Giuliano, no trabalho, nada conseguia produzir de bom e seus fiéis empregados evitaram o dia inteiro de incomodá-lo, deixando o patrão nos seus devaneios.
Pensava na vida que teriam que levar agora que a criança estava pronta pra ter alta do hospital. Levá-la-iam pra casa? Teriam que cuidar daquele negócio molengo e chorão? Criança é uma coisa muito complicada para um homem cuidar. E se chorasse à noite? O que fariam com ela? Giu não tinha a menor consciência de como cuidar de uma criança.
Culpava Wanderley o fato de ter assumido perante a família de Berta a paternidade da criança. E talvez, realmente fosse ele o pai. Ele já tivera outro filho. A mulher não deixou nascer, mas ele já tivera outra gravidez na vida.
Giuliano lembra-se que apesar de tentarem de tudo, Carmem e ele jamais conseguiram ter um filho. Será que ele era estéril? Se fosse, com certeza o filho era de Wanderley. Será que Wanderley sabia disso e por isso mesmo tinha assumido a paternidade da criança?
Mas ele estava tão bem. Estava se sentindo o maior homem do mundo. Uma esterilidade comprovada agora não lhe faria mal nenhum. Com relação ao casamento que vivia, ele não podia engravidar e nem mesmo Wanderley. Se o filho fosse de Wanderley ele seria tão pai quanto.
O telefone tocou e ele atendeu:
- Pois não?
- Giu – ouviu a voz de Wanderley do outro lado da linha, - Berta teve alta do CTI. Já está no quarto.
- Que bom, Wanderley – alegrou-se o amigo. - O que você está fazendo agora?
- Nada! Já encerrei meu expediente hoje. Por que?
- Porque eu também. Você quer tomar uma cerveja comigo na Churrasqueira? Estarei lá em dez minutos.
- Não serei tão rápido, mas creio que lá chego em vinte minutos. Um beijo daqueles grandes.
- Outro – encerrou a ligação Giuliano rindo.
Fechou a gaveta a chave, e pensou no marido. Precisava fazer com que nada mudasse entre eles. Não podiam agora simplesmente como Wanderley queria, dizer a Berta que não queriam mais a criança.
Será mesmo que ela queria que eles quisessem a criança? Será que não foi muito da cabeça dela querer ter um filho e botar a "culpa" neles? Talvez eles tivessem que passar por isso, mas estava sendo muito ruim a situação.
Encontraria Wanderley no bar e conversariam. Precisavam chegar a um denominador comum entre eles mesmos para saber o que fazer.
Entrou no bar meio sem graça e sentou-se a uma mesa qualquer. Esperaria Wanderley chegar e nem sabia o que dizer ou como começar a dizer qualquer coisa.
Não tardou muito e Wanderley entrou no bar e logo viu Giuliano.
- Há muito tempo me esperava? - perguntou ele?
- Não, meia cerveja, talvez, - respondeu Giuliano.
- O que está acontecendo, Giu?
- Nada, Wanderley. Eu estou muito preocupado com Berta e principalmente com essa criança.
- Eu também, e você sabe disso.
- Sim, eu sei. Mas o que me preocupa realmente é essa sua vontade atual de não querer mais o filho. Você soube de alguma coisa que possa ter feito sua ideia mudar tanto?
- Não. Não soube nada que você não saiba também, mas eu prefiro que a gente não se envolva tanto nessa história. Creio que foi um direito dela nos contar a verdade, foi um direito dela querer ter o filho, e é um direito nosso assumir ou não essa criança.
- Wanderley, que coisa maluca - ponderou Giuliano. - Você diz que simplesmente podemos esquecer o fato e pronto.
- Eu sei que isso é um papel de calhorda e cretino, mas acho que podemos conversar com Berta e não assumir esse filho pelo bem da própria criança.
- É exatamente esse o problema: - Eu também não quero uma criança chata, bisbilhoteira e insuportavelmente terrível correndo na minha sala e quebrando meus bibelôs, mas não podemos esquecer que é nosso filho e que precisamos dar atenção.
- Giu, você não está me entendendo. Eu não quero largar a criança e Berta na "rua da amargura" e continuar vivendo como se nada tivesse acontecido. Quero viver com você como se tudo isso tivesse acontecido e a gente tivesse sabido superar essa crise em que a gente se encontra. Eu não quero perder você porque um dia, uma maluca apareceu e disse: - Toma que o filho é teu! Isso é coisa de música.
- Mas nós vamos continuar vivendo como sempre vivemos. Eu continuo te amando muito e, com filho ou sem filho, é contigo que quero viver e futuramente até morrer.
- Vai morrer comigo, sai pra lá, encosto. Sei lá se você vai antes – Wanderley riu e fez o amigo rir também.
- Eu acho até que a gente cresceu muito com essa história toda, mas agora o importante é conversar com Berta e chegar a um denominador comum. Ela nunca disse que queria que assumíssemos seu filho - lembrou Giuliano. - Você se lembra dela ter dito isso alguma vez?
- Não, mas vai dizer! Ah, vai! Mulher é tudo igual.
- Que isso, Wanderley? - perguntou Giuliano assustado.
- Estou brincando - o rapaz sorriu. - A gente tem mesmo é que botar a cabeça no lugar e conversar. Vamos tomar mais cerveja?
- Claro! Eu hoje estou a mil por hora...
- Por falar nisso - perguntou Wanderley, - que tal se a gente fosse pra aquele motel que a gente ia de vez em quando?
- Você acha? - perguntou Giuliano fingindo-se de tímido. - Eu acharia perfeito, querido. Quebra um pouco essa nossa guerrinha de nervos.
- Ótimo, mas eu não estou com muita pressa não, e podemos ouvir um pouco mais dessa música ao vivo.
- Claro, querido. Hoje podemos tudo!
Os amigos continuam um pouco mais no bar e tomam algumas cervejas e depois saem de carro a caminho da noite. Não estão ainda satisfeitos com o que está acontecendo. Não adianta que digam que querem ou que não querem o filho. Não sabem realmente o que a mãe da criança quer. Mais uma vez o jeito era esperar que as coisas acontecessem. E como chegaram a conclusão de que não deviam esperar sentados, estavam ali a caminho de um motel prontos pra se amarem e viverem mais uma noite a dois. "Amanhã eu penso nisso!"
Churrasqueira - Bar aberto de segunda a sábado no bairro São Mateus. Ótimo!
Scarlette Ohara- E o vento levou
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O FILHO DE BERTA
HumorGiuliano e Wanderley são casados. Depois de vários desacertos nas suas vidas, inclusive casamentos heterossexuais, os dois, com os corações partidos, se encontraram em uma manhã, enquanto corriam na praça do Bairro Bom Pastor em Juiz de Fora. Amor a...