Capítulo XXVIII - Wanderley deslumbrado pelo filho

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Wanderley não mudara nada então? Pois sim! Passava agora os dias imaginando-se pai e, portanto, só falava do neném que estava por vir. Preocupava-se com os mínimos detalhes como se o recém-nato fosse morar com eles. Roupas, brinquedos, coisas mínimas que precisam um bebê...

Giuliano vivia a loucura do amante, mas estava arredio. Preocupava-se mais com o bem estar dos dois. Queria viver bem com o amigo, queria, pensou até mesmo, poder dar a Wanderley esse filho que ele tanto queria.

Sabia que não poderia fazer nada pelo amigo enquanto este não percebesse, sozinho, a loucura em que vivia, mas não podia fazer nada. Isso incomodava muito a Giuliano.

Um dia, deitados, Wanderley só falava no próximo encontro com Berta, na necessidade que ele tinha de encontrar com a mulher antes do parto, saber do que ela estaria precisando, Giuliano falou:

- Wanderley, eu estou preocupado.

- Com o neném? – perguntou ele.

- Não. Eu não estou nem um pouco preocupado com o filho de Berta. Essa criança que é nossa também, mas que vai ficar com a mãe e que vai ser criada pela mãe, não me preocupa.

- Mas então? - questionou Wanderley.

- Mas então, querido, desde o dia em que eu te disse que íamos ser pais, não tivemos mais um minuto de sossego – explicou ele. - Você não para de pensar nisso. Me perturba vê-lo nessa euforia, nesse fogo todo por uma coisa que nem sabemos realmente se é nossa.

- Claro que é. Berta disse... – Wanderley falou assustado.

- Berta disse - interrompeu Giuliano, - que não transou com ninguém mais além da gente nesse período. Será verdade? Não sei, Wanderley. Não me interessa muito saber. Também quero muito bem a essa criança, mas nós dois estamos perdendo o que de mais bonito existe entre nós. Cara, eu te amo, você diz que me ama, e a gente não se ama mais como antigamente.

- Como assim? – perguntou Wanderley com água nos olhos.

- Como assim? - continuou Giuliano. - A gente agora não para pra ficar um pouquinho de tempo juntos pra poder conversar sobre as nossas coisas. Não estamos mais um só momento sem essa criança rondando nossas cabeças. Está muito difícil viver essa situação.

- O que você quer dizer? - perguntou Wanderley. - A gente não tem que ficar mais juntos?

- Wanderley – falou firme Giuliano abraçando o amigo deitado a seu lado. - Eu não estou dizendo isso. Deus que me livre de pensar em nós dois separados... O que quero dizer é que você está dando uma importância grande demais a esse filho.

- E você está com ciúmes? – perguntou Wanderley. - Acha que por causa de uma criança eu vou amar menos você. Eu amo você mais que tudo na vida, Giuliano. Não quero jamais estar longe de você um só minuto. Mas é uma situação inédita: Nós somos pais de um filho gerado por uma mulher...

- Nossos amigos sabem disso? - perguntou Giuliano.

- Quem?

- Nossos amigos. Sonia, Marcelo, Julio, sei lá mais quem? – perguntou Giuliano outra vez.

- Não sei, mas Sonia convidou-nos pra uma reunião em sua casa amanhã - respondeu Wanderley.

- Eu não vou – disse rápido Giuliano.

- Que isso, Giuliano? Você sempre gostou tanto de reuniões na casa da Sonia.

- Mas você vai chegar lá - advertiu Giuliano, - e vai detonar essa ideia de que seremos pais. Berta sabe que você quer espalhar a notícia? Eu vou morrer de vergonha se você falar qualquer coisa a respeito e você vai falar. Não vou a casa de Sonia.

- Chato, você. Eu não vou falar nada não. Eu nem sei o que dizer disso tudo – observou ele. - Imagina, depois que todos os nossos amigos aceitaram que agente vive juntos e que se ama pra caramba, eu chego e falo que nós dois transamos com Berta. Onde fica a credibilidade no que fazemos?

- Eu não sei, Wanderley. Eu sei que eu quero te ter mais. Eu quero te amar mais ainda. Quero você comigo o tempo todo. A gente já passa o dia, de vez em quando, as noites, separados por causa de nossos serviços, eu quero que quando estivermos juntos falemos de nós, que a gente se curta como sempre foi. Chega de falar de criança, querido.

- Desculpe-me - concordou Wanderley.- Eu creio que me empolguei demais.

- Não é isso - tentou amenizar Giuliano.

- É sim! - sentou-se na cama Wanderley - Eu me empolguei demais. Eu talvez esteja querendo substituir o filho que Ligia me roubou. Talvez eu esteja perdendo o rumo da minha própria vida. Não sei, Giuliano. Não sei o que pensar. Preciso de sua ajuda como sempre. Meu Deus, o que seria da minha vida sem você?

- Wanderley, meu querido, meu amor, não se machuque mais. Você é uma pessoa que sofreu muito na vida. É um cara que hoje tem um bom salário - vamos pensar em dinheiro -, tem a sua própria empresa. Faz o que te dá na veneta. Pare de se martirizar porque não tem um filho. Pare de você também se culpar pela morte de Ligia.

- Mas eu não me culpo, você sabe disso - retrucou Wanderley alto.

- Culpa-se sim - repondeu Giuliano. - Você está sempre se culpando por alguma coisa que não fez, querido. Agora eu quero só você. Não me interessa se o filho que Berta espera é seu, ou é meu. Me interessa que o filho é nosso. Nós fomos até de certa forma imprudentes em levá-la pra cama, mas já aconteceu e o problema vem aí.

- Não é um problema, Giuliano - falou Wanderley quase chorando.

- Não, não é um problema, se você não atrapalhar o que existe de bom entre a gente. Nós vivíamos tão bem, Wanderley. Por que o fato de Berta estar grávida na Itália, com a possibilidade de ser de um de nós - já admitimos isso -, pode interferir no nosso relacionamento?

- Eu não quero de jeito nenhum perder você por uma besteira dessas, Giuliano - concordou Wanderley chorando. - Eu tenho comigo uma ideia fixa do que a gente é e do quanto a gente se gosta. Eu jamais me permitiria trair você como jamais permitiria a você me trair. Eu acho que eu estou te traindo...

- Como? - perguntou Giuliano perplexo.

- Eu tenho pensado muito nesse filho. Tenho pensado demais da conta. E não me importo se ele é meu ou seu. Não me importa nada. Eu quero essa criança e isso tem perturbado demais a nossa convivência... Desculpe-me, amore mio - Wanderley sorriu,- eu não sei viver sem você. Desculpe essa loucura em que estou vivendo...

- Ah, Wanderley, como posso não desculpar? Você é atualmente a razão da minha existência. Eu não sei mais o que dizer.

- Eu sei - concordou Wanderley sorrindo, - vamos nos amar sem preocupações. Vamos voltar a ser o que sempre fomos.

- Somos assim porque somos sempre sinceros.

- Um beijo - disse Wanderley abraçando o amigo.

O FILHO DE BERTAWhere stories live. Discover now