Uma semana mais tarde, morando em um hotel, já que Wanderley recusara-se a voltar para casa dos pais, ele combinara com Gustavo de tomarem uma cerveja. Encontraram-se no mesmo bar da outra semana e Gustavo pode ver o chefe, que há uma semana não trabalhava, abatido, mas bem disposto.
-Como é que você está, chefe? - perguntou Gustavo sorrindo.
- Melhor - respondeu Wanderley também sorrindo do "chefe"- eu passei uma semana de cão, mas pensei bastante vi que não posso jogar a minha vida no lixo por causa de uma cadela.
- Que isso, Wanderley? Não fala assim – repreendeu Gustavo.
- Mas, Gustavo, o que posso dizer? Como posso me referir a uma mulher que de repente joga tudo fora? Assassina, é isso.
- Comprovaram que ela tomou remédio errado?
- Errado, não! Certo! Ela queria matar o meu filho. Você não sabe do que uma mulher é capaz – Wanderley estava calmo, mas mostrava muita raiva da ex-mulher.
- Não sei – o rapaz riu.
- Desculpe, eu não queria dizer isso – Wanderley ficou sem jeito.
- Não disse - respondeu Gustavo. - Eu não sei mesmo. Acho que nunca quis saber.
- Ela tomou além do Diazepan, creio para ter coragem, uma dose grande de hormônio que causou o abortamento. Não sei o que é. Não quis saber. Sei que ela fez o que queria para me maltratar...
- Mas não fique assim não - consolou Gustavo. - Você é jovem. Terá outros filhos...
- Desculpe-me, Gustavo, mas foi a gota d'água. Creio que não serei capaz de fazer nunca mais a mesma coisa – desabafou o chefe.
-Como assim? - perguntou Gustavo.
- Não sei se confiarei outra vez em outra mulher. Mas não vamos falar mais nisso. Como vai a firma? – perguntou ele.
- Ótima. Quer dizer, seria melhor se você estivesse lá todo esse tempo. As meninas andam tristes. Aliás, todo mundo. A vantagem de se trabalhar numa firma tão pequena é que as pessoas se gostam mais, se envolvem mais e acabam por sofrer juntas quando uma não vai bem.
- Eu creio que tenho que me desculpar com todos vocês. Larguei a firma nas suas mãos e nem me dei conta de que precisavam de mim.
- Sabíamos que você precisava mais de nós que nós de você mesmo. Mas você não nos deu telefone, meio de contato.
- Pois é, eu fui um egoísta, mesquinho mesmo – desculpou-se ele. – As pessoas amam as pessoas e as pessoas são responsáveis por esse amor. Mas acontecem coisas como aconteceu comigo e você fica como que desacreditando de tudo.
- Você vai se recuperar logo, Wanderley. Há muitas pessoas que gostam muito de você. Logo logo, você vai redescobrir o prazer de viver.
- Tomara que você esteja certo. Mas vamos brindar a uma grande coisa. Creio que por isso tudo que aconteceu a gente se tornou grandes amigos. É bom saber que há pessoas como você que se preocupam e querem ver as pessoas bem.
- Obrigado, pelo elogio. Também acho que conquistamos a amizade um do outro. Isso é muito importante.
- Você também me preocupa, querido.
- Eu? Mas por que?
- Pela nossa conversa daquela última vez. Eu naquele dia deitei e não consegui dormir pensando na sua vida e na sua solidão – explicou Wanderley.
- Não se preocupe comigo, por favor - pediu Gustavo sorrindo, - eu estou bem.
- Ótimo. Mas isso não é verdade. Você está tentando me deixar menos preocupado. Não se incomode. Eu gosto de me preocupar com os outros. Você é uma pessoa especial.
- Meu Deus! Ele ainda enche a minha bola.
- Você nem sabe como.
Bebem mais algumas cervejas e Wanderley que não se alimentava bem há dias, fica um pouco mais embriagado que o amigo.
- Você acha que a gente teria como ser feliz apesar do mundo ser como é? – perguntou Wanderley.
- O que você quer dizer, Wanderley?
- Eu quero dizer que há uma semana a minha vida mudou e começou a mudar depois que nós tivemos aquela conversa aqui. Eu tenho pensado muito em você. Não quero que você pense que eu estou tentando tapar o buraco que ficou na minha vida depois de tão grande perda, mas eu tenho pensado muito em tudo o que você me disse e acho que a gente teria alguma coisa que poderia dar certo, não sei como e nem o que é...
- Você está me cantando agora?
- Estou! - Wanderley sorri. - Nenhuma pior época poderia existir. Você vai pensar que eu estou carente de amor porque levei o maior ferro na minha relação, porque estou sozinho, porque um monte de coisas, mas não é nada disso. Eu estou a fim de você há uma semana. Quase que naquela sexta-feira eu teria te convidado a dormir comigo.
- Wanderley, você não acha que já bebeu um pouco demais? – perguntou assustado Gustavo.
- Gustavo, você parece uma velha. Você não acredita nas pessoas? Não há nada que possa ser real nisso que te digo?
- Pode, Wanderley - respondeu Gustavo. - Pode e não devia. Eu tenho muito medo de me envolver com as pessoas e você sabe disso. Eu tenho medo até mesmo dessa nossa amizade de repente acabar por pura bobagem de um envolvimento de mesa de bar.
- Gustavo, eu nunca me permiti pensar em ir para cama com um homem. Não sei como é que se faz, nem o que se faz. Não interessa! Gosto de você e queria muito poder trocar carinhos com você, sei lá, acho até que esse sei lá eu aprendi com você – Wanderley estava mais solto pela bebida.
- Wanderley, eu acho que a coisa está muito recente na sua cabeça. Você ainda está sofrendo muito tudo o que aconteceu... – tentou dissuadi-lo o rapaz.
- Eu posso te jurar – Wanderley foi enfático, - que eu quereria estar com você independente de tudo o que aconteceu. Não se subestime. Você é lindo e parece que deve ser uma delícia - riu. - Naquela sexta-feira, no serviço, no dia da tragédia, eu fiquei te observando trabalhar. Aliás, trabalhar, não. Como eu te observei...
- Eu não percebi... – Gustavo não sábia o que dizer.
- Vamos tomar a saidera? - perguntou Wanderley.
- Já? - perguntou Gustavo olhando o relógio. - É cedo.
- Eu sei - concordou Wanderley sorrindo ao amigo.
Pediram a última cerveja da noite e depois saíram. Foram para um motel e passaram juntos a noite toda.
Pela manhã, Wanderley deixou Gustavo em casa e seguiu para o seu hotel. Não havia tido jamais uma noite tão agradável. Não havia jamais conseguido ficar tão feliz após uma noite de amor. O que andara fazendo com esse monte de mulheres vazias que passaram pela sua vida? Não saberia responder. Chegou ao hotel, tomou banho, deitou-se e dormiu até a hora do almoço. Acordou e rapidamente tentou falar com Gustavo pelo celular, estava fora de área, ligou para a empresa, mas lhe informaram que o rapaz havia saído cedo, talvez estivesse ocupado resolvendo coisas da própria firma. Tentaria mais tarde.
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O FILHO DE BERTA
HumorGiuliano e Wanderley são casados. Depois de vários desacertos nas suas vidas, inclusive casamentos heterossexuais, os dois, com os corações partidos, se encontraram em uma manhã, enquanto corriam na praça do Bairro Bom Pastor em Juiz de Fora. Amor a...