01 - Vila Nova

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O ônibus 247 em direção à Vila Nova parou e a mocinha – bela mocinha – entrou. Tinha 21 anos, mas aparentava tranquilamente ter 18. Era negra e possuía cabelos pretos e cacheados que passavam pouca coisa dos ombros. Seus olhos eram tão escuros e brilhantes como uma jabuticaba bem cuidada. Se perguntada sobre sua altura, dizia ter a média da brasileira; se sobre o seu peso, disparava:

- Nunca pergunte o peso de uma mulher, a menos que você seja seu médico!

Curvilínea de rosto delicado e expressivo, era relativamente bem paquerada.

Oh, sim, sim, a história! Ela entrou no ônibus, que não estava tão vazio como de costume para aquele horário, e parou quase em frente a um rapaz ruivo, bonito e de traços bem marcantes. Ele usava um cavanhaque – coisa que a agradava bastante – e tinha profundos olhos azuis. Nem forte, nem fraco, ela o classificaria como "definido". Trocaram olhares um tanto perturbados, a julgar pela velocidade com a qual ela olhou para a janela e ele para uma embalagem que a senhora ao seu lado acabara de jogar no chão.

"Ele podia ao menos ter pedido para segurar a minha bolsa", ela pensou, e ele a olhou novamente, expressando um "será que devo?" – a bolsa não estava pesada, ela só queria uma razão para, quem sabe, iniciar um papo.

Quinze minutos se passaram em meio a um engarrafamento na estrada principal, e agora ela batucava uma música pop no suporte de ferro pintado de amarelo do veículo, um tanto para fingir tranquilidade, outro tanto para chamar atenção. Ele observava suas unhas, compridas e bem feitas, mas quando ela fingia procurar por algo no fundo do ônibus, ele rapidamente se interessava em ler os adesivos de segurança afixados nas janelas.

E foi aí que tudo aconteceu: de repente, do último assento surgiu um homem alto, forte e moreno, que em vez de puxar a cordinha e saltar pela porta traseira, como seria o natural, voltou para o meio do ônibus e parou ao lado dela. Sua aparência desleixada a assustou um pouco, mas ela logo entendeu:

- Então você se amarrou em mim, hein?

- Me amarrei?

- É! Eu notei que você não parava de me olhar.

- Eu? Olha, desculpe, mas eu nem havia reparado em você... Não até agora...

- Ah, princesa, o que é isso, não precisa disfarçar... Qual é o problema de a mulher começar uma paquera? A gente tá no século vinte e um, certo?

- Certo.

- Então tudo bem, me fala aí o seu nome.

- Alícia.

- Prazer, Renato, mas a galera me chama de Pavão.

- Pavão?

- É, tu sabe, coisa de criança.

- Ah, Pavão, mas está acontecendo um mal-entendido aqui.

- Tipo o quê?

- Tipo que eu realmente não estava olhando pra você.

- Então era pra quem?

- Pra ninguém em especial... Sabe quando você está no ônibus e não tem nada pra fazer? Se eu estivesse sentada, leria um livro ou tiraria um cochilo, mas como estou em pé e prezo pelo meu equilíbrio, só me resta olhar para os lados.

- Ah, tô ligado... Mas, bem, agora você pode olhar pra mim. – E a fitou com seus nada convencionais olhos cor de âmbar.

- É, posso...

- E pode me dar seu telefone também.

- Telefone?

- É! Não tem?

Jogo de confiançaWhere stories live. Discover now