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Camp

- Alice Escobar -

Antes da revelação das duplas, foi combinado que os jogadores e jogadoras levantariam uma de suas mãos ao ouvir seus respectivos nomes. Foi a maneira mais simples de indicar quem era quem.

Assim que o nome Pablo Gavira foi anunciado, vi o garoto do vestiário levantar seu braço direito. Foi nesse momento que comecei a implorar para o Universo parar de conspirar contra mim e não nos deixar como uma dupla. Meu dia já estava sendo relativamente ruim, não precisava ficar pior. Aguentar o convencido do vestiário, vulgo o cara que disse esperar que as meninas usassem roupas curtas, não seria uma missão fácil. Sabia que teria que suportá-lo durante os treinos, mas ser sua dupla seria um pesadelo se tornando realidade.

-... Gavira e Bruna Marques.

Um nome. Um nome foi o suficiente para que o meu corpo fosse preenchido por uma onda de alívio. Quem quer que fosse a minha dupla, com toda certeza do mundo, não seria tão ruim quanto Gavira.

Meu dia estava começando a melhorar.

E, para a minha sorte, minha dupla não era nenhum pouco ruim. Para falar a verdade, minha dupla era um conhecido de longa data. Um jogador que havia saído do Barcelona em 2.017, mas agora estava de volta. Um brasileiro, assim como eu.

- E, por fim, Neymar Jr e Alice Escobar. - Xavi anunciou, encerrando o anúncio das duplas.

Neymar não se deu ao trabalho de levantar uma de suas mãos, assim como eu, ele apenas sorriu para a mim, que retribui o gesto.

- Apenas para deixar claro. - Anunciou Adrian. - Faremos tipos de campeonatos, sendo eles: meninas contra meninos no vôlei, meninas contra meninos no futebol, times mistos no vôlei e mistos no futebol. As posições serão de acordo com as duplas de vocês, por exemplo, Neymar é atacante e Alice também, então ambos serão atacantes.

- As duplas foram pensadas de acordo com as posições, então imaginamos que não será assim tão difícil se acostumarem com suas respectivas posições. - Xavi acrescentou. - Podem iniciar os treinos com suas respectivas duplas.

Ao recebermos tal ordem, todas as duplas se juntaram e começaram a conversar e se conhecer minimamente. Com Neymar e eu não foi tão diferente. Dissemelhantemente dos outros pares, nós optamos por um abraço ao invés de um breve aceno ou aperto de mão. Aquele abraço transmitiu toda a saudade que um sentia do outro, afinal, fazia bastante tempo desde que nós havíamos nos visto pessoalmente pela última vez.

- Senti saudades, tampinha. - Ele sussurrou durante o abraço.

Não fui capaz de evitar uma pequena risada.

- Eu também senti saudades, toquinho.

Por mais que quiséssemos continuar o abraço, sabíamos que tínhamos trabalho a fazer, então nos separamos.

- Eu nem me lembro quando foi a última vez que nós nos vimos. - Ney disse enquanto me acompanhava até o carrinho de bolas de vôlei.

- Eu me lembro de te ver jogando na copa. - Comentei ao mesmo tempo em que pegava uma bola qualquer do cesto.

- Você assistiu a copa para me ver, que amor. - Provocou ao acompanhar-me até um canto do gramado.

- Assisti a copa pelo meu espírito patriota, não precisa se iludir. - Soltei uma breve risada ao terminar minha fala.

- Assim você me ofende. - Levou sua mão direita até o coração, fazendo uma falsa expressão de ofensa.

Ao invés de responder, apenas joguei a bola na direção do jogador.

- Vamos começar treinando passe e depois saque. - Avisei, ignorando o comentário do mais velho.

- Você sabe que eu sou muito bom no vôlei? - Comentou assim que viu a bola indo, outra vez, ao seu encontro.

- É, fiquei sabendo que teve uma ótima professora.

