•Capítulo 17•

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"Tempestade"

London

Três dias depois.

— Ei pessoal, vamos encerrar o trabalho. - pede Roger, acenando para o céu cinza escuro acima de nós. Pássaros voam rapidamente como se tivesse fugindo de algum pregador. Seu canto parece um aviso. E eles estão seguindo em bando.

Há uma grande tempestade se aproximando, e desde que nós trabalhamos em uma área totalmente descoberta, não há como nos protegermos.
Então se Roger está pedindo que encerremos o dia duas horas depois do almoço. Eu sou o primeiro a largar a marreta.
Tudo por uma folga em plena quarta-feira.

Tiro chapéu e o seguro em meu peito, olho para o céu mais uma vez. Parece como nos filmes de terror sobre tempestades. Há aquele vento soprando, nuvens carregadas se arrastando, e a escuridão ameaçando chegar a qualquer instante.

— Estamos liberados então? - pergunta Jack sem conseguir esconder a animação.

Pulo fora do buraco, e começo a ajeitar meu uniforme. Só preciso pegar minha mochila e dar um fora daqui o mais rápido.
Roger coça seu queixo, e diz:
— Sim, aumentamos o turno quando o dia estiver bom novamente.

Confesso que não gostei dessa parte, mas vamos lá, pelo menos ganhei o resto da tarde de hoje. Sigo para o contêiner e pego minha mochila. Tiro meu uniforme e o guardo na bolsa. Jogo ela em minhas costas, e saio.

— Valeu pessoal, até mais. - aceno para todos antes de sair.

— Fique seguro, London. - disse Jackson me encontrando na saída do portão.

— Você também cara.

Sigo para o ponto de ônibus, porque não sou como meu amigo Jackson, que mora a uma quadra da construção. Espero pacientemente por meu transporte para casa, e fico me perguntando o tempo pode mudar tão rápido. Quando sai de casa esta manhã não parecia que iria chover. O céu estava claro e um sol sorrateiramente aparecia ao longe. Agora parecia noite às duas horas da tarde.
Faço sinal quando vejo o ônibus se aproximando, ele para e eu entro. Aliviado por conseguir chegar em casa antes da tempestade que está vindo.
Há algumas pessoas apreensivas, todas olhando atentamente para o céu cinza. Desabo no banco, e deito minha cabeça. Fecho meus olhos, e começo a desejar estar em casa, embaixo das minhas cobertas e só sair amanhã de manhã.
Se tudo der certo.

Chego em casa quinze minutos depois, e a vizinhança parece ter se recolhido faz tempo. Entro em casa, e fecho a porta atrás de mim. Solto minha mochila no canto, e sigo para o banheiro. Retiro minhas roupas suadas, e ligo o chuveiro. Logo a água quente começa a aquecer meu corpo. Só então eu começo a ouvir barulhos estranhos, espio pela janela e vejo redemoinhos levantando toda sujeira do chão.
Caramba.
O vento começa a se intensificar e a luz do meu banheiro começa a piscar. Merda. Preciso me apressar. Ensaboo meu corpo rapidamente, enxugo depois. Pego minha toalha, e a enrolo sobre minha cintura. Vou até o armário, e pego meu desodorante e aplico dois jatos em cada axila.
Saio do banheiro e meus olhos ficam arregalados. O vento conseguiu escancarar minha porta. Isso me lembrou que eu me esqueci de passar a chave. Fui até ela, lutando contra o vento forte. Sentindo meu peito ser castigado pelo ar raivoso. E empurro a porta de qualquer jeito. Até que toda bagunça fica lá fora.
Suspiro.
Vou para meu quarto, e separo uma bermuda, e uma camiseta branca. Me visto, e decido chegar se tudo está em ordem. Quando volto para sala, escuto o zumbido dos ventos ficar ainda maior, e agora acompanhado pelo gotejo do que parecia ser água.
As torneiras do céu foram abertas.

