Capítulo CXXVIII - HELÔ

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O Tonho e a Sara sumiram.

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O sol já tinha nascido e eu estava apavorada. Eu estava tentando segurar a barra, mas estava difícil. O Tião estava do meu lado, mas apesar de ser a irmã dele que estivesse sumida também, ele parecia estar muito mais tranquilo do que. Como eu invejava sua calma.

Eu sabia que eles tinham inventado uma desculpa para poderem ficar a sós, mas não imaginava que eles fossem demorar tanto para voltar para casa. Quando achei que o tempo limite para que eles voltassem tinha se esgotado, fui pedir ajuda pro Tião. Primeiro porque, na ausência do Tonho e da Sara, ele assumia a liderança e segundo, porque se tratava da irmã dele.

– Deixa eles aproveitarem um pouco. – Ele deu de ombros, como se não importasse.

Fiquei muito zangada, porque eu sabia que alguma coisa tinha acontecido. Apelei para a Iolanda, já que ela podia ficar invisível e procura-los em alguns lugares, especialmente na delegacia, que era um local que me dava medo. Quando ela voltou sem nenhuma novidade, o medo virou pavor, porque o fantasma do hospital começou a me assombrar.

Passei a madrugada inteira sentada na calçada, com o Tião ao meu lado – reclamando o tempo todo – e esperando que eles voltassem. Mas eles não voltaram.

– Olha lá! São eles – avisou o Tião.

Levantei a cabeça, que estava apoiada nos joelhos, e ele tinha razão. Lá vinham os dois, com roupas diferentes e ostentando um sorriso bobo naquelas caras deslavadas. Levantei imediatamente, sentindo a raiva tomar o lugar que antes estava ocupado pela preocupação. Marchei até eles e dei um empurrão no Tonho. Como ele era bem mais alto e forte do que eu, aquilo não o abalou em nada.

– Vocês não têm vergonha na cara? – perguntei, quase espumando. – Eu passei a noite inteira aqui, sentada nessa droga de calçada, esperando os dois bonitões aparecerem. O que vocês têm na cabeça?

– Calma, Helô – tentou a Sara.

– Não fala comigo! Você tem alguma noção do que passou na minha cabeça? – continuei, com a voz embargada e algumas lágrimas embaçando a minha visão. – Eu estava apavorada, seus imbecis.

Eu estava tentando segurar as lágrimas desde o momento em que me dei conta do sumiço deles. Agora eu já não conseguia mais segurar. Ainda mais depois que o Tonho me abraçou e me deu um beijo no topo da cabeça.

– Aconteceu um imprevisto e não tivemos como avisar – explicou, com calma. – Eu peço desculpas se te preocupei. Não foi a minha intenção e isso não vai se repetir.

Retribuí o abraço e continuei chorando por algum tempo, até ouvir o Tião se pronunciando pela primeira vez.

– Sara está bem. Tonho está bem. Problema resolvido – concluiu, dando um longo bocejo. – Se vocês não se incomodarem, vou fazer o que eu deveria ter feito a noite inteira. Boa noite.

E sem rodeios ele entrou. Como ele conseguia ser tão insensível?

– Eu acho que vou me juntar ao Tião – emendou o Tonho, também bocejando. – Vocês buscam o café da manhã?

– Claro – disse a Sara, dando um selinho nele.

Seguimos pela rua sem trocar nenhuma palavra. Eu ainda estava tentando me acalmar, mas a Sara estava esquisita e eu não conseguia entender o que tinha de diferente nela. Ainda sem conversar, entramos na padaria e pegamos a comida.

Já na metade do caminho, resolvi quebrar o silencio.

– O que aconteceu, afinal?

– A tempestade. Acabamos ficando encharcados e quando passamos na frente da casa da Suzana, a Fernanda nos convidou para entrar. A Suzana deu uma bronca na gente, mas nos fez tomar um banho quente e dormir lá – explicou, encarando o chão. – Foi por isso que não conseguimos te avisar.

Concordei com um resmungo e continuamos caminhando em silêncio.

– Ei! Espera aí. Se vocês dormiram lá, então porque o Tonho subiu direto para a cama? O que você está me escondendo, Sara? – questionei, desconfiada.

Eu não sabia o que ela estava escondendo, mas eu sabia que tinha alguma coisa ali, pois ela ficou vermelha e muito sem graça.

A esta altura da conversa, já estávamos na esquina de casa, por isso ela me fez esperar até que ela deixasse a comida sobre a mesa da cozinha e então me levou para longe de casa. Seja lá o que fosse, eu estava ficando com medo.

– O que aconteceu, Sara. Fala de uma vez!

– Nós não dormimos – explicou tão baixinho, que eu quase precisei ler seus lábios.

– Como assim? Se vocês não dormiram na Suzana, então onde vocês passaram a noite? – insisti.

Aquela história estava me cheirando muito mal. Alguma coisa não batia.

– Você não entendeu – continuou em voz baixa, como se alguém pudesse escutar nossa conversa. – Nós passamos a noite na Suzana, mas...

Eu nunca tinha visto a Sara tão sem graça e ainda não tinha entendido o porquê.

– Olha só, eu não estou entendendo. Você quer fazer o favor de...

E então, como num estalar de dedos, tudo passou a fazer sentido de uma hora para outra. Daí foi a minha vez de ficar sem graça.

– Você está dizendo que vocês... é... vocês... – Tentei procurar uma palavra que se encaixasse, mas não me fizesse morrer de vergonha ao pronunciá-la. Como não encontrei, achei melhor deixar a frase morrer.

Ela concordou, tão envergonhada que nem conseguia me encarar. Mas apesar de estar sem graça, ela estava feliz. O jeito que ela e o meu irmão se olharam quando chegaram, aquele sorriso... Estava na cara o tempo todo.

– Você ama ele, né? – perguntei.

– Mais do que eu pensei que fosse possível – disse, encarando-me pela primeira vez, com um brilho no olhar que eu nunca tinha visto antes. – É sério, Helô. É tão grande que, ao mesmo tempo em que eu me sinto a pessoa mais feliz do mundo, é completamente assustador.

Sorri em resposta. Eu ainda gostava do Bruno, mas não chegava nem aos pés desse sentimento que ela acabara de me descrever. Talvez se tivéssemos tido oportunidade de passar mais tempo juntos, isso acontecesse. Mas essa era só uma possibilidade.

Como sua melhor amiga, eu queria lhe perguntar todos os detalhes da sua noite, mas, como sua cunhada, eu não queria nem imaginar o que tinha acontecido, porque pensar no meu irmão fazendo essas coisas me causava nojo.

– Eu não sei o que dizer sobre isso – concluí, ainda surpresa com a revelação. – É um pouco inusitado, mas eu estou me sentindo muito feliz por vocês.

Abracei-a com força. Era maravilhoso ver as duas pessoas que eu mais amava se dando tão bem. Eu sempre tinha sonhado com isso, afinal. 

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Beijão ;*

As Últimas Cobaias - Livro 3Onde as histórias ganham vida. Descobre agora