Abri os olhos e respirei fundo. O relógio marcava duas da manhã, dali a vinte minutos o taxi passaria pra e pegar. Tinha que ser rápida.
Tentando fazer o mínimo de barulho, troquei de roupa. A camisola foi parar na mala e em seu lugar vesti uma calça jeans, bota, blusa e uma jaqueta de couro. Estava começando o inverno que não costumava ser nada fácil e isso deveria ser o bastante pra me proteger.
Mai dormia de bruços com um braço para fora da cama. Era engraçado de ver o sono tão pesado pra alguém tão delicada. Dei um beijo em sua cabeça e sai do quarto antes que ela acordasse. Sentiria falta da minha pequena grande guerreira, mas era necessário.
Descer com a mala não foi uma tarefa fácil, ainda mais de madrugada. Não queria que ninguém acordasse. Despedidas não eram o meu forte, então sair na madrugada era o ideal. Além do mais não queria dar à Alice o gostinho de me ver saindo de casa.
Aos pés da escada Whiskas miava. Pela primeira vez ele me permitiu que eu abaixasse e o pegasse no colo. Era certo que não nos dávamos muito bem, mas confesso que me acostumei com aquele gato e até sentiria saudades dele.
- Sei que não fomos os melhores amigos, mas eu vou sentir falta de você. – Em resposta, Whiskas meteu o focinho no meu pescoço e ficou miando baixinho. Acariciei seu pelo e passamos assim alguns segundos agradáveis.
- Você achou mesmo que eu ia perder essa cena? – Alice disse descendo as escadas como se fosse uma rainha frente aos súditos.
- Mudei de ideia Whiskas. Pode deitar na minha cama o quanto quiser. E pode miar muito a noite, Mai não vai se importar e ah, pode arranhar as pernas dessa perua a vontade. – Dei um beijo na cabecinha dele e o soltei. No mesmo instante ele passou por Alice, mas não sem antes ranger os dentes e arranhá-la.
- Ai seu vira-lata fedorento! – Reclamou e contive o sorriso. – Você vai ver quando eu fizer churrasquinho de gato! – Ele subiu sem das bola pra ela.
- Não ouse ameaçar Whiskas. – Puxei-a pelo cotovelo. – Ele está aqui há muito mais tempo e assim vai permanecer.
- Com certeza mais tempo que você que pelo visto... já está de saída não? – Provocou e eu fiquei com vontade de esmurrar a cara dela. Mas iria acabar acordando os outros e isso incluía Poncho, ela se faria de vítima e.... bem vai ver era isso que ela queria. – Sabe de uma coisa? Acho que já vi essa cena antes... se bem que... os papeis se inverteram não?
Que ela estava fazendo de propósito, isso era óbvio. Ela estava se divertindo com a situação. Dessa vez era eu quem estava saindo de casa, mas se querem saber, nas atuais circunstâncias até não me importava muito. Na verdade até gostava já que o clima naquele lugar não estava nada bom pra mim, era qualquer coisa menos um lar.
- Podem até ter se invertido, mas quem está com mais sorte sou eu. – Disse e ela não demonstrou nada. Pelo jeito teria que explicar com desenhos.
- Está falando isso por estar despeitada. Você está indo embora e eu fiquei. Você perdeu e eu ganhei. – Cruzou os braços e sorriu debochada parecendo uma criança mimada.
- Não se engane Alice. Pode até achar que está ganhando, mas não tem um pingo de amor próprio pra conseguir as coisas por si mesma.
- E quem é você pra criticar? Você não conseguiu Poncho por si mesma. Tive que sair, aliás você me expulsou e só então conseguiu ficar com ele. – Disse e contive a vontade de dar um tapa naquele rostinho cheio de maquiagem.
- Não Alice, eu não fiz nada de errado. – Afirmei e ela riu com escárnio, mas logo esse sorriso sumiria do seu rosto. – Eu apenas protegi Poncho da namorada vagabunda que o traia com o namorado da melhor amiga! – Dito e feito, no mesmo instante ela tentou bater em cima, segurei sua mão no ar. – Não ouse. Fiz muito pouco até agora, mas não duvide quando digo que posso te destruir e aviso que agora não tenho mais nada a perder.
Ela recuou parecendo finalmente entender que eu não estava de brincadeira. Se eu ia sair dessa casa seria com a cabeça erguida, não humilhada como ela pretendia.
- Você é uma vadia! – Sibilou com raiva. – Não tem nada que se meter na minha vida. O que eu fazia, faço ou farei com Poncho é assunto absolutamente meu. - Disse e então riu. – Sabe de uma coisa? Você bem que mereceu o chifre. Não é culpa minha se Diego reclamava que você não o satisfazia e ele tinha que procurar fora o que você não dava.
"Ah se ela pensa que vai sair por cima está muito enganada! Dá o troco nela Anahí!"
- Ah é mesmo? Que interessante! Acho que o problema sempre foi você! Sempre teve inveja da minha amizade com Poncho, depois do meu namoro com Diego e agora do meu namoro com Alfonso. Gosta de pegar as minhas sobras não é mesmo?
- Oras sua... rata de bueiro! – Sibilou e ri da sua cara de histérica. Só faltava sair fumacinha pelo nariz. – Você coloca a culpa em mim, mas quem mentiu pro melhor amigo pra ficar perto dele numa festa foi você.
- As coisas não foram bem assim e você sabe! – Cortei e ela deu de ombros. – Mas é claro que sabe! Não é de se admirar que foi você quem mexeu no meu diário e entregou aquelas páginas para o Poncho!
