, dando uma colherada em sua sopa de abóbora.

— Eu vou descer até o refeitório, para ver se consigo alguma comida de verdade.

Saí do quarto e desci até a lanchonete do hospital. Comprei um sanduíche natural e sentei-me em uma mesa vazia no tranquilo refeitório. Por curiosidade, decidi pesquisar a imobiliária na qual Pickford disse que trabalhava. Me surpreendi ao ver que o nome Zane Pickford não estava associado a nenhum funcionário daquela empresa, mas sim ao dono.

Resolvi fazer uma pesquisa mais específica, digitando somente o nome dele. O resultado me deixou estarrecido. Enquanto eu acessava páginas e mais páginas de pesquisa que remetiam ao nome "Zane Pickford", descobri que ele não era somente dono da Royal Estate. Ele era o CEO de um grupo multiholding de empresas, em sua grande maioria relacionadas ao ramo de construção e venda de imóveis de luxo. Havia imagens dele recebendo prêmios; reportagens sobre o fechamento de contratos milionários, e até um artigo na revista Forbes, estimando o valor de sua fortuna em mais de 12 bilhões de dólares. Aquele homem não era somente um simples corretor de imóveis, mas um dos mais influentes e bem sucedidos empresários dos Estados Unidos da América.

Será que minha mãe sabia disso? Eu podia apostar que não! Imediatamente, decidi perguntar a ela, enviando mensagens de texto:

"Mãe, você precisa ver uma coisa."

"O que foi, filho? Aconteceu alguma coisa? Megan está bem? Nós já estamos voltando."

"Não é sobre a Megan, mãe. Veja isso..."

Então enviei a ela alguns dos resultados de minha pesquisa. Quase meia hora se passou. Não houve resposta. Escrevi mais uma mensagem:

"Você realmente sabe quem esse cara é???"

Demorou mais alguns minutos, mas ela finalmente respondeu:

"Eu não tenho mais tanta certeza."

SOB O MESMO CÉUDär berättelser lever. Upptäck nu