Causa perdida.

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Aviso de conteúdo extremamente sensível.

— Ezequiel? — Flora questionou enquanto picava as cenouras para a janta apressadamente. — O que tanto faz? Quanto barulho. — Reclamou ouvindo que o homem transitando entre o quarto dela e o da filha. — Assim você acabará acordando Esmeralda.

— Só um segundo, querida. — Respondeu, estava tão perdido na agitação dos seus pensamentos que não conseguiu nem raciocinar o questionamento de Flora.

A ruiva claramente estranhou, odiava quando ele ficava com esse tom passivo. Devido aos últimos dias que haviam sido de inúmeras discussões, o apelido que Ezequiel tanto cobrava de Flora, para que ela lhe chamasse de querido, não era mais proferido. Sempre que a costureira ouvia ele outra vez, era como um sinal de alerta, ou o homem queria algo ou ele iria fazer algo.

— Ezequiel! — Voziferou irritada com a falta de consideração dele, largou a faca na tábua de madeira de qualquer jeito, secou as mãos sujas e molhadas no avental e foi até o homem. — Está tentando me provocar? — Perguntou sem paciência.

Assim que chegou na porta, as sobrancelhas franziram em dúvida, uma enorme interrogação cresceu em sua feição. Ezequiel  arrancava as roupas dos cabides de madeira, açoitando elas de qualquer jeito em uma sacola de pano aberta no chão, ele então a olhou e resolveu revelar o que tanto fazia.

— Nós vamos nos mudar. — Falou com a tranquilidade de alguém que contava uma informação simples.

— Nós? — Ela perguntou cruzando os braços. — Por que isso tão de repente? Pra quê essa pressa toda? — Flora não era burra, sabia que ele escondia algo há muito tempo, também imaginava que tinha alguma outra mulher no meio, só não se importava o sufiente para descobrir o que era, não sentia nada por Ezequiel e por esse motivo ele podia fazer o que bem entendesse, inclusive traí-la. Já que sua esposa de verdade era Serena.

— Porque o comércio não está funcionando, meu chefe não aceitou meu pedido de aumento... Porque também eu sou o homem da casa, eu sustento, eu decido e eu quem mando. Eu não lhe devo justificativas. — Seguia tirando todas as camisas dele e guardando.

— Só lhe fiz uma pergunta, não há motivos para que se ofenda tanto... A não ser que esteja me escondendo algo. — Ela insinuou, usando da sua esperteza e humor ácido, era tão irônica e debochada quanto sua esposa, por esse motivo se davam tão bem. — Você mente tão mal, querido, é óbvio em seu desespero e no seu suor que está com medo de alguma coisa.

— Flora, cale-se. — Ele ordenou contendo-se.

— Agora eu passei a ser a Flora? — Debochou. — Do que tanto tem medo?

Ele a ignorou, ignorou o olhar de superioridade que recebeu, ela tinha a cabeça erguida, os olhos semicerrados analisando tudo o que ele fazia, parecia tão fria e calculista como ele.

Claramente Flora já havia pensado em um plano, se aproveitaria da desculpa de que ele estava dormindo com outra para se separar, é óbvio que naquele tempo os homens poderiam fazer o que quisessem e se ela não fizesse da maneira correta, provavelmente acabaria espancada e ainda tendo que aceitar ele com inúmeros casos pela cidade. Mas, se o plano seguisse conforme ela havia pensado, todo o seu teatro de fingir ofensa porque não era suficiente, chamaria atenção de todo o vilarejo, fingiria ser uma coitada e adotaria uma postura de uma mulher que estava extremamente ofendida com a atitude do marido, pois havia dado absolutamente tudo o que era necessário naqueles tempos, ele tinha comida na mesa, roupas lavadas e uma filha, o que mais ele queria?

O seu repertório estava completo, com toda a  atuação conseguiria comover aquele vilarejo, consequentemente conseguindo também a separação e passaria o resto da vida solteira como uma mulher que não casaria com ninguém por estar traumatizada demais por tudo o que o ex-marido fizera. Podendo assim viver ao lado de Serena sem que houvessem mais pretendentes para ela, dedicando-se então apenas a sua esposa verdadeira.

Cartas para Flora - Lésbico. (CONCLUÍDO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora