45 - DA DOR A ALEGRIA

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Estamos em reta final! :'(

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Estela

O tempo passava, mas eu não conseguia vê-lo. Tudo parecia estar caminhando no modo automático, embaçado, distorcido, em ruídos e odores diversos me confundindo.

Assim que saí do quarto de Adriel, no hospital, retirada sob pressão pela equipe médica, caminhei absorta e aflita até o local de espera mais próximo. Sentei em uma das cadeiras e ainda conseguia ouvir, ao fundo, os passos, as conversas, o som provido da televisão que estava à frente... E não sei quanto tempo depois eu fui perceber que não estava sozinha.

Eu olhei para o lado e vi Daniel com as mãos na testa, sentado, apoiando os cotovelos nas coxas em prostração. Ouvia pequenas lamúrias e me toquei de que, talvez, eu devesse lhe falar algo... Mas, não consegui. Voltei a olhar para a frente, absorta, e levei a corrente de Adriel a boca; a beijei e a coloquei em volta de meu próprio pescoço. Abaixei a cabeça. Eu me sentia na forca.

Eu ainda mantinha um estado de transe e, não sei bem o que falei, quando minha tia se aproximou. Na certa, ela entendeu que eu precisava de espaço e me deu um tempo.

Logo outros foram chegando. Vi Natiel algumas vezes, sempre de touca, com uma expressão preocupada, mas nunca permanecendo no mesmo lugar por muito tempo. Vi a mãe deles, um praticamente milagre, amparando Daniel que precisou se retirar por diversas vezes a fim de tentar recuperar o equilíbrio emocional, incluindo o recebimento de medicamentos por meio de acessos.

Observei Jadir se aproximando e me falando qualquer coisa sobre Natalie, sobre os poemas de Adriel... Ouvi algo referente a ter conseguido, por meio de um primo editor, a avaliação para publicação. Ele ainda falou qualquer coisa referente a volta firme na faculdade e a decisão de trabalhar em hospitais.

Ainda vi Emerson sorrindo fraco e tentando me consolar falando alguma coisa da qual não entendia muito bem. Ele dizia que a vida continuaria... Por certo eu estava sabendo da morte de Mikaela, mas não parei um só instante para pensar no assunto. Eu não estava entendendo mais o que era a vida.

Eu ainda permanecia em meu estado sério, cabisbaixo e ligeiramente afastado. Era como se eu estivesse em outro mundo, numa tentativa de me afastar do que poderia estar me matando neste.

Não queria sair dali mas precisei fazer isso por alguns dias. Adriel foi reanimado e estava sendo mantido em uma série de exames e treinamentos exaustivos no hospital. Não tinha tempo para vê-lo. Na verdade, nem mesmo os irmãos o estavam acompanhando muito. Os médicos pareciam temer o abalo emocional, então só permitiam a presença dos pais.

Eu pude ver umas duas ou três vezes o pai de Adriel, a distância, assim como a mãe. Ela, por vezes, era repreendida por fumar no local e o pai parecia quase que indiferente a situação, como se fosse algo rotineiro, uma espera certa.

Quanto aos sonhos... Eu sei que tive alguns, mas não me lembrava deles. Eu quase não dormia.

O dia do velório e enterro de Mikaela havia chegado. Como se afastasse toda a ventania, e numa tentativa de abrandar e aquecer nossos corações, o sol apareceu. Eu iria, é claro, e Jadir e Emerson me aguardavam na saída de casa.

Não trocamos muitas palavras e nem demonstramos nosso desespero interior. Na verdade, naquele dia, não sabia bem por que, eu estava me sentindo mais leve; um consolo refrigerador parecia estar tomando conta de mim. Eu senti vontade de agradecer...

Por algum motivo eu despertei e, enquanto o velório seguia, em um caixão fechado a pedidos da família, eu sorri e depositei uma margarida para Mikaela. Não me lembrava quando foi a última vez em que eu sorrira. Junto a uma lágrima, eu sussurrei em direção a ela:

– Obrigada amiga... – Ela estava me ajudando, eu sabia!

***

Eu estava mais composta e minha atenção havia melhorado. Eu não sabia quantos dias haviam se passado desde a minha última fala com Adriel, mas sabia que não era a única que havia parado no tempo. Pude ver Daniel, de canto, na cerimônia fúnebre. Estava se amparando a uma parede, como se já não tivesse tantas forças para manter a posição ereta, e cabisbaixo como eu me lembrava; embora aparentando menos desespero. Fui até ele.

– E então? Como estamos? – Perguntei como se o estado de Daniel pudesse se refletir ao meu.

Nós não trocamos muitas palavras desde o ocorrido, nem mesmo pelo celular.

Ele levantou o semblante abatido e me respondeu com voz fraca:

– Ah, oi Estela! – Disse com a surpresa de me ver. – Estamos melhores...

– Alguma novidade?

– Muito grande – respondeu ele elevando as sobrancelhas, como se precisasse de força facial para conseguir emitir som suficiente, e continuou: – O transplante será feito. Foi decidido nesta manhã.

Senti palpitar o coração e os arredores sumir de repente. Minha surpresa, eu sabia, estava estampada em minha face.

– Acharam um doador compatível?

Daniel assentiu.

De súbito direcionei-me o olhar para o caixão de Mikaela, que já estava seguindo para o jazigo. Era dela! Eu sabia! Tinha certeza de que Adriel ganharia o coração dela. Ela estava viva e permaneceria por muito tempo... A vida dela salvaria meu Adriel!

Olhei para o céu, sentindo uma leve brisa de outra dose de conforto, e deixei que as lágrimas jorrassem de meus olhos. Toquei no anel do colar, que sempre levava comigo e me alegrei.

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DEBILITADO - Livro 1 [COMPLETO] - Trilogia dos irmãos AmâncioOnde as histórias ganham vida. Descobre agora