X Justice X || h.s.

Capítulo 54

"Porque eu acho que esta carta vais querer ler..." E o seu olhar penetra no meu com dor e pena. Naquele momento, eu percebi que o teor daquela carta era importante. "É da tua mãe, a carta é da tua mãe, está escrito Anne Twist, é ela, certo?"

Temi não ter ouvido corretamente, temi ainda estar a delirar. Estive meses preso, meses e nunca recebi uma carta da minha mãe, porquê agora? Porque vou morrer? Quererá despedir-se? Se sim, porque não me veio ver como à Gemma? Mas depois penso que o conteúdo daquela carta pode não ser o que desejo ou quero. O interior daquela carta pode ser apenas ódio e mágoa, pode nem sequer existir alguma réstia de amor... Podem apenas ser palavras rancorosas e sufocantes. O pensamento mais ridículo de sempre passa-me pela mente... Posso simplesmente não abrir o envelope, posso fingir que nunca o recebi, posso ignorá-lo por completo... Mas quem é que eu quero enganar? Este foi o único tipo de contacto que tive com a minha mãe desde que fui preso, por isso, o que quer que esteja escrito naquelas folhas, deverá ter alguma importância, certo? Talvez, talvez eu deva "ouvir" tudo o que a minha mãe me tem a dizer, nem que isso seja um "odeio-te" porque um "odeio-te" é sempre melhor do que todo o silêncio que ela me tem transmitido...

Vejo a mão de Liam a estender-me o envelope, contudo, longos segundos se passam até eu agarrar no pequeno papel. De seguida, passam-se mais longos segundos até começar a rasgar com o dedo e passar pela primeira vez os olhos pela carta. Confirma-se, trata-se da tão familiar letra da minha mãe.

"Querido Harry,

Desculpa-me por não te ter escrito antes e por nunca te ter visitado. Sei que a tua irmã o fez algumas vezes, mas eu fui e sou demasiado fraca para isso...

Estive no julgamento a semana passada, vi o teu rosto cansado e perdido, ouvi a tua voz adormecida e vulnerável. Estavas diferente... Aquele não era o meu Harry, o meu menino carinhoso e despreocupado que adorava correr à chuva e calçar as suas galochas para saltar para dentro das poças de água. Mas na verdade, tudo mudou a partir daquele dia, não foi? Naquele dia em que me ligaste a implorar por ajuda, naquele dia em me disseste que te tinham levado, aquele tão doloroso dia em que te tiraram de mim...

Falhei como mãe, falhei, e isso querido, é apenas culpa minha. Se o fizeste ou não, eu não sei, mas agora, nada disso importa...

Escrevo-te hoje não porque ganhei algum tipo de coragem que não tive antes, mas porque temo que não consiga vê-los a levarem-te de mim, temo não ser capaz de lá estar, de te ver a dar o teu último suspiro. Temo não me despedir e arrepender-me para sempre...

Harry, acho que não tenho forças para continuar. Agora, agora eu percebo que existe algo que dói mais do que a morte de um filho.... Sabes o que é? É saber que te vão levar, é saber que não vais ter um futuro e não poder fazer absolutamente nada para mudar isso. Se eu pudesse, meu amor, se eu pudesse, fica sabendo que eu ia em vez de ti, eu ia no teu lugar. Porque assassino ou não, monstro ou não, és meu filho, és sangue do meu sangue e isso é e sempre será assim...

Desculpa não conseguir acreditar cegamente na tua palavra, desculpa-me, por favor... Espero que entendas que aqui fora também não está a ser nada fácil... Eles levaram-te, eles têm provas, Harry, eles dizem que foste tu... E sabes o que é pior? É que eu continuo a amar-te tanto ou mais como antes. Se é um erro? Penso que não... Ser mãe sobrepõem-se a tudo, e eu vou ser sempre a tua mãe.

Por isso, meu amor, eu perdoou-te, tens o meu perdão. Espero que isso te traga algum tipo de paz ou consolo. A mãe ama-te e vai sempre amar-te...

Acho que agora percebo porque nunca consegui ir ver-te. É só porque eu prefiro relembrar-te como o menino doce que eras, ou és, porque eu quero acreditar que ainda não perdeste a tua magia, do que como um ser perdido na vida, um ser triste e desanimado. Assim Harry, assim eu prometo-te que te vou relembrar apenas e só como o menino que me vinha pedir colo ou como o homem que me fazia o almoço e me dizia que me amava.