Capítulo LXXXI - TIÃO

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Tião saiu vazado depois do fiasco no teste.

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Já estava quase anoitecendo quando a tal mulher se aproximou de mim. Ela parecia cansada e eu não via nada que ela quisesse tratar comigo, mas ainda assim minha curiosidade falou mais alto.

– Eu estou faminta – disse. – Gostaria de me acompanhar num cafezinho?

É claro que eu queria. Eu também estava com fome. A questão é que pessoas como eu andam sem um tostão no bolso e duvido muito que qualquer local nessa cidade aceite outra forma de pagamento.

– Eu estou te convidando, Sebastião. Eu vou pagar – disse, como se pudesse ler meus pensamentos.

Sem jeito, apenas concordei e a segui até uma padaria próxima dali. Sentamo-nos numa mesa afastada da porta. Ela pendurou sua bolsa na cadeira e me fitou com curiosidade.

– Você me disse que aprendeu a tocar sozinho, não é?

Ela aparentava ter uns quarenta anos e apesar de muito bem vestida, ela não era muito bonita. Talvez fosse o corte de cabelo que não combinasse com ela ou a maquiagem carregada. Eu não sei.

– É – respondi, vago. Eu não estava entendendo onde essa conversa chegaria.

Antes que ela tivesse chance de continuar, a garçonete anotou o pedido – dois chocolates quentes e dois sanduíches, que eu não tive chance de recusar.

– Bom, você deve estar se perguntando o motivo de eu ter pedido pra você esperar – tornou, apoiando os cotovelos sobre a mesa e entrelaçando os dedos. – E o motivo é muito simples, garoto. Eu vi em você algo que eu não vejo em um candidato há muito tempo.

– Falta de noção? – arrisquei.

– Ousadia – tornou, ignorando minha resposta. – Nenhum outro candidato tentaria fazer o teste, mesmo sem saber tocar o instrumento, se não precisasse muito dessa vaga. Eu reconheço uma pessoa desesperada a quilômetro, Sebastião. E sabe por quê?

Balancei a cabeça em negativa.

– Porque eu já estive no seu lugar – sorriu. – Eu também precisei provar para os jurados que eu era merecedora da vaga, mesmo que todos tentassem me dizer que eu não merecia.

Ela então me contou toda a história de como ela entrou para a orquestra quando tinha apenas dezoito anos e provou para todos que, mesmo vindo de família humilde, sem professores particulares ou instrumentos caros, era digna daquela vaga. Não consegui não me impressionar. Quem via a mulher chique a minha frente, jamais pensaria isso.

A esta altura a comida já estava sobre a mesa, mas eu não consegui tocar no meu sanduíche.

– Mas de nada vale a ousadia sem o talento – continuou. – É por isso que eu quero que você venha até aqui amanhã e traga seu violão. Se você me provar que além de ousado, também é talentoso, eu vou tentar uma bolsa para você no conservatório, para que aprenda a tocar todos aqueles instrumentos que você viu na sala de audição.

Encarei-a com certa desconfiança. Ela não podia estar falando sério. Puxa! As coisas sempre foram tão difíceis para mim e de repente o destino estava me dando essa oportunidade única, assim? Sem pedir nada em troca?

– O que você vai querer em troca? – indaguei, cético.

– Na verdade, tem uma coisa que eu vou querer sim. Não será nada fácil, mas eu vejo potencial em você.

– E o que é?

– Sua inteira dedicação a esse projeto. Você irá se dedicar tantas horas quanto forem necessárias para ser o melhor aluno.

– Acho que eu posso fazer isso – sorri, aliviado.

Ela sorriu de volta, enquanto deixava uma nota de cinquenta reais sobre a mesa e pegava a sua bolsa.

– O troce é seu – deu uma piscadinha e foi embora e só então consegui comer meu sanduíche.

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Eita!! Finalmente o destino está sorrindo pro nosso menino :D

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Beijinhos :*

As Últimas Cobaias - Livro 3Onde as histórias ganham vida. Descobre agora