Capítulo XLIII - Berta continua em coma

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Mais tarde, foram novamente no hospital e encontraram com Sonia que também estivera ali pra saber notícias da amiga.

- E então, meninos - perguntou ela, - já souberam notícias do bebê?

- Sim, a gente esteve aqui toda a manhã - respondeu Wanderley. – Ele está bem. Você soube agora como está Berta?

- O médico me disse que continua na mesma. Sedada, apagada mesmo e eles não falam com ninguém.

- Que droga! - desabafou Giuliano. - A gente queria vê-la.

- Até que ver, tudo bem, mas ela está desacordada - respondeu Sonia.

- Você acha que ainda tem jeito, Sonia? - perguntou Giuliano.

- Meninos, não desanimem. Tudo pode dar certo! Vamos ter fé em Deus que tudo se resolverá mais cedo ou mais tarde.

- Assim esperamos, Sonia – Giuliano suspirou fundo.- Nós vamos lá pra vê-la assim mesmo. Tá na hora da visita ao CTI.

- Vão sim. Se precisarem de alguma coisa, sei lá, conversar, companhia pra tomar uma cerveja e desabafar, contem comigo. É só ligar.

- Um beijo, Sonia – despedem-se. - A gente se fala.

A amiga saiu e eles entraram no hospital. Hospital sempre tem um cheiro de hospital, uma aparência de hospital, um tudo demais de hospital pra quem não vive ali dentro o dia inteiro. Desceram ao CTI ainda no horário de visitas entraram, um de cada vez pra ver a amiga.

Giuliano foi o primeiro a entrar. Chegou ao leito e a amiga estava sedada, intubada e ligada a aparelhos. Dormia, sob efeito de remédios, uma veia puncionada no pescoço, monitor cardíaco tocando o seu tétrico: bip... bip... bip... Giuliano via a cena como vira a da irmã na mesma situação anos atrás. Será que ela verá o filho? Será que terá o prazer de pegar a criança no colo? Ou será que nem sairá dali? Perguntas e mais perguntas que não poderia responder, só o tempo.

Wanderley quando entrou, quase chorou, não conseguiu ficar muito tempo ao lado da amiga. Sentiu-se tão infeliz de pensar na ex-mulher, no dia em que naquele mesmo hospital ela tivera o aborto e acabara de vez com suas esperanças de ser pai. Aquele dia ele queria matá-la ali naquele lugar. Hoje faria tudo pra salvar a vida da amiga, mãe de seu filho.

Saíram do hospital após reverem o filho e no carro, depois de alguns minutos em silêncio, Wanderley falou:

- Eu acho que ela vai sair bem.

- Eu espero muito – Giuliano disse como se soltasse um peso amarrado no peito. - Não sei o que pensar disso, meu amigo.

- Giu, a gente podia andar um pouco pela cidade?

- Claro. Onde você quer ir? - perguntou o amigo ao volante.

- Em lugar nenhum - respondeu Wanderley. - Vai andando e deixa correr. Acho que a gente vai relaxar um pouco. Vou botar uma musiquinha legal e a gente vai vendo a cidade e falando o que vier na cabeça.

- Acho ótimo, querido.

Enquanto rodavam de carro, no CTI, Berta passava por momentos terríveis de delírios e pesadelos.

Estava ela andando nua pelas ruas de Roma. Via todo mundo e não era vista por ninguém. Falava e não era ouvida. Passavam pessoas por ela e, como se nada houvesse naquele lugar, continuavam seus caminhos por mais que ela implorasse atenção. Corria e corria feito louca e em nenhum lugar chegava.

De repente, encontrou-se num descampado sozinha e a seus pés foram aparecendo crianças, recém- natos, um, dois anos e todos chorando e clamando pela sua atenção, como se ela fosse mãe de todos eles. Ela gritava e não conseguia ouvir o próprio grito. Estava para se desesperar quando viu a figura de um homem que indicava pra ela um caminho a seguir.

Tentou acompanhar de perto o homem que não reconheceu e, já há muito, o perdera de vista. Continuou caminhando e caiu em um longo e escuro buraco. Escorregava pra dentro da terra e não conseguia se firmar em nada pra poder parar aquela queda vertiginosa. Bateu então em uma pedra que servia de fundo àquela grota e o corpo todo lhe doía. Tentava ver em volta, mas só a escuridão lhe era reservada.

Chorava muito, chorava e tentava falar, mas a voz não lhe vinha na garganta e ela então mais uma vez adormeceu e tudo se fez escuro e paz.

- Coitada - disse a enfermeira ao médico de plantão, - está tão agitada, parece até que está sonhando com coisas perigosas.

- Ela está em coma, não estará sonhando com nada – explicou ríspido o médico do plantão. - Vi agora os resultados dos exames e estão péssimos. Talvez deva receber nova transfusão de glóbulos pela manhã.

- É muito grave, doutor? - perguntou a enfermeira.

- Muito. Mas ela verá o filho, se Deus quiser.

Continuou o médico com o exame dos pacientes do CTI, e Berta agora dormia sedada, aguardando que o seu próprio organismo ajudasse a medicação que lhe era administrada.

Giuliano cansou de dirigir pelas ruas e então parou o carro num bar da estrada.

- Gosto muito de vir aqui - observou Wanderley. - O "Lua Bonita" é sempre um lugar que vale a pena vir.

- Eu vinha aqui muito mais vezes - lembrou Giuliano. - Hoje eu não estava com nenhum lugar em mente pra ir. Vamos tomar umas cervejas?

- Vamos! Eu acho que a gente está precisando.

Sem do carro e entram no bar-restaurante. Conhecem o dono do bar e vários garçons. Sentam-se a uma mesa fora do bar, aproveitando que a noite está quente e quando são servidos Wanderley disse:

- Se ela não sair do CTI, a gente tem que tomar providências quanto ao registro da criança.

- Eu não sei o que ela disse a família - ponderou Giuliano. - A gente vai ter que conversar com eles e registrar esse menino. Mas acho que devemos esperar um pouco mais.

- É claro, ela vai ficar boa.

- Com certeza - disse Giuliano oferecendo o copo ao brinde com o amigo. - A Berta.

Beberam algumas cervejas, comeram uma boa carne e tarde da noite saíram pra voltar pra casa. Estavam bem, preocupados, claro, mas bem. Não teriam problemas em resolver a vida da criança se fosse preciso, tinham agora uma impotência total em relação a resolver a vida da amiga. Não podiam fazer nada, só esperar.


"Lua Bonita"- Bar na BR040, próximo a entrada pra Juiz de Fora de quem vem do Rio de Janeiro, hoje "Queijaria São Luiz".

O FILHO DE BERTAWhere stories live. Discover now