Capítulo 14

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Ando há duas horas a pensar numa desculpa para dar à minha mãe, que não trabalhava hoje de tarde porque tinha decidido ter uma folga. Quando a sua querida e dedicada filha mais velha disser que vai sair, obviamente ela vai perguntar porquê, e eu não a julgo por isso. Afinal, também eu perguntaria à minha filha de 17 anos porque motivo estaria ela a sair de casa, a uma Segunda-feira de tarde, quando o habitual é trancar-se no quarto a estudar para um teste que teria dali a três semanas? Não posso usar a desculpa de ir correr ao Parque de Bradford porque isso já foi um imenso escândalo quando se soube nesta casa. Sair de casa todos os Domingos de manhã já foi quase um ataque cardíaco nos meus pais, talvez a pensarem já que estava a fugir aos estudos por estar farta, ou qualquer coisa. Como irão reagir quando deixar de estar em casa às segundas e quintas de tarde? Ou até mesmo aos Sábados?

E que desculpa vou eu dar?

O relógio roubava-me o pouco tempo que tinha a cada passo dado pelo ponteiro dos segundos. Custa-me acreditar que em duas horas ainda não tenha formulado um bom plano, capaz de esconder a minha situação. Já me tinha passado pela cabeça dizer que ia estudar com a Carly e com a Miranda na biblioteca, mas a minha mãe é o tipo de pessoa que pega no carro e vai lá ter para ver como vão as coisas e eu não quero passar por esse risco. Não posso dizer que vou correr durante uma hora e meia ou duas horas, e não posso dizer que vou simplesmente passear, porque isso seria a pior das anomalias na minha rotina.

Sempre ouvi o Mark dizer que nunca pensa nas desculpas que vai dar, porque quando chegar a hora de falar, parece tudo planeado, ao ponto de as pessoas que queremos enganar notarem perfeitamente que estamos a mentir; por isso ele espera pelo momento e a primeira coisa que sair é sempre a mais acertada. Já me tinha passado pela cabeça fazer isso, chegar à porta de casa, dizer que vou sair e, quando a minha mãe me perguntar onde vou, inventar qualquer coisa e talvez ela acredite, já que é ignorante como é. Mas o Mark é o mestre dos truques mentais e coisas do género, até a mim já me conseguiu enganar para que eu lhe emprestasse dinheiro, e eu sou eu; simplesmente eu. Uma pessoa que só em pensar que vai ter de mentir, quase que sente náuseas, e que quando o faz, de facto, quase vomita, se for preciso. Isto é a coisa mais normal no mundo. Mentir. Todos nós o fazemos. Devia começar a fazê-lo mais regularmente, então.

Aliás... vou ter mesmo de começar a fazê-lo, porque é a minha única solução.

Só havia um problema: a minha mãe, apesar de ainda parecer acreditar no Pai Natal, ainda sabe distinguir roupa normal de outono de roupa desportiva. Convinha eu sair daqui já pronta para dar uns chutos na bola, entre outras coisas, mas obviamente ela iria desconfiar e armar algazarra, como sempre faz. O único caminho livro era preparar uma mochila qualquer, mas havia dois problemas: primeiro, vou-me vestir exatamente onde?, e, segundo, se ela me perguntar para que raio é a mochila, digo o quê?

Olhei novamente para o relógio. Já minha roubado todos os segundos preciosos que tinha. Daqui a dez minutos ele iria aparecer e eu tinha de me despachar. No mais rápido que pude, atirei um par de leggins para a mochila, uma T-Shirt dos Green Day qualquer, troquei o calçado que tinha nos pés e peguei numas sapatilhas para meter menos coisas na mochila e, quando me dirijo à casa-de-banho, apercebo-me de um outro problema, como se já não bastassem aqueles que já tinha. É suposto chegar a casa toda suada? Eu tenho de tomar banho em algum lado... a Carly não vive assim tão longe, podia ir lá tomar um duche, voltar a pé e...

Ela faria perguntas, tenho de mentir ao menor número de pessoas seguintes. E tinha de pensar melhor nisto tudo.

Mas não havia tempo para pensar porque já eram quatro e meia. Peguei no casaco que tinha na minha cadeira com rodinhas e vesti-o, procurando um elástico para prender o cabelo no meio da primeira gaveta da minha cómoda. Em seguida, saí do meu quarto a correr e desci as escadas, passando pela cozinha, onde estava a minha mãe.

Physical Education Teacher Z.M.Where stories live. Discover now