- Tá ligada que o aprendiz sempre supera o mestre, né? - Provocou.

- Só o verdadeiro discípulo é aquele que supera o mestre. - Avisei e pisquei para ele.

- Espero que Davi Lucca seja um verdadeiro discípulo, assim com eu fui. - Sorriu para mim, como se tivesse certeza de que seu mérito por saber vôlei não era meu, a garota que o ensinou. Mas era mentira e ele sabia.

- Se ele tiver a mesma professora que você teve, quem sabe? - Entrei na onda.

Jogamos em silêncio por algum tempo. Não era um completo silêncio, já que as outras duplas conversaram ao fundo, mas nós os ignoramos.

- Chegou a conhecer algum dos meus colegas de campo? - Indagou Neymar, mesmo já sabendo a resposta. Eu sabia que aquela história já havia chegado aos seus ouvidos.

- Só o convencido do camisa 30. - Respondi e terminei de realizar seu saque.

- Por que achou o cara convencido? - Perguntou assim que segurou a bola e se preparou para seu próprio saque.

- Todos os jogadores de futebol são. - Fui sincera. - Inclusive você.

- Haha, por que acha isso?

- "Não existe uma pessoa no mundo que não me conheça", "Não existe uma torcedora do Barcelona que não é minha fã", "Até garotas que não torcem para o Barcelona são minhas fãs." - Respondi tentando imitar a voz de Neymar e de Pablo Gavira.

- Ei! Eu não falo assim! - Levou sua mão direita ao peito e fez uma falsa cara de ofensa.

Gargalhei com a ação de seu amigo. Como eu senti falta desse tipo de interação.

Preferi não retrucar o camisa 10 e continuei o treino.

Ambos optamos por iniciar um jogo simples, sem rede, mas ainda um jogo. A intenção era apenas não deixar a bola ficar o chão. Quem visse poderia dizer que éramos dois adultos com alma de criança, o que não seria uma completa mentira.

Nós jogamos muitas partidas e permanecemos em silêncio durante aquele tempo. Não era um silêncio desconfortável, muito pelo contrário, era algo agradável. O silêncio só era quebrado pelas risadas que vinham, na maior parte das vezes, de mim, que ria das falhas tentativas de Neymar vencer e dos tombos que o mesmo levava.

Admito ter ficado impressionada com a persistência do menino Ney. Por mais que ele perdesse todas as partidas, ele não desistia de tentar vencer. Era realmente uma atitude admirável. Mas, como nada dura para sempre, houve um momento em que o mais velho pediu um intervalo de alguns minutos.

- Cansado de ser humilhado? - Perguntei assim que recebi a bola de volta.

- Vai nessa. - Ney disse enquanto passou ao meu lado. - Apenas um pouco de água e eu estarei pronto para te vencer.

Revirei meus olhos escuros antes de proferir as seguintes palavras:

- Seu humor chega a ser invejável.

Nós dois rimos e fomos até nossas respectivas garrafas de água.

- Vai me dizer o porquê de ter saído do PSG? - Aquela era uma dúvida que eu tinha desde que havia descoberto que Neymar estava voltando para o Barcelona.

Ao invés de receber uma resposta audível, Neymar apenas ofereceu um olhar que entregava tudo.

Modéstia a parte, nossa conexão era invejável. São poucas as pessoas que conseguem conversar apenas por olhares e nós dois éramos umas dessas pessoas.

- Não acredito! A mídia estava certa? Não era fake news? - Eram perguntas retóricas, mas o homem balança a cabeça positivamente para cada pergunta.

- Pode acreditar. Kylian Mbappé conseguiu me tirar do PSG. - Disse enquanto fechava a sua garrafa. - Podemos voltar ao treino?

- Não antes de você me contar essa história com detalhes.

Como ele era capaz de cogitar soltar essa bomba e fugir assim?

Em CampoWhere stories live. Discover now