capítulo 6

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PRESENTE

Elisabeth

Depois de almoçar, me sentei entre as caixas no depósito e aproveitei o restante do tempo livre para descansar as pernas. O dia havia sido estressante,
e me sentia prestes a desabar sobre uma mesa aqualquer momento, de tanto cansaço. Estremeci só de pensar que ainda tinha que enfrentar um longo tempo para chegar em casa. Queria ter encontrado algo mais perto, mas foi o primeiro
trabalho que apareceu, e eu não podia recusar..

Tirei o celular do bolso do avental para verificar as horas, mas tudo que consegui fazer foi olhar para a foto do descanso de tela. Malu estava tão sorridente que imediatamente meus olhos se encheram de lágrimas. Momentos assim eram raros em nossas vidas nos últimos tempos. Tirara essa foto dias antes de tudo acontecer. Estava confiante de que, depois de duas tentativas,
dessa vez ele realmente me deixaria em paz. Engano meu. Assim como meenganara quando, na primeira vez, ele prometeu que nunca mais gritaria comigo ou me impediria de fazer alguma coisa. Assim como me enganara na segunda vez, quando ele disse que havia sido um acesso de fúria e que nunca mais tocaria em mim.

Minha vida podia ser resumida em um monte de enganos.
Ainda olhava para o celular quando Carlos apontou a cara na porta, mechamou e entrou.Meu primeiro instinto foi de dar dois passos para trás, por medo de ficar sozinha com um homem de novo, mesmo ele sendo meu colega de trabalho. Carlos ainda era um garoto, mesmo assim eu não conseguia controlar o pavor que parecia nascer dos meus ossos e correr pelas minhas veias.

Ele parou a poucos metros de mim antes de avisar:— Elisabeth, tem alguém procurando por você.
No mesmo instante, meu corpo inteiro se retesou. O pavor que tentavadiariamente trancar dentro de mim aflorou, e sabia que qualquer pessoa que me visse naquele momento pensaria que eu estava tendo uma crise de pânico.

Os olhos de Carlos se arregalaram e não me preocupei mais com sua presença, mas sim com quem poderia estar me procurando.—Ele disse o nome?

Demorei longos segundos para fazer a pergunta e me surpreendi por conseguir formar uma frase completa, pois só conseguia pensar nas alternativas defuga, mesmo sentindo como se as minhas pernas fossem de gelatina.

O problema do medo é este: é incontrolável. É algo que nasce no seu interiore simplesmente explode, sem que você consiga raciocinar a coerência disso
tudo.Primeiro você sente, e só depois descobre porque está sentindo.

—É um oficial de justiça.
A sensação de alívio que sua resposta causou foi inevitável. Às vezes acreditava que nunca sairia desse limbo de sofrimento. Mesmo depois do
inferno,continuava amargando as consequências dos meus enganos.

Carlos continuou me encarando e eu agradeci antes de segui-lo para fora.Meu colega mostroua mesa um pouco afastada,e pude ver o homem que me aguardava. Ele usava um terno escuro, carregava uma pasta nas mãos e eu tinha uma leve ideia do que estava fazendo ali. Cumprimentei-o assim que me aproximei osuficiente, e ele estendeu um papel na minha direção.

— A senhora está sendo intimada a comparecer ao fórum na data citada,para uma audiência de instrução e julgamento. Assinei, e o oficial saiu sem olhar para trás. Fiquei me perguntando se ele guardava todos os rostos das pessoas que visitava, ou se conhecia o problemade cada uma delas. Olhei para o papel que continha data e hora marcadas e tremi apenas ao imaginar que ele pudesse estarlá. Não! Isso não ia acontecer.

Ele era covarde demais e com certeza ia continuar se escondendo. Guardei a
intimação na bolsa, junto com outros papéis que tinha que manter comigo. Um
deles atestava as medidas protetivas que conquistara dias depois de ter registrado o boletim de ocorrência. Lembrei da reação que tive assim que li o documento. Sorrie depois chorei.

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