- Mas estou... - disse calmamente aproximando-se novamente no jovem. - Eu já sei, você nunca esteve com uma mulher antes, não é verdade.

Calisto sentia o coração acelerado, transpirava e estava excitado além da conta. Afastou-se dizendo, - Por favor, princesa. Desculpe-me, mas devo dizer que sua visita, e seu comportamento são inadequados.

Comprimindo os olhos, Hana aproximou-se ainda mais, pressionando Calisto contra uma parede. - Você está tão tenso, e é um rapaz tão lindo. Você precisa aprender a relaxar um pouco.

Calisto estava ofegante, a um passo de se entregar. Sentia o calor e o perfume da mulher confundindo sua mente. Trocando a ordem dos pensamentos. A razão. Precisava salvar-se através da razão. Tinha ainda na consciência, que se avançasse, poderia por tudo a perder. No entanto, não era capaz de comandar seu corpo, não conseguia reagir. Quieto por uns instantes, sentiu passivo o toque da princesa e a umidade de seus lábios contra seu rosto. A princesa tentava beijá-lo na boca, mas Calisto resistia com suas últimas forcas sendo capaz apenas de virar o rosto.

Pronto a pôr tudo a perder, agarrou-se a uma ideia. Lembrou-se de Weiss. Sim, o monstro era o único capaz de salvá-lo. Apertou os punhos, sentido com as pontas dos dedos, as cicatrizes em ambas as mãos. Um garfo e uma faca que o deixaram preso a um portal, há poucos dias em Kamanesh. A memória da dor e humilhação trouxeram-lhe a ira e força que precisava para se livrar da perigosa princesa Hana. Segurou-a na cintura e empurrou-a com violência. Perdendo o equilíbrio a princesa caiu no chão sentindo-se humilhada. Apesar da humilhação, controlou-se. Era paciente e ainda sentada no chão disse com rancor. - É uma pena... Você teria adorado me ter ao seu lado. - Levantou-se preparando uma nova investida. - Poderia ter sido sua amante e aliada, poderíamos ascender ao trono juntos, um dia. Por que me rejeita? O que teme? - Sua voz ficou embargada e seus olhos cheios de água. - Será que eu não sou bonita o suficiente para você?

Calisto mordia os dentes, usando a ira contra Weiss para obter forças e quebrar o feitiço de Hana. Sem separar os dentes disse irado, - Pare de mentir sua prostituta de sangue azul! Não vou ser dominado por você, entendeu? Você não vai me usar. Nunca permitirei.

Hana jogava pesado e continuou com sua investida. Ao prantos disse, - Oh! Como você é cruel! Você fere meu coração, cheio de amor. Oh, Lorde indigno de meu amor, perdoe-me. Saiba que não desistirei. Tive um sonho, e nele estávamos juntos, governávamos juntos tudo o reino, fazíamos uma bela campanha, dominávamos todos os povos. Sua beleza, eternamente conservada. De rei e rainha, o nosso destino foi evoluir para imperador e imperatriz de um império de muitos reinos, de tudo que há sobre essa terra. Meu amor é fiel e não desistirei.

Calisto ficou perplexo ao escutar as palavras de Hana e antes que pudesse falar alguma coisa, Hana correu e se atirou da sacada. Sentido o ódio por Weiss afinar, voltou a ficar um pouco confuso. E pensava, "Eu imperador de tudo que há? Isso parece uma loucura..." Loucura, repetiu Calisto mil vezes. De certo, a bruxa operava algum feitiço sobre ele. Se perguntava se era realmente um feitiço. Inquieto e sem sono, deparou-se com o grosso volume em cima da escrivaninha. "A história de Sir Kaladar e Magneli." Sem conseguir dormir, e com a cabeça cheia de perguntas, Calisto resolveu ler o romance que a Rainha Alena lhe emprestou naquela tarde.

Chegava a tarde do terceiro dia hospedado na torre oeste do novo castelo de Lacoresh. Sabendo do costume da Rainha de fazer um passeio pelos jardins naquele período, Calisto desceu de seu quarto na esperança de encontrá-la.

Nos jardins, havia um lago em particular que a Rainha gostava muito. Costumava alimentar os peixes, e por vezes chorava. Eram muitas as memórias de seu pai, mãe e irmãos, mortos. Era a única da família a sobreviver ao grande ataque à cidade de Lacoresh há cerca de um ano e meio. Fora chamada de "A noite dos mortos". Justamente quando houve uma grande saída das tropas defensoras da capital, para retomar a cidade de Grey, houve um ataque horroroso e inesperado. Uma noite que nunca se apagaria da memória da jovem Rainha. Como por milagre, teve sua vida salva pelo seu atual enteado, Serin e pelo mago Alexanus, que visitava o antigo castelo na ocasião. Em menos de um mês, casava-se com o Arquiduque Maurícius, primo de seu pai e tornava-se a rainha de um reino abalado por uma cruel guerra contra as criaturas bestiais, vindas dos pântanos cinzentos de Yersh.

Os peixes que alimentava, eram os mesmos de uma fonte no antigo castelo. A seu pedido, a estátua antiga da qual jorrava água também fora trazida. O antigo castelo, agora decadente, transformara-se numa prisão, e aquela nova fonte, e seus peixes, eram um forte símbolo para a rainha Alena.

- Uma bela tarde, não é mesmo majestade? - aproximou-se Calisto, cortês

- Ah, Lorde Calisto. - sorriu a rainha.

Calisto observou-a. Bonita, vestia uma peça simples, azul clara, porém bem trabalhada. Usava pulseiras de ouro e um colar de jóias, que poderia comprar vários navios. Tinha um cesto pendurado no braço esquerdo. O sorriso da rainha atrapalhava ligeiramente a linha de raciocínio do rapaz.

Após um breve silêncio, e um sorriso retribuído e inconsciente de Calisto, ele disse, - Vim agradecer pelo romance que me emprestou, gostei muito.

- Já o leu? Todo? - a jovem rainha estava surpresa.

- Sim. Tive dificuldades para dormir, e o livro me fez boa companhia até o alvorecer.

- Sim, percebo que está um pouco abatido. O que houve, algum problema?

- Muita agitação, Majestade. Mas hoje, de certo dormirei bem. Novamente queria agradecer pelo livro. É ótimo!

- Que bom que apreciou.

- Sim, fez me perceber que posso livrar-me de preocupações, fugir um pouco da realidade.

- Entendo. A nobreza, às vezes é um fardo, caro Lorde. Bons livros ajudam a viver melhor.

- E por isso lhe serei eternamente grato, Majestade. Ensinou-me algo de valor.

- Posso lhe oferecer mais alguns volumes? Você os leva para sua propriedade, e, se puder, escreva-me dizendo se gostou.

- É muita bondade sua majestade. De fato, gostei muito da História de Sir Kaladar e Magneli. Um pouco triste eu diria.

- Sim. Alembrel, sempre conta histórias tristes, muitas tragédias. Assim como na realidade. - Neste momento os olhos de Alena ficaram aquosos. Lembrou-se de sua própria tragédia, a perda de sua família.

- Sente-se bem, majestade? - Calisto ofereceu-lhe um lenço.

A rainha enxugou as lágrimas antes que pudessem sair e comentou. - Nada, Lorde Calisto. Apenas lembranças de minha família.

Calisto ficou constrangido. Percebeu que a rainha não desconfiava que os responsáveis pela morte de sua família estavam à sua volta, incluindo o próprio rei. Teve pena dela e de seu sofrimento genuíno. A primeira vez em toda sua vida que teve compaixão por alguém. Um sentimento totalmente novo que Calisto não pôde entender.

- Sinto muito pelo ocorrido. Uma grande tragédia.

- Não se preocupe, já me sinto melhor. - Olhou à sua volta procurando algum observador. Apenas alguns criados estavam por perto. Disse baixo, - Por favor, Lorde Calisto, lembre-se de me escrever. Sinto-me tão só neste castelo, todos estão sempre são ocupados. Tenho poucos amigos e amigas que apreciam a literatura. Gostaria muito de ter alguém para conversar sobre livros e autores.

Calisto instintivamente aproximou-se. - Mas é claro Majestade! Para mim será uma honra. Sinto-me lisonjeado por sua atenção.

A rainha corou e sentiu-se constrangida. Dando um passo para trás disse, - Devo me recolher. Adeus, Lorde Calisto.

- Adeus Majestade, e novamente lhe agradeço!

Calisto observou satisfeito a rainha seguir em direção ao castelo. Pensava, "Isso vai ser fácil! Pobre rainha... Quando destronar o maldito Maurícius e eliminar seus ridículos herdeiros, darei a você, Alena, a atenção que merece. O maldito velho nem mesmo pode tê-la como mulher, assassinou o primo e casou-se por puro interesse no trono. Maldito calhorda! Vou lhe mostrar quem é o mais forte! Vou mostrar a todos quem é o mais forte, incluindo àquela prostituta da Princesa Hana".

Maré VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora