Capítulo 71

157 28 7
                                    

HELENA NARRANDO...

Minha mãe pediu medida protetiva contra a Rosana, mas mesmo assim eu não me sentia bem andando na rua. Eu fazia terapia ainda por conta da anorexia e já falava de outras coisas, falava do meu namoro, queria levar a Duda na minha casa e apresenta-la direito pra minha família, mas estava difícil fazer isso também porque minhas mães estavam brigando e agora dormindo em quartos separados. Meu irmãozinho estava com dengue e no final de semana acabou minha mãe Pri, a Laura, o Hugo e o Samuel com dengue, só eu, a mamãe e a Juju não tivemos. Na terça feira a van pegou só eu em casa e logo cheguei na escola.

Duda: Cadê seus irmãos? – me deu um selinho.

Eu: Com dengue.

Duda: Eita, pegou todo mundo então?

Eu: Menos a minha mãe Natalie, eu e a Julinha. – fomos andando pelo corredor.

Duda: Está tristinha o que foi?

Eu: Ah... O clima lá em casa não está legal sabe. Minhas mães estão brigando, dormindo em quartos separados e isso tudo tem um grande dedo da minha avó. A minha mãe Pri é muito cabeça dura, mas eu também entendo a exaustão dela com relação a tudo isso, e sinto que ela faz isso com a mamãe pra se proteger sabe, porque se a mamãe em algum momento embarcar na cabeça da minha avó, vai ser insuportável pra ela. E eu tenho notado como ela tem afastado o Samuel da mamãe, como se ela não fosse mãe dele também entende.

Duda: Como assim?

Eu: O Samuel é filho da mãe Pri, ele é o único filho biológico gerado por ela. E a minha avó questionou o fato dele ter o sobrenome da família dela, mas ela fez isso sem dúvidas pra pisar na mamãe porque ela vive pra fazer mal pra ela, e depois disso a mamãe disse que ia tirar o sobrenome dela do Samuel e ela não desgruda mais dele, deixa a mamãe de fora de tudo relacionado a ele, como se quisesse afastá-lo dela, e isso me assusta.

Duda: Como se ela quisesse protege-lo, mas ele não precisa ser protegido dela.

Eu: Sim. A mamãe está projetando a vovó em tudo e em todos e isso está fazendo as duas brigarem cada vez mais. Hoje ainda tem aquela apresentação de trabalho sobre famílias acho um saco isso, ter que falar de família ainda mais agora que minha família está assim. – suspirei.

Duda: Ai amor, relaxa. A dona Eleusa faz isso em todos os primeiros anos, quer saber a profissão, como a família foi formada. Parece que ela não tem outra coisa pra ensinar e fica fazendo isso. Relaxa. – me deu um beijo e foi pra sala dela. A primeira aula era a aula da dona Eleusa e logo foi a minha vez.

Eleusa: Helena... Helena...

Eu: Oi... desculpa... – levantei e fui lá na frente me sentando na mesa que tinham colocado no meio da sala.

Eleusa: Fale um pouco sobre sua constituição familiar.

Eu: Bem... Como sabem, meu nome é Helena Smith Pugliese, mas esse não era meu nome antes. Meu nome era Helena Dias. – todo mundo ficou meio surpreso até a professora. – Eu tenho duas mães e isso todo mundo sabe também e quatro irmãos. Meu irmão Hugo é mais velho ele vai fazer 18 anos em dezembro estuda aqui no ultimo ano, a Laura está no oitavo ano e estuda aqui também, o Samuel está no Kindergarten ele estuda no Liessin, tem 5 anos e a Ana Julia tem 1 ano 9 meses diz a minha mãe que ela é a rapinha do tacho. – todos riram. – Minha mãe Natalie tem 37 anos ela é empresária do ramo da hotelaria e minha mãe Priscilla tem 36 ano ela é juíza estadual. Como eu disse meu nome antes era Helena Dias. Eu e o meu irmão Hugo fomos adotados com 5 e 3 anos pela Natalie e pela Priscilla. Nossos pais biológicos eram envolvidos com drogas e a gente vivia numa situação de extrema pobreza e abandono. A gente passava fome, pedia dinheiro no sinal, eramos muito maltratados e a minha mãe Priscilla na época era advogada de um abrigo que nos resgatou, então eu e meu irmão fomos adotados por ela e pela minha mãe Natalie. – os alunos poderiam fazer perguntas. Era uma aula tipo de psicologia e relacionamento interpessoal.