                            §

Um par de horas depois, a tempestade perdeu sua intensidade. Agora não há nada lá fora além de uma incessante chuva pesada. O clima já mudou até mesmo aqui dentro de casa, então eu peguei um casaco de moletom e agora estou bebendo uma xícara de café em meu sofá.
Fico agradecido por ter ido ao supermercado no fim de semana, assim eu não preciso lutar contra chuva com um guarda-chuva meia boca que tenho jogado em algum canto do meu depósito.
Pego o controle remoto e ligo a televisão apenas para ter companhia nessa tarde chuvosa e fria. O programa que surge é de culinária, então eu troco para notícias do dia. É mais interessante, obviamente. Logo uma mulher usando capa de chuva amarela aparece na tela segurando um microfone e falando freneticamente sobre como a tempestade pegou todo mundo desprevenido mais cedo.
Fico chocado quando vejo o estrago que está lá fora. Ninguém realmente consegue combater as forças da natureza. Continuo obcecado olhando as reportagens, e de repente sinto meus olhos pesados. Não luto contra sua vontade. Deslizo meu corpo pelo sofá, e deito minha cabeça na almofada vermelha. Deixo meus braços cruzados em cima do meu peito, e fecho meus olhos, e me permito dormir. 

Não parece que dormir tanto até acordar com batidas na porta, três horas depois. Esfreguei meu rosto, e segui cambaleando até a porta. Quem seria a essa hora?
Tentei procurar algum relógio à vista, mas não encontrei pela minha sala. Girei a chave, e peguei a maçaneta. Pelo som a chuva já tinha parado, então eu não tive medo em abrir a porta.
Só que meu coração não estava preparado para o que estava bem na minha frente.

— Olá - cumprimenta Lexie, parecendo nervosa. O céu atrás dela está escuro como antes, mas dessa vez era porque já estava noite.
Caramba.
Eu realmente cochilei bastante.

Continuo mantendo a porta aberta, e passo minha mão pelos meus cabelos. Devem estar amassados por causa da almofada. Ela não parece espantada pelo menos.
— Oi. - retribuo, momentaneamente confuso.

Seus olhos escapam por cima do meu ombro. Acho que ela está tentando ver algo além de mim.
O que? Eu não sei.

— Você tem luz? - pergunta ela.

Instintivamente já saquei o porque que ela está aqui, mas decido brincar um pouco. Afinal eu não a via desde aquele final de semana em que eu fiquei observando-a se afastar com sua irmã barriguda.

— Claro, eu sou um ser muito iluminado. - provoco.

Ela revira olhos.
Eu gosto disso nela, é sexy.

— Eu estou perguntando se você tem energia. - sua mão acena para lâmpada da minha varanda.

Finjo que agora caiu minha ficha, mas não resisto.
— Todo dia de manhã quando acordo.

Ela bufa em frustração, e leva as mãos até seus cabelos rebeldes.
— Porque mesmo eu vim até aqui? Droga. - ela se xinga, agitando os braços exasperada, sorrio vendo a cena.
Ela é uma coisinha muito atraente.

Mas quando percebo que ela vai se afastar, eu me desespero. Não quero que isso acabe tão rápido. Dou um passo pra frente, e seguro seu braço. Não posso deixar de notar que meu corpo se acendeu apenas com esse rápido toque.

— Eu tenho luz, porque? - digo, finalmente.

Suas bochechas estão vermelhas quando ela gentilmente tira o braço do meu alcance.
— Liguei para Sarah, e ela disse que tinha também. Então eu presumi que o lado de lá tivesse, mas queria me certificar de que alguém mais não tinha, como eu.

— Você está sem?

— Desde que começou a tempestade.

Isso faz algum tempo.

— Espere aí. - peço e então entro de volta em casa. Vou até meu depósito rapidamente, pego minha maleta, e reapareço na porta. Ela sorri quando me vê. E desde que nós nos conhecemos. Este parece seu primeiro sorriso sincero.
Meu pau se contorce.

— Vamos lá, eu posso checar pra você.

Ela inclina a cabeça para trás, e franze a testa.
— Você sabe?

Finjo que estou ofendido. Mas entendo que ela não saiba ainda o que eu faço para sobreviver. Levo a mão até meu peito, e digo:
— É o meu trabalho, princesa.

Ao Seu Lado Where stories live. Discover now