Saiu de manhã cedo, a fim de passar na nova casa com o sogro para mostrar-lhe o espaço. Deixou Janete cansada, com Julita, a noite não fora fácil para nenhum dos dois. Joana chorava e ela levantava, depois foi a vez dele e assim seguiu. Ele tinha que estar de pé, depois de mostrar a casa iria para o trabalho.
Pedro vistoriou cada cômodo e se deu por satisfeito. Gostou dos quartos maiores, da sala espaçosa, das janelas grandes e principalmente da cozinha ampla. No seu entendimento sua filha teria duas mesas, uma ali e outra na sala, como uma casa de família deveria ter. A garagem guardaria o carro, que conhecendo Antônio, Pedro sabia que logo seria o do ano. Uma coisa que ele não podia negar era que o genro era ambicioso e sua filha iria usufruir dessa virtude. Já amor, Pedro não via nele, aqui o pesar pela Janete lhe doía o coração.
— Está de seu agrado?
— Sempre acharei que minha filha e neta merecem o melhor, mas isso aqui é melhor que aquele pulgueiro que vocês vivem. - Ele não resistia a mostrar o desgosto. - Por ora hora, dá para gasto.
— Acredito que já passamos desse mal estar não é, seu Pedro? - sério ele olhou para o sogro que sorriu de lado.
— Nunca! Agora que tens uma filha saberá o que estou falando Antônio. - apertou seu ombro. - Agora devo ir. Julita entende melhor de decoração do que eu. E sei que ela vai ajudar, com espaços maior mais móveis serão necessários.
Dizendo isso, deixou Antônio sozinho no meio da sala. Pela janela pôde ver Pedro andar até o ponto de ônibus e refletiu sobre a sua frase. Teve de sacudir a cabeça para tirar aquela fala de sua cabeça e também trabalhar.
Enquanto isso, Janete despertara com o sono depois do choro de Joana. Atendeu a sua filha e depois foi tomar uma banho, aproveitando a companhia de sua mãe. Pensar que logo se mudaria estava deixando-a feliz, mas o cansaço do início de ser mãe ainda vencia. Não era para menos. Ouvindo as outras mães, Joana ainda não estava com cólicas e nem com outra indisposição aparente para os bebês, era apenas a falta de manual de como ser mãe, que ela sentia.
— Com o tempo você aprenderá minha filha. Não se preocupe. - Julita consolava a filha de forma terna, o que a fez lembrar que a mãe não estaria ao seu lado para sempre.
— Eu sei mãe. Mas ainda é difícil decifrar cada choro. E logo a senhora não estará comigo. - o bocejo foi audível.
— Siga as dica básica, fralda, banho e comida. Se nada disso der certo Janete, deve levá-la ao médico rápido. Se o choro for insistente ou alto demais, não tenha vergonha de levá-la. Mas nada que o infalível xarope que aprendi com a sua avó, que lhe passarei a receita.
Julita piscou. A filha revirou os olhos e sentou para tomar café, com o carrinho ao seu lado. Hábito que aprendera nesse pouco tempo.
— Antônio quer que nos mudemos semana que vem. Tenho que ir na casa nova ver o que falta para isso.
— E também sentir o cheiro da tinta. Se estiver forte demais, vocês terão que esperar mais um pouco. - Julita lavava a louca para começar o preparo do almoço. - Filha terei que passar em casa, não posso deixar seu pai assim, sozinho. Ele não saberá onde fica o jornal.
— Claro mãe. Eu sei, apesar de Antônio ser diferente em parte se parece com papai. Ele não sabe onde ficam as gravatas - as duas riram cúmplices.
— Me diga, vocês estão bem? Digo, na parte íntima.
— Não há parte íntima mãe. Estou no resguardo ainda. Faltam trinta dias.
— Mas tem vontade, Nete?
— Eu sim, Tonho com certeza! Mas ele respeita, não me força a nada e não posso ir contra a doutora. Também tenho que conversar com ela sobre o método contraceptivo, não quero engravidar tão cedo. - Janete ainda tinha muito o que aprender e essa conversa era constrangedora com sua mãe, ela sentiria melhor se fosse com... - Soube da Claudia?
— Nada minha filha. Bruno e Antônio fizeram queixa na polícia, agora é só esperar que a encontrem rápido.
— Temo pela minha amiga. Não sei o que o fariam sem ela...
Janete olhou a janela da cozinha pensativa. Desde o início da faculdade tivera a impressão de Cláudia ser sozinha. Ela comentava apenas de uma tia que a ajudava mas nada além disso. E também, mesmo com a grande amizade, Cláudia nunca a deixara ir em sua casa, por dizer que era humilde demais.
O cheiro do café, o pão com manteiga e a maçã esperavam Janete come-las. Mas a fome não vinha quando pensava no desaparecimento de Cláudia.
Esperar no escuro, era o mesmo que se agarrar a esperança e rezar para que nada de pior a tivesse acontecido.
Já no trabalho, Bruno andava pela fábrica de alimentos com as roupas próprias e esterilizadas. As mãos para trás e o olhar atento, diferenciava o Bruno que mostrava aos amigos, o seu lado profissional era sério e rígido. E não tinha porque ser diferente. O seu comportamento não atingia o pensamento que não parava de girar na cabeça. Um dos amigos bohemios que trabalhava ali o olhava de forma insistente, quase indecente se fosse uma paquera. Disfarçando Bruno se aproximou de Marcelo, que vestia o macacão branco como todos e a touca na cabeça. A diferença era o seu corpo grande e musculoso com a sua pele negra, características que Bruno pensava seriamente que ele ocupava a posição errada na fábrica. Porém o rapaz gostava de trabalho manual. Responsável pela embalagem dos alimentos, era mais rápido que qualquer um pelos braços grandes.
— Bro - chamou baixo pelo apelido da noite, ali seria falta de respeito. - Fiquei sabendo de Cacau.
— Como assim? - Bruno olhava as embalagens e até pegou uma para vistoriar, mesmo sabendo do perfeito trabalho.
— Vai fazer o que hoje a noite?
— Ia ao bar relaxar. Os tempos da faculdade acabaram, mas o da Bohemia não. - ele riu ao amigo.
— Te encontro lá e te falo. - percebendo uma movimentação na entrada completou alto a encenação. - Está de seu agrado senhor?
— Como sempre, Marcelo. Como sempre. - Bruno percebera a chegada de seu pai na fábrica e piscando para Marcelo continuou a caminhar. - As nove lá.
O empregado apenas assentiu e sorriu. Não havia o que questionar mas a informação era quente. Bruno iria gostar.
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O início do sonho
Romance(Continuação do livro Sonho Realizado) Como um sonho começa? Ele não surge simplesmente mas quando se sonha muitas vezes, faz-se de tudo para torná-lo realidade. Antônio nunca pensou em ter uma família ou alguém para cuidar. Queria viver a vida e de...