27 - O Resgate

10 2 16
                                    

Os gêmeos chegaram à casa de Sara cantarolando. Sem saber o motivo de tanta alegria, Sara cantou e dançou também. Entendeu como um daqueles momentos em que o melhor a fazer era entrar na onda dos amigos, mas logo o clima mudou.

Angélica esticou o braço, e de sua mão provinha um envelope pardo. Entregou à Sara, enquanto declarava:

— Seu Manolo nos pediu para entregar esta carta a você. Disse que era de um namoradinho, que parecia muito chateado com a briga de vocês.

— Agora o Manolo virou casamenteiro? E em vez de entregar a carta diretamente a mim, envolve minhas visitas? Ah... Vou conversar sério com ele mais tarde... – Pegou o envelope.

— Ah, não seja ranzinza, Sara Lee! Anda, abre isso logo pra gente saber tudo o que nosso ruivinho é capaz de fazer pra ter você de volta.

— Se é que o assunto é esse.

— E quem gastaria tempo escrevendo uma carta pra fazer reclamações?

— Cecília Cupertino.

Afe, Cecília é um ser subversivo em muitas esferas. Não podemos comparar a humanidade a ela.

Sara revirou os olhos, apoiou a mão esquerda no rosto, suspirou, mas fez que sim.

E leram a carta.

Paravam em pontos chave para fazer comentários, como:

— Ele disse que não sabe escrever belas palavras, mas usa termos como "arrependimento que me aflige"?

— E declarou que você estava certa? Ora, ora, ora... Temos um jogador aqui!

— Aprender com você...

— E citou BTS! Para! Eu caso!

— Você anda tão desesperado que se casaria com qualquer um que te desse bom dia sorrindo, gêmeo.

— Ai, como você é exagerada...

Os irmãos estavam tão ocupados com essa discussão, que não notaram o quanto a carta mexera com Sara. Ela estava puxando a orelha direita, coisa que fazia desde criança quando tinha medo ou ficava preocupada, ansiosa, ou evitava chorar.

Mas, apesar disso tudo, Sara tinha o seu orgulho. Não seria uma carta que mudaria as acusações que recebera. Preconceituosa, mentirosa, devoradora de homens, infantil... Tá, não foram essas as palavras dele, mas foi assim que ela as recebeu.

E quando os gêmeos voltaram a sua atenção alegre pra ela, Sara foi até um pouco dura:

— Pronto, já terminaram a sessão de aonde-Sara-vai-casar? Estou admirada com você, Angel, que até outro dia comparou o boy a um bandido e...

— Olha, amiga, não adianta dizer que essa carta não foi nada demais. Se já tivesse superado o ruivinho, você não tinha nem aberto o envelope, ou então faria piadas bem maldosas a cada frase – o que me provocaria gargalhadas, você sabe. Nada a ver tentar ser cruel conosco só porque estamos torcendo pela sua felicidade amorosa.

— Hum... Tá... Desculpa... Mas pra vocês entenderem que eu não quero mesmo na-da com essa criatura, olhem:

E amassou o envelope, tacando-o na lixeira de papel da sala.

Minutos depois, com Sara tendo ido ao banheiro, Jonas flagrou Angélica resgatando a carta amassada de onde fora jogada. Enquanto a guardava na bolsa, justificou-se:

— Ela vai querer isso no futuro, não vai?

— Provavelmente sim... Você é uma boa amiga, bisca. Vai guardar junto das roupas e da bolsa de melancia?

— Claro, tudo pra quando ela cair em si.

— Se não for tarde demais...

— Nunca é tarde demais para o amor...

— Menina! O que está acontecendo no mundo, que Coração Gelado anda com atitudes, como direi, fofas?

— Ah, eu sou fofa!

— FOFA?! – gritou Sara do corredor. – Só se o comparativo for uma almofada cheia de alfinetes!

— Ai, mas vocês me arrasam também...

— Isso é amor, gêmea!

— Amor bandido!

— Mas bandido também tem família, você disse...

— Socorro! Todas as minhas palavras serão decoradas e usadas contra mim?

— Só as mais poderosas.

E a tarde deles foi pontuada por estudos e implicância, como um bom momento entre o trio poderia ser.

Ao fim do dia, com os gêmeos longe, Sara correu para a lixeira de papel da sala e a revirou. Encontrou papéis de bala, rascunhos de resumos para as provas, papel de revista, tudo, menos a carta que adoraria reler até dormir.

Ele a queria de volta. Ele pedira perdão. Dissera, sim, todas as palavras certas, mesmo não sendo um poeta, porque a verdadeira poesia era saber amar.

Mas será que ela sabia? Será que ela queria? Será que estava pronta para se machucar ainda mais? Porque o amor lhe parecia algo doloroso!

Passou a noite se revirando na cama, cheia de questionamentos, dormindo somente ao clarear da manhã de domingo.

Jogo de confiançaWhere stories live. Discover now