50. AFETOS ESQUECIDOS.

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John sorriu receptivamente para a bela atriz, que lhe retribuiu com um afago nas costas, após sentar ao seu lado.

– Conheço você o suficiente para perceber que está com algum problema – observou ela, parecendo disposta a ouví-lo.

Talvez não fosse prudente espalhar para mais uma pessoa pública aquele problema sobre a turnê, mas, ao olhar nos calorosos olhos castanhos da moça, tão familiares agora, ele não conseguiu evitar o longo desabafo.

Após alguns copos esvaziados por ambas as partes e muitas lamentações, Tatiana lembrou:

– Finn sempre foi muito difícil, mesmo.

– Então você me entende, não é? – murmurou John, taciturno.

Ela suspirou.

– John, você sempre procura as saídas mais inusitadas e complicadas para os seus problemas – começou ela. – Está entediado com Hollywood e prefere fugir para uma cidade remota para viver uma fantasia de normalidade ao invés de trabalhar com as coisas que têm em mãos. Entendo que queira fazer faculdade, entendo que seu contrato é abusivo e GG foi um babaca por marcar esses shows sem consultar vocês. Mas você está sofrendo muito mais por causa das expectativas que criou.

A ex estava certa, afinal. John sabia disso, bem lá no fundo. Mas ele não era o tipo de cara que desistia fácil.

– Nem tudo na vida é um desafio que tem que ser cumprido, John – concluiu ela, como se lesse seus pensamentos.

Talvez só estivesse lendo seu rosto.

– Tati... Obrigado por isso – agradeceu ele, encarando a garota com ternura. Estava um pouco difícil de lembrar o motivo para os dois terem terminado o namoro.

Quando deu por si, já estava com a garota nos braços.

Talvez fosse por isso que Cassandra evitava qualquer encontro casual entre os dois: sempre terminava em uma volta ao relacionamento. Tati era tão cheirosa quanto antes, e seus lábios eram tão macios quanto foram em seu último beijo, há tantos meses atrás.

Mas então lembrou-se de Hazel. Hazel!

– Espere... – pediu, afastando-se do beijo da garota. – Eu... tenho uma namorada em Bewitt. Droga, Tati! Isso foi muito errado... – resmungou, olhando em volta e procurando testemunhas. Não viu ninguém os observando, mas estava um pouco tonto.

Tati ajeitou-se.

– Ah... A universitária. Então é verdade? Você ficou namorando firme a garota das fotos? – ela perguntou, parecendo um pouco desdenhosa.

John assentiu.

– Por que não poderia? – perguntou.

A garota deu de ombros.

– Você está conversando comigo há horas e nem sequer mencionou essa garota – respondeu ela.

Aquilo era verdade. Mas o que significava?

Não! Hazel era... Ela a amava! Era a garota mais doce e mais incrível que ele já conheceu. Era sempre tão bom quando estavam juntos e apenas conversavam sobre bobagens. Ela era engraçada, mesmo que às vezes um pouco teimosa, e o admirava pelos motivos mais genuínos do mundo.

Flashes dos bons momentos com a namorada passaram por sua cabeça: quando ela fez sua linda análise de Wanderer, quando o surpreendeu indo ao seu show no campus, o quanto era divertida e aventureira, todos aqueles dias em que não conseguia tirá-la da cabeça e por isso escreveu aquela música, o dia em que cantou-lhe a música e ela o beijou...

E no entanto agora ele esteve com Tatiana por umas duas horas como se Hazel fosse uma simples figurante em seus últimos meses.

A atriz o encarava enquanto ele olhava assustado para as próprias mãos e pensava. Então a voz de Finn sobressaltou os dois.

– John, encontrei você! – disparou o baixista. – Ah... Tati, como vai?

A garota o cumprimentou educadamente, então Finn voltou a se dirigir a John.

– Precisa vir comigo, é urgente – chamou ele, levando o amigo consigo pelo braço e parecendo perceber, junto com o próprio John, que ele estava consideravelmente tonto.

– O que foi, Finn? – John quis saber, quando os dois já estavam dentro de uma sala da mansão que ficava mais longe de onde acontecia a festa, e os dois estavam sozinhos.

– Eu só estou fazendo aquilo que você mesmo me pediu! – respondeu ele. – Impedindo você de voltar com Tatiana. Lembrando você do que ela fez. É fácil esquecer quando ela está tão bonita e compreensiva não é mesmo? Ela traiu você com o próprio empresário... por anos!

Ah, sim... É, isso era verdade.

John fungou.

– Foi bem fácil esquecer dessa vez... – comentou.

Finn soltou um muxoxo.

– Você literalmente está ansioso por um prêmio ao qual concorre com um álbum que fala 80% do tempo sobre isso – lembrou, um pouco divertido.

O cantor suspirou e sentou-se em uma poltrona ali por perto. Estavam em uma espécie de escritório.

Enterrou as mãos no rosto. Pensava nas besteiras que fez, pensou e disse. Então sentiu a mão do baixista em seu ombro.

– Por que está fazendo isso por mim, Finn? – perguntou, olhando para cima para encará-lo.

Ele deu de ombros.

– Porque é pra isso que amigos servem – respondeu.

Por um instante, John conseguiu enxergar no rosto magro do rapaz aquele Finn adolescente e sonhador que conheceu em um show do Aerosmith em Nova York. Não via a arrogância e a hostilidade que o dinheiro e a fama haviam lhe atribuído às feições.

Então lembrou-se da discussão que tiveram mais cedo.

– Finn... Me desculpe por tudo. Desculpe por não querer fazer esses shows... – balbuciou, lutando contra um nó em sua garganta.

Finn agachou-se na frente da poltrona, nivelando os olhos com John, falando depois de um longo suspiro.

– Escute, John – começou. – Quando tudo isso acabar, a sua carreira solo já está garantida. Gravadoras irão brigar por você. E eu, se tiver sorte, serei lembrado em alguns anos em artigos de internet sobre "como andam os astros esquecidos dos anos 10", ou em esporádicas reuniões da banda que os fãs nostálgicos farão acontecer.

Finn parecia magoado ao proferir cada palavra. Seu orgulho estava ferido, mas ele estava sendo tão honesto e vulnerável agora que John não pôde evitar o impulso de abraçá-lo.

O amigo riu, mas o abraçou de volta.

– Você vira uma manteiga derretida quando bebe, estrelinha! – brincou Finn.

– Finn... A Garlical não vai acabar. Eu não sou nada sem a banda! Vocês são tudo para mim... – tentou explicar, mas o amigo apenas fez algumas caretas de incredulidade.

– Conversamos sobre isso amanhã, agora precisamos tirar você daqui sigilosamente – ponderou Finn, pegando o celular e discando para Cassandra.

A pobre agente nem imaginava que teria ainda muito mais trabalho por causa daquela noite.

Além das AveleirasWhere stories live. Discover now