Turbulência.

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Aviso de conteúdo sensível: Violência física.

— Serena. — Kassandra tentou ao ver a moça entrar em casa, mas ela ignorou totalmente, nem sequer tinha ouvido sua mãe falar.

A matriarca soltou a faca em cima da tábua de madeira, secou suas mãos molhadas e sujas no pano de prato que tinha amarrado na cintura e foi atrás da jovem mulher... Estava tentando ser paciente.

— Serena Kalitch. — Tentou outra vez. Mas foi novamente ignorada, a morena parecia não escutar, estava desnorteada. — Serena Kalitch! Eu estou falando com você! — Adotou um tom mais sério agarrando ela pelo braço e obrigando a moça a olhá-la. — Sou tu mama e ordeno que me escute.

E o gesto foi como se sua mãe estivesse puxando-a dos seus pensamentos mais profundos e tristes, foi quando ela finalmente pareceu enxergar a mãe que quase gritava tentando chamar a atenção da moça que entrou perdida dentro de casa. Não pensou duas vezes, seus braços envolveram o corpo esbelto da mulher  mais velha alta e morena, o rosto encostou no busto avantajado para ouvir os batimentos cardíacos, costumava fazê-lo para acalmar-se desde muito pequena, sempre quando estava em apuros, a reação era a mesma. E então desmoronou em um choro doloroso e sofrido, não tinha vergonha, só queria ser acolhida... Ainda que quisesse que esse acolhimento vinhesse de Flora, queria que ela sim tivesse puxado-a, abraçado-a e acalmado-a, agora não podia mais tê-lo, porque estava brigada com ela e queria manter sua palavra, apesar de ter um coração muito mole, o assunto mudava totalmente quando se tratava de mágoa.

— Ô mama... — Serena clamou, como se chamasse sua salvação, como se pedisse para que sua mãe arrancasse sua dor e ao mesmo tempo disesse o quanto estava doendo.

— Ô mi amor! — Kassandra falou comovida com o choro, acariciava as costas da mulher que agora parecia mais uma pequena menina indefesa. — Quem te machucou dessa forma, minha flor? — Depositou a mão quente na bochecha na filha e beijou o topo da cabeça dela.

Recebeu o silêncio em resposta, a insegurança da mulher de contar a verdade, mas ela decidiu cutucar ainda mais.

— Discutiu com Flora? — Questinou curiosa, esperando que Serena se abrisse de verdade. A moça assentiu apertando mais o corpo da mãe. — E por quê?

— Mama, não me pergunte o porquê. — Pediu com seu coração partido, esperava que Kassandra respeitasse o seu direito de não querer falar de fato sobre o que tinha acontecido.

— Por Flora vale a pena toda essa dor? — Era uma pergunta profunda. — Te aconselhei Serena, amizade demais não presta.

— Vale mama, por ela vale. — Foi seca e começou a prestar atenção nas batidas do coração da sua mãe.

— E você acha que foi uma discussão válida, mi hija? — Era sempre a mesma pergunta, desde que Serena era pequena. Sabia que ela era explosiva, que às vezes era agressiva e ignorante, que apesar de ser uma moça controlada, às vezes acabava se perdendo um pouco... E essa pergunta lhe trazia de volta para o seu ser, mexia com sua consciência e fazia a moça pensar no que havia acontecido sem os nervos à flor da pele. — Temos que avaliar bem sobre o que queremos brigar... Ainda que fique difícil aconselhá-la sobre o que aconteceu, pois não sei de verdade. — Mentiu, sabia muito bem do que se tratava, só não tinha visto a discussão.

— Mama, eu estava cansada em relação a forma que ela me tratava... Mas agora me sinto culpada, sinto saudades já. — Confessou limpando suas lágrimas de uma forma bruta. — Aye! Me odeio por ter um coração tão mole. — Sentia raiva até de si mesma.

Cartas para Flora - Lésbico. (CONCLUÍDO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora