Reunião na casa de Sonia era sempre muito bom.
Juntos estavam Marcelo e Margarida, Júlio e Rosalva, Wanderley e Giuliano, Sonia e o novo namorado, Carmem e o marido e Berta.
- Quer dizer então que o filho não é de vocês? - perguntou brincando Júlio.
- Não, querido, ela não nos deu esse prazer - respondeu Giuliano.
- Você jura que queria um filho nessa altura do campeonato, né? - perguntou Marcelo rindo.
- Claro que não - respondeu Giuliano, - mas a coisa estava tão dentro do contesto que não tinha mais jeito de se pensar em coisa diferente.
- Eu acho que vocês foram muito bobos em aceitar a situação - interveio Sonia. - Imagina arrumar um filho.
- Sabe, Sonia - Wanderley olhou pra todo mundo, - eu acho que a gente estava tão perdida na vida que uma notícia destas só faz mexer com seus maiores princípios. Vocês não imaginam - enfatizou Wanderley levantando-se e andando na sala, - como é difícil a vida de um casal gay. Estamos bem, Giu e eu? Estamos muito bem. Não precisa ninguém pensar diferente. Somos felizes por estarmos juntos, mas, há a grande falta que temos. Vocês não podem perceber o mal que tudo isso nos fez. Primeiro, fomos ambos casados, eu tive a infelicidade de ser casado com uma louca que abortou a única oportunidade que eu tive de ser pai. Não sei o que me passou pela mente quando Ligia abortou nem mesmo quando Berta nos disse que o filho era nosso. Brincadeira de mal gosto a parte, gostamos muito de Berta e ela passa a nos dever um filho daqui pra frente. Mas eu creio que vocês não conseguem entender a extensão da coisa - Wanderley respirou fundo. - Não há nada que possa suprir essa falta que temos. Não digo isso por mim ou Giu, essa falta que temos todos nós gays. É uma coisa muito louca, mas estamos sempre pensando em como vai ser a nossa velhice. O que fazer com o nosso eu jogado na latrina depois de velhos... Sabe, Marcelo, vocês já tem seu fruto, Julio e Rosalva, daqui a pouco... Nós dois, Giu e eu, temos somente a nós dois. Isso por enquanto, enquanto dura o tesão, dura o amor, dura essa coisa louca que a gente consegue manter que parece que estamos em lua-de-mel até hoje. Mas vai ser pra sempre? Tomara Deus. E se não for? Estaremos na mais completa solidão, pois nem herdeiros teremos... Há quem ache a vida de um gay uma coisa "plumosa" e "paetetosa". Não acreditem nisso! Jamais! E não me venham dizer: - Por que você escolheu, então, viver assim? E lhes responderei: - Não escolhemos viver assim! Somos assim! Não há como mudar a natureza. Não há como mudar a nossa natureza. Agora nos roubar o filho que nunca tivemos foi sacanagem grossa – terminou ele brincando com Berta e amenizando o discurso que fizera.
- Mas Wanderley - lembrou Berta, - foi uma brincadeira...
- Que como eu disse, de mal gosto e que nos deixou muito mal.
- Você sabe, Berta - interveio Giuliano, - que a gente quase se separou por causa desse bebê?
- Não era minha intenção - disse ela séria.
- Acredito - continuou Wanderley. - Acredito mesmo que não era sua intenção. Só que aconteceu. Nossa vida virou um inferno e depois que estruturamos tudo você vem e nos rouba o filho que nunca foi nosso.
- Eu acho que a gente devia falar de outra coisa - interferiu Júlio. – Primeiro acho que filho, vocês podem adotar um monte. Têm dinheiro pra isso e hoje a lei permite. Vocês são casados oficialmente. Arrumem uns filhos – ele riu. - Por que não falamos do casamento de Carmem?
- Eu acho ótimo - concordou Giuliano. - Acho que pelo menos alguém está feliz nessa casa.
- Mas eu também estou - lembrou Sonia. - Essa ideia que eu tive de trocar o Edelberto pelo Marquinho foi fantástica.
- Eu acho que na realidade, todos nós estamos bem - observou Berta. - Olha, não adianta vocês virem me dizer que estavam loucos pra ter um filho e etc e tal, que isso não convence. Eu sei que eu agi errado. Desculpem-me! Eu não queria que a coisa atingisse esse estágio. Por favor, acreditem. Eu tive muita raiva de vocês naquela noite, mas também fui culpada de deixar que bebessem tanto...
- Isso a gente é grande suficiente pra saber... - tentou dizer Giuliano.
- Não, não é por aí! - interferiu ela. - Vocês estavam realizando um sonho de muito tempo. Estar em Roma pela primeira vez é uma coisa que ninguém esquece nunca. Empolgação a parte, eu acabei com a viagem de vocês na hora em que acordaram e me viram dormindo na mesma cama. Acredito que as suas cabeças devem ter andado a mil. E eu sozinha naquela cidade, grávida de poucos dias sem saber o que fazer... Pra mim foi fácil pensar e resolver. Estaria tudo resolvido se o pai de meu filho não me tivesse procurado poucos dias antes de eu partir pro Brasil...
- Quer dizer que estaríamos assumindo o filho de outro cara sem sermos realmente pais? - perguntou Wanderley.
- Não, meu querido - explicou ela. - Eu amei vocês dois na juventude e continuo amando... Eu não faria nada desse tipo com vocês. Eu agi mal...
- Não quero me intrometer não – intrometeu-se Marcelo, - mas eu te mataria se fizesse isso comigo.
Todos riram e Marcelo continuou:
- Eu acredito que Giu e Wanderley querem tanto um filho e como sabem que não podem ter, devem adotar mesmo. Meninos, eu acho, no entanto - olhou para os amigos, - que vocês devem dar graças a Deus que o rebento não é de vocês. Criança é uma coisa muito chata!
- Querido - ralhou Margarida, - que isso?
- Há quantos dias não durmo, querida? - perguntou ele e todos riram. - Acha legal acordar todo dia com vontade de dormir?
- Meus amigos - começou Giuliano, - eu acho que nós estamos tentando justificar uma coisa que não tem mais como ser justificada. Gostamo-nos todos e acredito que continuaremos a gostar muito de Berta, apesar desse susto desagradável que ela nos deu, mas fazer o que? Melhor assim! Esclareceu-nos tudo e agora continuamos tios...
- Claro, continuamos tios - concordou Wanderley imponente. - Se você deixar, Berta, somos tios de seu filho.
- Mas que dúvida, Wanderley – ela sorriu. - Eu quero que a gente continue como era antes.
- Eu não sei - brincou Wanderley.
- Claro que sabe, Wanderley - corrigiu Giuliano. - Amamos Berta e a criança também, somos tios e pronto.
- Então vocês me perdoam? - perguntou ela.
- Claro - responderam os dois.
- Mas então temos que comemorar – levantou-se Julio. - Onde está a bebida, Sonia?
- Não sei... Quer dizer... Marquinho, a sua função aqui é servir bebidas, meu bem - ordenou ela brava ao namorado o que faz com que todos achem graça.
- Eu aprendi a fazer uma batatinha ótima em Cabo Frio - lembrou Carmem interrompendo a amiga, - vocês vão amar. Sonia eu posso ir com você pra cozinha?
- Claro, querida - respondeu a anfitriã.
- Eu vou também – se ofereceu Berta. - Quero aprender tudo o que houver de novidade no país pra levar pra Itália.
Enfim todas as mulheres saem em direção à cozinha, Marquinho fica com cara de bobo e Marcelo perguntou a Wanderley:
- Você realmente queria esse filho?
- Não, Marcelo. Eu não queria e nem mesmo Giuliano. Você sabe que a gente vive muito bem casado. Quando pintou a ideia de ter um filho, nós dois piramos. Creio que eu mais que Giu. Muito mais com certeza. Ligia abortou um filho meu. Deveria estar com...
- Não pensa nisso agora, Wanderley - interrompeu Marcelo. - O que passou não merece lembrança a não ser coisa boa.
- Você tem razão, Marcelo – ele sorriu. - Vamos saber por que essa bebida demora tanto?
Saíram da sala em direção à cozinha falando alto e pedindo o que comer e beber...
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O FILHO DE BERTA
HumorGiuliano e Wanderley são casados. Depois de vários desacertos nas suas vidas, inclusive casamentos heterossexuais, os dois, com os corações partidos, se encontraram em uma manhã, enquanto corriam na praça do Bairro Bom Pastor em Juiz de Fora. Amor a...