xxx. QUARTA FEIRA

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Eu usava uma regata branca e uma calça moletom preta enquanto a Lia usava um vestido longo amarelo bem claro com pequenas flores roxas, seu cabelo estava arrumado em um perfeito dread e ela estava cheirosa enquanto eu me sentia suja e com um coque alto mal feito.

Eu precisava fazer mercado para a minha casa, a Lia está se mudando para morar sozinha, consequentemente, ela também precisa comprar coisas para a casa dela, então fomos juntas. Nós viemos num Fiat 500 elétrico verde pastel, um carro que, pelo menos para mim, combina muito com a estética de vida dela.

— Acho que vou virar vegetariana – Comentei e a Lia franziu o cenho.

— Por que?

— Eu cozinho mal, quem cozinhava para mim era o Otávio, não consigo me acostumar mais com o gosto da minha comida, além de que, cozinhar me faz pensar nele.

— Então vocês terminaram de vez? – Confirmo com a cabeça – Achei que vocês iam acabar voltando.

— Nós ainda não nos vimos, mas acho melhor não voltar, meus pais são um porre.

— Eu entendo, os meus também são difíceis, não é à toa que to indo morar sozinha. Eles querem o melhor para a gente, mas eles são iguais a nós, todo mundo tá meio perdido, é complicado, de qualquer forma, o Otávio é um bom menino e te trata muito bem, eu imagino que ele não tenhas muitas memórias de mim, no dia que eu conheci ele, ele não me reconheceu, mas eu lembro dele pequeno, sempre foi um bom menino e, enfim, se você cozinha mal, acho que não é uma boa virar vegetariana.

— De onde vocês se conhecem?

— Pelo Rogério.

— Rogério? – Perguntei confusa e ela riu.

— Apollo.

— E de onde você conhece o Apollo?

— Da vida. Só isso que você precisa saber.

Concordei com a cabeça, eles definitivamente não queriam falar sobre isso, ele empurrou para Lia e ela deixou bem claro que não quer falar sobre isso.

— E por que, por eu não saber cozinhar, é uma má ideia virar vegetariana? – Questionei tentando cortar o clima escroto que estava entre nós por eu ter perguntado sobre o Apollo.

— Você gosta de salada?

— Das que eu faço, não, mas o Otávio fazia umas saladas bem legais – Me silenciei, entendendo o que ela falou – Você tem razão.

— Você devia ter pedido pra ele te ensinar a cozinhar.

— Ele tentou, eu que nunca consegui aprender, eu não sei nem seguir receita.

— Você devia morar comigo, meu apartamento tá quitado, meus pais me deram ele quando eu tinha quinze anos, você não pagaria aluguel e  eu vou ter uma pessoa para cozinhar lá.

— Você tá falando sério? – Perguntei um pouco surpresa pelo convite, mas eu estava considerando aceitar.

— Sim, você fica pouco em casa, eu saio pouco do quarto, a gente faz a mesma faculdade então você economiza com uber, metrô e ônibus. Além de que te considero uma pessoa fácil de lidar.

— Eu aceito, de verdade – Respondi rindo.

— A Raissa vai morrer de ciúme – Ela disse rindo e eu concordei com a cabeça – Você é tipo o xodó dela, a relação de vocês é muito bonita.

— É fácil amar a Raissa, ela é tão gentil e protetora, eu me sinto em casa quando to com ela.

— Ela é uma pessoa muito especial mesmo, mudando de assunto, você falou sério sobre se mudar para minha casa? Porque, se for mesmo, nós devíamos unir nossas listas.

— Eu tava mesmo, eu também não tenho muitas coisas na minha casa que são realmente minhas, eu consigo me mudar para sua semana que vem.

— Eu te ajudo a levar as coisas, Xuxu.

— O que você tem que comprar? – A minha lista era basicamente comida, mas, se eu me mudar, não adiantava mais comprar os meus itens caso ela tivesse eles na lista.

— Produtos de limpeza, proteínas, vegetais, vinho, licor, whiskey, muito whiskey, temperos variados, frutas, por aí vai.

— Por que whiskey?

— Minha bebida favorita.

— Eu nunca tomei, sabia?

— Pois vai tomar a primeira vez quando a gente se mudar – Eu ri e concordei com a cabeça.

Eu lembrei do Otávio, não teve motivo aparente, eu só pensei nele, lembrei de como gostava de estar perto dele e me senti destruída, eu odiava quando eu estava bem e, do nada, sem motivo, lembrava dele, mas as coisas eram assim, né? As pessoas lembravam das outras.

O pior é saber que tudo isso era minha culpa, eu sabia que, se eu não tivesse terminado com ele, eu não estaria me sentindo assim, nós estávamos bem, por que eu sempre faço merda e estrago as coisas boas? E, pior que isso, eu não queria vê-lo, eu não conseguiria lidar com a ideia de estar perto dele, a sensação seria estranha porque eu gosto dele e, bem, vê-lo novamente, sabendo que não poderia beijá-lo e abraçá-lo, ou eu poderia.

    Quem deu o ponto final, fui eu, quem terminou, fui eu, quem disse que ele estava livre, fui eu. Eu terminei tudo e, mesmo assim, eu queria voltar. Ele ainda me queria?

— Você tá calada – Disse Lia enquanto pegava o amaciante.

— É, to pensativa.

— No que?

— Otávio.

— Você devia pedir para voltar – Neguei com a cabeça – Você não quer?

— Quero.

— E por que você só não resolve a situação?

— Tem outra pessoa envolvida. Além dos meus pais.

— Quem?

— Tem um cara, ele é mais velho, amigo da minha irmã, eu fiquei com ele, ele confessou que gostava de mim e etcetera, ele chega aqui amanhã e disse que quer me ver trabalhando na sexta.

— Ele é bonito?

— Não, mas eu também achava o Otávio feio no começo.

— Você fugiu do Otávio até não aguentar mais, por que você tá facilitando para esse cara?

— Eu não to facilitando, eu só... Sei lá.

— Quer usar alguém para esquecer o Otávio? Alguém que você sabe que não vai gostar mais do que a pessoa gosta de você porque é uma posição segura de estar? Alguém que tem suas qualidades, mas você preferiria estar com o Otávio do que estar com aquela pessoa, todavia escolheu esse cara porque você sabe que é mais fácil?

— Lia, você faz letras, não psicologia – Ela riu e negou com a cabeça.

— Tô tentando ajudar, mas, acho que seria legal pelo plot sair com alguém que não é o Otávio para um lugar em que o Otávio pode ver.

— Você é maligna! – Respondi rindo e ela riu mais uma vez.

— Ia ser um bom jogo.

jorge maravilhaWhere stories live. Discover now