XXX: Helena, desculpa a pergunta, a gente sempre estudou junto e tals, não quero parecer ofensivo, é curiosidade e porque eu realmente não sei mesmo. Mas como se sente sendo filho de duas mulheres e sabendo que veio de uma família em que você e seu irmão tinham uma vida muito precária? E você já sofreu homofobia por ser filha de duas mulheres e agora estar namorando uma menina? Acha que a relação das suas mães influenciaram nos seus relacionamentos? Se quiser responder é claro. Eu realmente não entendo nada disso. – ele era o garoto mais marrento da sala e que encrencava com todo mundo e ele realmente pareceu interessado em entender.

Eu: Tudo bem. E tem gente que não tem familiares ou amigos e nem convívio com pessoas LGBTQIA+ então é normal ter um certo desconhecimento. E sobre como eu me sinto sendo filha de duas mulheres, pra mim é normal. É como você ter seu pai e sua mãe. A única diferença é que eu tenho duas mães, que me amam, que me respeitam, que colocam limites no que a gente pode e não pode, que nos ensina muito sobre muitas coisas. Eu costumo dizer que as pessoas deveriam ter o prazer de conviver um dia com as minhas mães, porque é uma lição de vida, de amor, de humanidade sabe. – embora no momento não tenha rolado muito amor entre elas, pensei - Na minha casa existem regras como na casa de todo mundo, a gente faz tarefas de casa como muita gente, a gente fica de castigo, a gente tem lições quando erramos e eu sou filha de uma juíza gente, então... Sem pressão – todo mundo riu até a professora – Sobre homofobia eu não me lembro de ter passado por nada disso. Minhas mães já sofreram muitas vezes com isso, mas eu não me lembro de ter vivido um momento assim. A gente sempre esteve num meio acolhedor. Quando a gente não era acolhido, a gente se afastava então no colégio, onde morávamos e onde moramos agora, a gente nunca sofreu nenhum tipo de preconceito, muito pelo contrário, sempre fomos muito bem tratados, participamos de tudo com todo mundo. Minhas mães ficavam loucas com tanta festinha de aniversário – rimos. – Quanto a influencia do meu relacionamento em momento algum minhas mães serem lésbicas foi influência, porque ninguém influencia ninguém a ser lésbica, bi ou gay. A gente nasce assim, com o tempo a gente se descobre. Eu me descobri a dois anos e nunca contei para as minhas mães até dois meses atrás. A diferença é que ao contrário de muita gente, muitos adolescentes filhos de casais heterossexuais, eu fui abraçada, fui acolhida, e sabemos que não é assim em famílias chamadas de tradicionais né, compostas por pai e mãe. Minhas mães ficaram preocupadas sim, isso é natural de qualquer mãe independente de sexualidade, mas elas ficaram preocupadas no sentido de, "A Helena está pronta pra encarar um mundo que habita muito dentro do preconceito?". E sobre a minha família biológica, recentemente minha genitora me procurou e foi caótico, está rolando processo é complicado porque eu não tenho interesse em ter contato com ela e menos ainda meu irmão. A gente sofreu muito gente, muito. Eu graças a Deus não me lembro de nada, mas meu irmão se lembra e tem marcas disso. Fico feliz que ela tenha refeito a vida dela, esteja vivendo bem agora. Mas eu conheço minha história e eu estou bem. Não digo no quesito financeiro, mas eu estou segura e eu não me sinto confortável deixar esse ponto de segurança para entrar numa vida antiga que eu vivi e sofri nos meus três primeiros anos de vida. – foi um longo papo e até que não foi tão ruim assim. No final da aula esse mesmo garoto veio falar comigo. E todo mundo tinha uma certa rixa com ele, por ele ser marrento demais, mas eu e ele nunca brigamos ou nos desentendemos e ele nunca me desrespeitou. Ele me procurou no fim da aula porque ele acha que a irmã dele gosta de uma menina e não está legal com isso, está com medo dos pais e ele queria ajudar de alguma forma. Fiquei conversando com ele no banco de fora do colégio até a van chegar, e ele tinha muitas dúvidas sobre isso. A Duda deu uns conselhos pra ele também e ele nos agradeceu e logo foi embora, a Duda também e eu fui em seguida. Chegando em casa o caos instalado. Julia chorando, Hugo jogado no sofá, Laura chamando minha mãe e a mamãe acalmando o Samuel que estava chorando porque estava com febre.

Mãe Nat: Oi filha... Eu preciso de ajuda.

Eu: Só vou tirar o uniforme e desço – subi coloquei uma roupa de ficar em casa e fui ajudar minha mãe. A babá não tinha ido porque pegou dengue também então fiz a Julia dormir porque ela estava chorando de sono. Depois coloquei o Samuel na cama, após dar dipirona pra ele e um suco de maracujá. O silencio tinha voltado. Eu sentei pra almoçar com a minha mãe, todos os "dengosos" da casa estavam dormindo.

A GRANDE FAMÍLIA SMITH-PUGLIESEWhere stories live. Discover now