vi. SEXTA FEIRA

564 59 18
                                    

Eu fiz o mesmo esquema de ontem, deixei uma mochila com a Raissa na faculdade e me troquei para a batalha dentro do carro dela. Eu usava uma blusa preta de gola canelada, uma minissaia branca e uma bota de couro que chegava da minha patela, além disso, eu usava uma bolsa tira colo também preta, brincos pratas que eram apenas uma pequena bolinha simples, um colar e uma pulseira da Vivienne Westwood, também pratas.

A Raissa disse que eu deveria tirar a pulseira porque eu estava muito arrumada e eu obedeci ela. Como a batalha da norte é perto do meu local de estágio então, não demorou muito para que nós chegássemos. A primeira pessoa que meus olhos viram foi ele, como podia? Já era a segunda vez que isso acontecia. Ele sorriu para mim, parou de falar com quem estava falando e veio na minha direção, eu senti meu coração acelerar à medida que o corpo dele estava mais próximo do meu.

— Olha quem resolveu me ver – Ele disse com um tom de humor.

— Pois é, pelo menos, dessa vez, você ainda não derrubou cerveja em mim.

— Eu to dirigindo hoje.

— Ué, liberaram cnh para quem tem quinze anos?

— Vai se foder.

— Você vai batalhar hoje? – Ele negou com a cabeça.

— Eu tava na expectativa de você aceitar sair comigo.

Eu olhei para a Raissa, que estava ao meu lado, sua única reação para mim foi um sinal com os olhos indicando que eu deveria aceitar, então voltei meu olhar para o Tavin ele usava um moletom vermelho, uma corrente dourada, uma calça branca e um tênis da nike dentro da paleta de cores que ele estava usando.

— Eu saio.

— Sério?

— Aproveita antes que eu desista.

Ele riu e colocou seus braços ao redor dos meus ombros, eu sorri para a Raissa e ela concordou com a cabeça antes de que eu e ele fôssemos em direção ao carro.

Ele tinha um elantra preto, era bem bonito e baixo, ele me guiou até o banco do passageiro para que eu pudesse entrar e depois foi para o seu lugar, o carro estava cheiroso e arrumado, me surpreendi com o seu estado considerando que eu realmente não imaginava um carro de qualquer homem de dezoito ano tão bem cuidado assim.

— Onde você quer ir? – Ele perguntou.

— Honestamente?

— Sim.

— Acho que para minha casa.

— E onde você mora?

— Vai pra USP e de lá eu te guio.

Ele me entregou o celular dele desbloqueado com o spotify aberto, então associei que eu deveria colocar alguma música, mas o que colocar quando eu não sabia nada sobre trap e nem quais artistas ele gostava.

— Põe o que você gosta de ouvir.

— Não acho que você gostaria.

— Isso seria bom, eu finalmente ia achar um defeito em você.

Eu sabia que homens não eram confiáveis e falavam muita coisa da boca para fora, mas eu estou achando cada vez mais difícil não me sentir fixada nele.

— Eu posso colocar qualquer coisa? – Perguntei.

— Qualquer coisa que você goste.

— Triste ou feliz?

— Qualquer coisa que você goste.

— Vou colocar uma feliz e triste ao mesmo tempo então.

— Fique à vontade.

Pesquisei Phoebe Bridgers no seu spotify e coloquei "Kyoto" para tocar, senti meus batimentos acelerados e um certo nervosismo, mas o Tavin apenas riu e continuou dirigindo.

— Se essa é feliz, to com medo de qual é a triste.

— Eu te odeio.

— Me odeia, mas tá me levando pra sua casa.

— Sim, prefiro evitar ser vista em público com você, seria ruim para a minha reputação.

— Até porque andar com uma paty de sp faria muito bem para minha.

— Eu sou uma paty nortista.

— Duvido muito que no calor do caralho do norte, ias estar vestida de manga comprida e bota.

— Você nunca nem foi ao norte.

— Mas você vai me levar lá quando for me apresentar para os seus pais.

— Eu espero que você nunca conheça eles, de verdade – Murmurei rindo e ele aparentou ficar confuso.

— A ideia de ter algo sério comigo te assusta tanto assim?

— A ideia de ter algo sério com qualquer pessoa agora me assusta, mas nem é tanto por isso.

— E por que é?

— Meus pais são muito complexados, já é um saco ter que lidar com pais normais, imagina você ter que lidar com os meus.

— Qual problema deles?

— Muitos, mas acontece, pais são meio que crianças em corpos grandes, sabe?

— Entendo, faz sentido.

— Pois é, eles estão tão assustados quanto nós estamos, eles também não sabem ao certo o que fazer ou sentir. Eu tento não exigir muito deles desde que eu notei isso.

— O que você quer dizer com isso?

— Tipo, minha mãe vem desabafar comigo sobre o relacionamento dela com o meu pai; eu não devia ser a pessoa quem ela procura para falar sobre isso, eu sou nova e eles são meus pais, nossa relação não deveria ser tão vinculada assim, mas eu sei que talvez ela não pense dessa forma, ela me vê como uma amiga além de como uma filha então eu opto por deixá-la desabafar mesmo sabendo que isso pode me fazer mal, mas eu deixo porque eu sei que ela se sente perdida e sozinha, ela precisa de mim. Todavia, ao contrário dela, eu opto por não envolvê-la nas minhas relações porque eu sei que ela já tem o peso das relações dela, ela não precisa do peso de nenhuma relação que eu já tive ou venha a  ter.

— Você não acha que você é a mãe da sua mãe quando você faz isso?

— Talvez, mas alguém tem que assumir esse papel, né.

— Mas talvez essa pessoa não tenha que ser você.

— Por que você acha que eu vim pra cá para SP?

— Sei lá, mercado de trabalho.

— Um fator óbvio, mas também porque, como eu to longe, eu não consigo me envolver cem por cento com o problema que eles criam na semana.

— A gente ta chegando na usp – Ele avisou.

— É só você seguir reto por umas duas ruas e a gente chega. Eu moro num studio de um prédio universitário.

— Ok.

jorge maravilhaWhere stories live. Discover now