capítulo 45

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Elisabeth

Não conseguia reagir. Mal escutava o que ele dizia. A dor me entorpecera no momento em que Dennis exigira ver Malu. Meu corpo já não correspondia ao pânico que dominava meu coração. Era como se eu estivesse sob efeito de um sedativo. Por dentro, eu me debatia e gritava. Por fora, estava imóvel, os olhos grudados na janela, esperando o momento em que tudo aquilo acabaria e eu finalmente encontraria paz.

Se eu pudesse ao menos olhar nos olhos dele. Se ao menos tivesse a chance de ver os lindos olhos do Jughead refletindo o amor que sentia por mim. Uma lágrima desceu pelo meu rosto. Toda a angústia que eu sentia se resumiu em uma simples lágrima.

Não era difícil descobrir o que meu ex-marido estava planejando. Ele queria tornar real o meu inferno. Na sua mão havia um isqueiro. Ele ficava o tempo todo acendendo e apagando, uma espécie de jogo doentio. Jughead não se movia,
talvez sabendo que um passo em falso faria Dennis cumprir sua promessa. Talvez isso não fosse de todo ruim. Eu ainda poderia salvar minha filha e o homem que eu aprendera a amar.

Pelo menos eu morreria por um propósito. Nem todas as pessoas poderiam dizer o mesmo. Fechei os olhos por um instante, a esperança dando lugar ao cansaço. Dennis murmurava palavras incoerentes e eu fazia de tudo para que meu subconsciente bloqueasse sua voz, porque apenas ouvi-lo dizer meu nome me causava nojo. Não fazia a menor ideia de que horas eram e, mesmo que tivessem
se passado apenas minutos, era uma vida inteira para mim. Afinal, ela poderia terminar a qualquer momento.

Levei um susto quando escutei o celular do Jughead tocar. Tentei virar, mas Dennis apertou meu cabelo, impedindo que eu me movesse. Podia sentir o cano
da arma tocar meu couro cabeludo. Ele usava a mesma mão para me segurar e me punir.

— No viva-voz — gritou ele, mais uma vez, depois que Jughead sussurrou algumas coisas no telefone.
— Malu quer falar com você.
Meu coração parou. Não havia a menor chance de aquilo dar certo. Malu mal reconhecia o pai, ela não iria falar com Dennis.— Não! Não! Por favor. — Ele iria machucá-la ainda mais.
— Malu, você pode falar com seu pai agora.

Comecei a gritar, mas Dennis tapou minha boca. Jughead levou o telefone mais perto e a voz ressoou por todo o ônibus. Dennis sorriu e eu senti como se o ar tivesse sido roubado dos meus pulmões.

— Oi, papai. Você está com a mamãe? Dennis começou a chorar e eu ainda não conseguia entender o que estava acontecendo.
— Tô sim, minha filha. Vamos buscar você. Tudo bem? Papai vai buscar você.
Uma longa pausa.
Eu ia sufocar.
— Papai, deixa a mamãe ir embora, por favor? Eu amo minha mamãe, deixa ela vir me ver, papai.

Não havia hesitação ou confusão de palavras. As frases eram claras, e os pedidos, dolorosos de ouvir.
Não era a Malu.
Olhei para Jughead e ele parecia tão surpreso quanto eu.
Senti a mão de Dennis ceder, aos poucos, conforme ele ia falando. Senti um alívio enorme, como se minha cabeça voltasse ao normal depois de pesar cem quilos.

— Filhinha… — Dennis chorava copiosamente. Eu não esperava uma reação tão emocional quanto aquela. — Papai vai levar a mamãe pra você.
— Por favor, papai. Eu amo a mamãe e vou te amar também se você soltar ela.
Naquele momento, a ligação caiu.

— Cadê ela? — gritou Dennis, transtornado, apontando a arma para o Jughead.
— Quero minha filha.
— Você pode voltar a vê-la se fizer o certo. Solta a arma e deixa a Elisabeth ir.
Prometo ficar aqui com você.

