Capítulo XXII - Wanderley e Berta conversam

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No primeiro dia, depois do almoço, ficaram em casa conversando de coisas passadas e descansando da viagem. Giuliano dormiu um pouco e Berta e Wanderley conversaram na sala ouvindo músicas modernas italianas.

- Dificilmente tínhamos acesso a músicas modernas italianas no Brasil. Agora, por exemplo, há a febre de Laura Pausini, Eros Ramazzotti e brasileiros como Zizi Possi e Renato Russo cantando italiano – explicou ele.

- Mas continuam ouvindo Pepino di Capri e Rita Pavoni? – perguntou ela.

- Pois é, menina – ele riu. - Mas eu gosto muito.

- Eu também - concordou ela. - Mas me fale de você. O que tem feito?

- Trabalhado muito. Minha empresa agora está grande, a gente tem feito muita coisa. Claro que com esse tempo todo que já existe tinha que crescer – ele falava com orgulho da empresa.

- Que bom, Wanderley. E o povo todo? Nossos amigos?

- Estivemos outro dia reunidos na casa da Sonia – lembrou ele.

- Ela continua reunindo os amigos? Que legal! Isso me faz uma falta aqui enorme – ele sentia saudade. - Tenho muitos amigos já em Roma, mas não se tem tempo de parar e conversar. Raramente saímos juntos.

- Isso faz falta mesmo. Estiveram lá - continuou Wanderley, - Julio e a noiva, Marcelo e a esposa, Giuliano e eu.

- Julio namora a Rosalva. Casam-se quando? – perguntou ela.

- Segundo ela, ele está enrolando e o casamento não sai – disse Wanderley rindo.

- Que barato. Marcelo se casou com Margarida, não foi. Estão bem?

- Muito bem, pensando em ter neném.

- Olha, meu Deus, há quanto tempo eu não vejo esse povo todo? – via-se nos olhos de Berta lembranças boas do passado.

- Há quanto tempo você não vai ao Brasil?

- Três anos - respondeu Berta. - Morro de saudade, mas não tenho tempo de parar pra pensar no assunto.

- Bastante tempo...

- E você? Ligia está bem?

- Ligia vai ficar bem algum dia, Berta? - perguntou Wanderley. - Antes da gente vir ela foi internada em um hospital pra doenças mentais. Talvez quem sabe tenha alguma recuperação?

- Coitada. Mas ela continua perturbando você como fazia?

- Eu não aguento mais – desabafou ele. - Tem horas que tenho vontade de matá-la. Mas isso só complicaria mais a minha vida. Como pode acontecer uma coisa dessas, Berta? A gente era tão feliz enquanto namorava...

- Por isso que eu acho que casamento não dá – definiu ela.

- Mas dá, querida. Há casais que são perfeitos.

- Sim. Mas eu não entendo disso nada – justificou-se ela. - E Giuliano?

- Está ótimo. A ex- mulher vai se casar de novo.

- É mesmo? E ele quando soube?

- Ligou pra ela e disse que está muito contente. Eles se dão muito bem. Ela agora está morando em Cabo Frio.

- Cabo Frio? - perguntou Berta mais pra se chamar a atenção. - E aquilo lá continua lindo?

- Eu acho que sim. Depois que estamos juntos não voltei a Cabo Frio. Giuliano não gosta. Vamos sempre que dá pra Guarapari, ou outra praia do Espírito Santo.

- Eu amo Cabo Frio – suspirou Berta lembrando das praias e do calor do Brasil. - Aquele sol que você não sente por causa do vento e se ferra de tanto se queimar, mas a areia é extremamente branca, tudo é ótimo.

- Praia aqui? – perguntou ele.

- Praia aqui, querido? – zombou ela. – Quando temos tempo, no verão e, olhe lá, uma ou duas vezes por ano.

- Você está sempre trabalhando? - perguntou Wanderley.

- Direto. Tirei esses dois dias do fim de semana porque vocês iam chegar, mas segunda eu estou na luta de novo.

- Eu acho que a gente vai sentir falta do nosso pique - confabulou Wanderley. - Também não temos muito tempo pra nada, mas a vida está ótima.

- Wanderley, nossos amigos, quero saber, continuam amigos de vocês?

- Como assim? Porque a gente está junto? – perguntou ele. - Sim. Eu achava que seria muito difícil isso acontecer, mas sempre saímos em casais, claro, Giuliano e eu. Não tivemos problemas não.

- Que bom! Preocupa-me muito a vida de vocês – ela sorriu e pegou na mão dele. – Eu acho que vocês já passaram por situações desagradáveis em excesso e perder os amigos seria um pé no saco.

- Mas não aconteceu isso não. A gente passou a morar juntos e a convidar as pessoas pra vir visitar-nos – ele se lembrou. Foram chegando devagar e com o tempo estava tudo na mais perfeita ordem.

- Aqui, na Europa, é muito comum um casal de homens ou de mulheres, inclusive com adoção de filhos, mas no Brasil o preconceito ainda é grande.

- Muito grande – entristeceu-se ele ao pensar em filhos. - Não há um homossexual que consiga chegar a um bom posto se não for com muita luta e muito esforço. Lá a coisa é grave.

- Mas isso não importa – ela quis mudar de assunto. – Vocês estão bem e é o que interessa.

- Claro. E esse cara dorme demais, gente – lembrou-se ele de Giuliano. - Há duas horas está dormindo...

- Deixa pra lá, ou você já está com saudade?

- Não é isso - respondeu rindo Wanderley. – Na verdade, é bom que ele descanse.

- Claro, meu querido, a noite hoje vai ser legal, hem?

- Oba – interessou-se Wanderley. - Vamos já pra gandaia no primeiro dia?

- Você acha que vai ficar em casa? Casa é tudo igual. Vocês vieram conhecer Roma e tem que ser de dia e de noite.

Rindo os amigos continuaram conversando. Berta ao que tudo indicava estava contente de receber os amigos, mas não deixou de ter uma pontinha de vontade de estar com Wanderley e relembrar os velhos tempos. Agora era impossível. Ele estava casado e bem casado, e com um homem, que também era seu amigo. No mínimo, ele já não teria nem vontade de transar com ela. Se o fizesse também, mataria o amigo de ciúmes. Não, ela tinha de se controlar e ficar contente de ver, só ver e ficar perto. Daria um jeito, pensou ela.

O FILHO DE BERTAحيث تعيش القصص. اكتشف الآن