THEOGENESIS | Livro Um | Os Deuses e o Mundo

Capítulo 69 | Décimo dia - Esperança e Pesadelo

Naquele momento, Gaia temeu perguntar os motivos de Zeus querer destruí-la, pois, dentro de si, a Senhora da Terra suspeitava quais eles eram e, caso fossem confirmados, tudo se tornaria muito pior, em função dela ser obrigada a admitir que, por causa de sua aversão à fraqueza, ela sempre viu o Filho de Chronos, e a fragilidade inerente ao corpo dele, como a personificação, e também o castigo, dos erros cometidos pelo Senhor do Tempo.

Contudo, enquanto resistia à dor e se martirizava por estar sofrendo as consequências de ter subestimado Zeus, a ânsia de saber o que realmente havia por de trás da atitude do Filho de Chronos foi mais forte e impeliu a Senhora da Terra a questioná-lo mesmo assim.

— Por quê? — Gaia disse com dificuldade.

— Por que, para você, eu sou igual àquela cópia de terra. — Zeus gritou deixando a raiva pontuar cada palavra. — Sou apenas algo criado para obedecer suas ordens.

— Não é verdade. — Ela retrucou no mesmo tom e se contorceu de dor. — Você sabe que é muito mais do que isso. Você é parte fundamental do meu legado.

— Eu não quero ser parte do seu legado. — Ele contrariou gritando ainda mais alto. — E muito menos viver em mundo governado pelos Titãs, onde eu e minha família seremos apenas sombras.

— E o que você quer? — Perguntou preocupada.

— Não é óbvio? — Disse assumindo uma tranquilidade ameaçadora. — Eu quero, e vou ser, o Senhor do Mundo.

Chocada, Gaia tentou negar a culpa descomunal que a afligiu naquele instante, se recusando a reconhecer a realidade de ter falhado por completo, ao transformar a esperança de restaurar seu legado em seu pior pesadelo. Porém, a dor crescente, causada pelo nódulo enfiado dentro do seu peito, logo a fez perceber como aquela negação era apenas um esforço inútil.

— Desde quando você planejou me destruir? — A Senhora da Terra perguntou revoltada mais consigo mesma do que com o Filho de Chronos.

— Eu gostaria de falar desde sempre, porque você nunca me deu opção alguma. Mas, na verdade, essa decisão não aconteceu de uma hora para a outra. Ela foi se formando a cada vez que você foi negligente comigo, a cada vez que usou sua sinceridade prepotente, a cada vez que olhou para mim e viu alguém fraco e inferior. — Fez uma pausa. — Até hoje de manhã.

— Bem que eu estranhei aquelas perguntas. — Falou com a voz esganiçada. — Você não estava preocupado com a invencibilidade de Chronos. Você queria saber como se tornar o senhor de um domínio. — Acusou furiosa.

— Eu ainda quero. — Disse calmo. — E você vai me dizer agora. — Terminou de falar abrindo os braços totalmente, expandindo o nódulo com grande velocidade, aprisionando o espectro de Gaia e amputando suas labaredas, que se desintegraram em pleno ar, junto com seu grito de dor.