— Vocês vão me matar.
— Não — disse Jughead, com firmeza. — Nunca faria justiça com as próprias mãos. Vou assegurar que você volte para a prisão em segurança e, quando o tempo chegar, você poderá ver sua filha de novo.

Podia ver nos olhos do Jughead quanto aquelas palavras estavam custando a ele. Dizer que Dennis voltaria a ver a Malu pôs um brilho diferente em seus olhos. Um que eu nunca tinha visto. Ódio!

Dennis passou o braço pela frente do meu corpo, me abraçando, a arma pendendo de lado. Ele cheirou meus cabelos e enterrou o rosto na curva do meu pescoço.

— Eu não ia te machucar de verdade, meu amor. Só queria que você percebesse que ainda me ama. A gente podia tentar uma última vez. Eu prometo que aquelas coisas nunca mais vão acontecer. Eu aprendi, Elisabeth.

A ironia do que ele dizia quase me fez rir. Suas promessas sempre haviam sido vazias, mas fazê-las enquanto ameaçava tacar fogo em mim era insano.

— Me dê a arma, Dennis — pediu Jughead, com calma. — Depois solta a Elisabeth.
Eu estava muda, a dificuldade de respirar me impedindo inclusive de chorar.

Meu peito se apertou assim que Dennis se afastou e olhou para Jughead. Naquele momento, ou ele me deixaria ir, ou me mataria. Meu coração parou. Jughead tinha uma mão aberta em nossa direção. A mesma mão que um dia ele estendera para mim. Seus olhos estavam em Dennis e eu vi seu rosto suavizar
quando a arma bateu no chão, quebrando o silêncio que nos engolia.

Não acreditei quando Dennis me soltou, e levei alguns segundos até que minhas pernas se movessem. Corri até Jughead. Tudo ao meu redor sumiu e a única coisa que eu via era o homem que eu amava na minha frente, com a mão ainda estendida. Me joguei em seus braços e só então desabei, e comecei a chorar. Jughead me abraçou e eu podia ouvir as batidas frenéticas do seu coração e sentir sua respiração acelerada.

— Você tá comigo.
Foi a única coisa que ele sussurrou. — Elisabeth — disse Dennis. Mesmo com Jughead me puxando, virei. Seus olhos estavam vidrados nos meus
dedos, que agora se entrelaçavam aos do Jughead.

Vi quando seu rosto se
iluminou e ele por fim entendeu que o homem que havia ficado o tempo todo ao meu lado era o que eu tinha escolhido para amar o resto da minha vida.

— Princesa, vamos… — chamou Jughead.
— Eu sempre te amei — declarou Dennis.
— Nunca foi amor, Dennis.

Ele nunca havia me amado. Hoje eu conhecia o amor, e esperava que Dennis um dia conhecesse também. Mas, quando ele levantou o isqueiro, eu tive plena certeza de que ele não achava o mesmo. Sua mão caiu e imediatamente o fogo
subiu.
— Nãããããão! — gritei desesperada.

O fogo crescia cada vez mais, o calor alcançando meu corpo. O pai da minha filha estava queimando, e desabei, porque, na verdade, sempre achara que ele poderia mudar. Acreditara até o final que ele poderia ser diferente. Fui arrastada para fora e, assim que saí, Jughead me pegou nos braços. Enquanto ainda olhava para as chamas destruindo tudo, a única coisa em que pensava era na ironia no destino.

— Pede pra esperar. Preciso pegar esse ônibus.
A cena voltava à minha cabeça enquanto pessoas gritavam ao redor. Diego dizia alguma coisa, mas não consegui ouvir. Na minha mente só havia a imagem do menino de cabelos cacheados que um dia eu amara.
Você é a Elisabeth, né?
Não consegui controlar a dor que rasgava meu peito.
Por quê, Dennis?
Por quê?
Querem dar o fora do corredor?
— Você ouviu, garota bonita, vamos lá.
Minha história com o Dennis terminava no mesmo cenário onde começara.

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