- Mais cedo ou mais tarde ele saberia a verdade. – Ela deu de ombros como se tivesse falando a coisa mais natural do mundo. – O que pensou? Que ele ficaria com você pra sempre? Ele só estava te usando pra me esquecer garota! Coloque isso na sua cabeça! – Disse e o tom de segurança era assustador. Eu sabia que isso não tinha como retrucar. Alfonso e eu só começamos algo porque queria esquecê-la. Ele deixou bem claro isso. - Portanto, se tem alguém aqui que sempre sobrou e ainda sobrando nesse espaço é você.
- Não Alice. Quem está sobrando aqui... é você!
Confesso que estava indignada com Alice, mas fiquei completamente sem palavras quando vi Poncho na metade da escada. Pisquei algumas vezes pensando em se tratar de uma alucinação, mas não estava bem ali, terminando de descer as escadas e seu rosto não indicava nada do que estivesse pensando.
- Pon... não é nada disso que você está pensando. – Alice disse com aquela vozinha fina irritante. – A culpa é toda dela! – Apontou pra mim, mas nem me movi. Era capaz de atacá-la.
- Não foi isso que eu ouvi. – Ele disse. Eu estaria feliz se isso tivesse acontecido há uns dois meses atrás, mas não agora. Poncho havia tido todas as chances pra acreditar em mim, menos agora, já era muito tarde pra isso.
- Com licença vocês se merecem. – Puxei minha mala em direção a porta. O taxi já deveria estar ai na frente e eu já tinha perdido muito tempo com aqueles dois.
- Annie não! – Poncho me puxou pelo pulso até que bati em seu peito. Seu semblante de arrependimento ao invés de me comover me irritou profundamente. Ele tentou me abraçar, mas me afastei no mesmo momento.
- Não! Você já teve a sua chance! Precisava ter acreditado em mim e não acreditou!
- Annie eu...
- ANAHI PRA VOCÊ! – Dessa vez era eu que fazia questão que ele me chamasse pelo nome. Não éramos mais amigos e não é porque agora ele descobriu a verdade que eu voltaria atrás. Ao contrário, isso só me deu mais raiva. – Agora me deixe! Antes que eu faça um escândalo e acorde a casa toda! – Ameacei e não estava brincando. Poncho percebeu isso e me soltou no mesmo instante. Sem esperar por mais nada peguei minha mala e abri a porta, mas não sem antes ouvir uma última asneira de Alice.
- Está vendo? Como pode querer uma pessoa que te despreza Pon? Além do mais eu estou aqui e...
- Não esperei pra ouvir mais nada. Simplesmente puxei a porta e deixei toda aquela confusão pra trás.
De fato eu estava feliz, na verdade tranquila por Alfonso estar descobrindo a verdade, mas... também me sentia chateada por isso ter acontecido só agora. Ele podia ter confiado um pouco em mim, agora estava tudo de fato perdido. Mesmo que ele viesse pedir desculpas jamais voltaríamos a ser a Annie e o Poncho de antigamente, muitas coisas foram ditas e isso tornava praticamente impossível voltarmos atrás.
O taxi já estava em movimento e as cenas de agora pouco ainda insistiam em rondar a minha cabeça. Eu não estava muito certa de como estava me sentindo. Por um lado eu ficava feliz, afinal uma hora ou outra aquela vaca tinha que ser desmascarada e o bom é que eu nem tive que fazer nada, ela mesma se entregou.
Por outro lado minha relação com Poncho já era. Eu sou orgulhosa demais pra aceitá-lo de volta só porque ele descobriu a verdade. Além do mais, esse relacionamento havia começado de forma errada. Alfonso não gostava de mim. Infelizmente ele gostava era dela e não de mim, por mais terrível que fosse ter que aceitar isso. Portanto mesmo que Alice não tivesse interferido, uma hora ou outra meu namoro teria acabado.
- É aquela casa amarela ali na frente. – Falei pro taxista que aos poucos foi diminuindo a velocidade até parar em frente ao sobrado.
Dizem que Deus sempre faz as coisas certas, na hora certa ainda que as vezes a gente não entenda. Pois também é verdade que mais cedo ou mais tarde passamos a compreender. Era isso que estava acontecendo. Quando Dulce foi expulsa da república, fiquei sem entender porque Deus permitiu uma coisa dessas, mas agora, estava certa de que um dos motivos era ter pra onde fugir neste exato momento. É claro que com certeza este não era o único, mas já estava satisfeita por hora.
- Obrigada. – Agradeci depois do taxista deixar as malas na entrada da casa.
O relógio marcava três e vinte da manha. Fiquei assustada que aquela confusão tenha durado tudo isso de tempo, afinal não estava muito longe de casa, a viagem de taxi foi curta.
Por conta do horário decidi procurar a chave que Dulce e Maite decidiram deixar escondida no fundo falso do terceiro vaso de flor. Ri ao pegar a chave. Dulce tinha essas coisas, adorava esses filmes de agente secreto e Maite apoiava as ideias loucas que ela dava.
"Se algum dia precisarem, essa chave é de vocês." – Ela disse e nunca pensei que isso fosse ser útil.
Abri a porta lentamente pra não fazer barulho nenhum. Puxei minhas coisas pra próximo do sofá. Pretendia dormir no sofá pra não acordá-la. Além do mais precisava de um tempo pra pensar em tudo o que tinha acontecido.
- Humm esse cheiro me deixa louco sabia? – Voei pra trás do sofá. No instante seguinte vi a silhueta de duas pessoas aparecerem na sala totalmente escura.
"Não pode ser!"
Creio que isso não deve ter saído apenas em pensamento porque no instante seguinte a luz de acendeu e tão consternados quanto eu ouvi um...
- ANNIE?
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Hey FELIZ NATAAAAAAAL!
O capítulo não é grande, mas espero que possa ser considerado como um presente de Natal!
Por hoje é só meus amores, aproveitem!!!
Bjinhsusss