Capítulo - XCI

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– Sobre o que são os seus pesadelos? – perguntou Alfonso quando o silencio tomou conta do quarto.

– Não são exatamente pesadelos. – ela respondeu depois de respirar fundo. – São lembranças, lembranças de quando eu estava casada com o Rodrigo.

– Que tipo de lembranças? – perguntou já sabendo que não eram lembranças boas, mas ele precisava incentivá-la a continuar falando.

– Do inferno que eu vivi com ele. – disse, já com os olhos marejados. – De como ele ficava quando chegava bêbado, do medo que eu sentia... – ela não conseguiu terminar de falar, lhe doía ter que tocar nesse assunto.

– Está tudo bem, você não precisa falar sobre isso se não quiser. – ele se aproximou dela para abraçá-la, mas por instinto, ela acabou se afastando, ainda assustada. – Está tudo bem... Vai ficar tudo bem. – ele disse, lhe doía vê-la assim, tão assustada.

– Tudo começa com um grito, depois um puxão um pouco mais forte, um empurrão e quando você vê, já está com a marca da mão dele no seu rosto, e você não aceita que a culpa seja dele, porque você acredita que talvez tenha dado motivos para ele fazer o que fez... – ela voltou a respirar fundo, sem coragem para encarar Alfonso. – Você sabia que ele estava nervoso, você não podia tê-lo enfrentado, e quando você percebe, você está se culpando por ter apanhado, como se merecesse isso.

Alfonso não sabia o que falar para Anahí, já que uma mistura de sentimentos tomavam conta dele, se eles ainda estivessem na casa dos pais de Anahí, Alfonso não responderia por si e acabaria indo atrás de Rodrigo, porque ele não podia imaginar que alguém pudesse fazer tão mal assim para Anahí.

– As pessoas vivem me dizendo que uma hora isso vai passar, que uma hora eu vou me sentir melhor, que eu vou esquecer o que ele me fez, que quando eu encontrar alguém que valha a pena eu verei que nem todos os homens são iguais e vou superar isso; mas isso não é verdade, porque eu já encontrei esse alguém e mesmo assim eu não consigo me esquecer de como as coisas eram, eu não consigo superar, eu não me sinto melhor, eu não vou conseguir esquecer de como ele me fez sentir... – ela respirou fundo, tentando segurar as lagrimas que teimavam em cair, enquanto Alfonso a observava, prestando atenção em cada movimento que ela fazia e em cada coisa que falava, mas com receio de se aproximar. – Mas o que essas pessoas sabem sobre isso? Elas não viveram o que eu vivi, elas não iam dormir assustadas, com o corpo doendo e sem poder gritar ou chorar... Ninguém pode entender como eu me sentia. Rodrigo roubou tudo de bom que havia em mim, todos os sonhos... A minha alegria, tudo, ele não me deixou nada... Ele acabou com a minha autoestima, sempre me dizendo que eu não era boa o suficiente para ele, que se eu o largasse eu acabaria sozinha, porque além de levar o meu filho, ninguém mais iria querer ficar comigo, e eu acreditava no que ele dizia... Ele não me machucou só fisicamente, o psicológico era muito pior, eu vivia com medo, cada vez que ele demorava pra chegar em casa, eu torcia para que ele estivesse com outra mulher, porque tinha medo que ele estivesse bebendo... Ninguém nunca vai entender como era torcer para que seu marido estivesse na cama com outra para que ele não chegasse bêbado e quisesse descontar toda a raiva em você, e ter que aguentar tudo calada, sem poder gritar ou chorar, não interessava o que ele fizesse, nem as marcas que ficassem, eu não podia gritar, porque tinha medo de que o Enzo pudesse vir atrás de mim... Eu tinha medo do que o Rodrigo pudesse fazer com ele... – Anahí não conseguiu dizer mais nada, apenas se permitiu chorar, era doloroso recordar de tudo o que Rodrigo a havia feito passar.

– Ele não vai mais chegar perto de você. – Alfonso a abraçou, querendo protegê-la, e dessa vez Anahí não se afastou. – Ele não vai mais encostar em você.

– Mas encostou... Eu não consigo esquecer... Não consigo superar...

– Nós vamos superar juntos, eu vou estar do seu lado sempre que você precisar, nós ainda temos muito tempo pela frente...

– Temos? – perguntou, levantando a cabeça para encará-lo, era como se aquela fosse uma promessa de que ele não a deixaria, de que ambos ficariam juntos.

– Temos. – respondeu a afagando. – Só tem uma coisa que eu não entendi. – disse depois de um tempo, quando Anahí já estava mais calma.

– O que? – ela perguntou, sentada entre as pernas de Alfonso, com a cabeça apoiada no ombro do mesmo.

– Como eu me encaixo nessa historia. – disse. – Você falou o meu nome quando estava dormindo.

– Porque dessa vez eu sonhei que você estava no lugar do Rodrigo. – confessou envergonhada.

– Fui tão horrível assim a ponto de te fazer lembrar dele? – perguntou.

– Não. – foi sincera. – Eu já estava assustada com a sua briga com o Marcelo, depois você saiu e demorou para voltar, além de não atender quando eu te liguei, e quando você voltou bêbado, disse pra eu não me intrometer na sua vida, eu acabei me assustando sem motivos, sinto muito. – disse de cabeça baixa.

– Eu que sinto muito, me desculpe, eu fui um grande idiota.

– Ainda bem que você sabe. – ela sorriu timidamente, tentando deixar o ambiente mais tranquilo. – Agora é sua vez.

Mentiras (finalizada)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora