Capítulo XXXVII - A conversa com Berta

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No dia seguinte foram visitar Berta. A moça, avisada, aguardava os amigos com o melhor sorriso do mundo.

- Que bom que vieram - recebeu ela. - Queria mesmo mostrar pra vocês as roupinhas que comprei hoje pro nenê.

- Mas, Berta, mais? - perguntou Giuliano.

- Mais? Claro, você quer que nosso filho seja malvestido? - perguntou ela sorrindo.

- Claro que não, querida, mas já tem tanta coisa - argumentou Giuliano.

- E é sobre isso mesmo que viemos conversar com você - interompeu Wanderley sério.

- Nossa! O que houve? - perguntou ela também séria.

- Berta, a gente está quase enlouquecendo de pensar no nenê. Não sabemos muito sobre o que pensar - começou Wanderley, - mas como estamos perdidos no assunto, viemos aqui tentar conversar com você sobre o que você pretende, sobre como nós vamos entrar na história, sei lá.

- Mas gente, o que é que "'tá pegando"? - perguntou ela.

- O que está pegando? - repetiu Giuliano. - O que você pretende fazer com seu filho em relação a nós dois?

- Dá-lo pra vocês. - respondeu ela.

- Como é que é? - perguntaram os dois.

- Sim, queridos, vocês são os pais. Nada mais justo que vocês cuidem dele aqui no Brasil enquanto eu trabalho e vivo a minha vida na Europa que é o meu lugar.

- Ah, não! Que isso, Berta? - perguntou Giuliano.

- A nossa preocupação com essa criança, vivendo com a mãe odiar o fato de ter dois pais homossexuais e casados já era grande, imagina agora ela ir morar conosco e ter dois pais e nenhuma mãe, porque você foi embora - desabafou Wanderley.

- E o que você quer que eu faça? - perguntou ela nervosa. - Por acaso quer que eu também permaneça no Brasil e crie o meu filho? Por acaso pensam que seria legal pra eu casar-me com vocês dois e fazermos uma belíssima família moderna. Não! Eu ficar no Brasil é impossível. Vocês mudarem-se pra Itália não tem nada a ver, e no fim das contas, também essa criança não tem nada a ver.

- Berta, o que é isso?- perguntou Wanderley assustado. - A gente está curtindo tanto o fato de que essa criança existe...

- Eu sei, Wanderley. Compreendo tudo isso, Giuliano. Mas o que vocês não entendem é que eu não posso me permitir viver com vocês, amando os dois e sem ter nenhum dos dois. É muito difícil pra uma mulher estar na situação em que estou, mas eu estou e agora também eu não sei o que fazer.

- Seus pais, irmãs, o que pensam? - perguntou Giuliano.

- Não sei! Creio que devem achar que é de um de vocês. De qual, nunca perguntaram.

- E quando o nenê nascer? - perguntou Wanderley.

- Fica tudo do mesmo jeito meninos. Vocês estão se preocupando demais com coisas que não têm de se preocupar. Eu vou ter o meu filho - explicou Berta, - e vou criá-lo. Vocês não precisam ter medo de que eu vá entregá-lo a vocês. Sei o tipo de vida que têm e que não têm tempo pra se dedicarem a uma criança, mas não sejam preconceituosos com vocês mesmos. Vocês têm capacidade pra cuidar de uma criança? Claro que têm. A criança vai ser traumatizada, louca, sei lá o que, por que tem dois pais e só uma mãe? Não sei! Não sabe ninguém o que pode acontecer com uma criança por mais normal que seja tudo ao seu redor.

- Mas, Berta - perguntou Wanderley. - A gente vai entrar nessa história de que jeito?

- Não pensei nisso ainda, Wanderley. Que coisa! Pensei até em dizer pra criança que vocês eram tios, pai não tem jeito.

- Como não, Berta? - perguntou Giuliano.

- Como sim, Giu? Se eu disser pra ela que um é o pai, o outro com certeza vai ficar com raiva e vice-versa. Eu não quero separar vocês por causa disso não.

- A gente pode tirar no cara-e-coroa - brincou Giuliano.

- Como é que é? - perguntam juntos Wanderley e Berta.

- Sim, cara-e-coroa. Nós dois – Giuliano sorriu a Wanderley, - o que ganhar assume a paternidade e o outro a "tiedade".

- Giu, você é muito louco - riu Wanderley. - Mas podemos pensar que isso seja realmente uma solução.

- Vocês não podem estar falando em definir o pai de meu filho no cara-e-coroa – Berta disse aborrecida. - Vocês estão mais loucos do que pensei.

- Não, Berta. Há os trâmites legais de um nascimento, certidão de nascimento, registro, essas coisas. Eu sei que há pessoas que registram os filhos com datas diferentes no cartório e na igreja, mas nunca houve casos de pais diferentes no cartório e na igreja.

- Giuliano, para de falar – Berta foi firme. - Deixe-me pensar um pouco nisso. Eu não acreditei que vocês quisessem tanto esse filho. Imaginei realmente que vocês diriam que eu era louca e que não queriam realmente assumir nada. Sei lá mais o que pensei.

- A gente gosta mesmo dessa ideia de ser pai, Berta – começou Wanderley. - Acho que isso atrapalha o nosso dia-a-dia, porque queremos demais essa criança.

- Eu preciso pensar. Me deem um tempo - pediu Berta. - A gente vai se falar mais um monte de vezes. Vamos chegar num acordo, queridos. Mas eu continuo amando muito vocês.

Sem muito mais o que discutir Wanderley e Giuliano saíram da casa de Berta e voltaram pra casa. Calados no caminho, cada um tinha em mente uma coisa diferente da do outro. Não pensavam jamais em se separarem pra ficarem com a criança e Berta, mas imaginaram mudando-se pra Roma, imaginaram Berta ficando de vez no Brasil. Não sabiam mais no que pensar.

O FILHO DE BERTAWaar verhalen tot leven komen. Ontdek het nu