– Hmm... – Noran observava o rapaz e surpreendia-se a cada instante. –Talvez se você compartilhasse alguns de seus pensamentos, quero dizer, deixe-me ver esses sons e imagens, prometo que serei cauteloso.

– Certo.

– Apenas relaxe e medite profundamente.

Noran aguardou uns instantes e percebeu que Kyle meditava profundamente antes do que esperava. Teceu cuidadosamente o contato entre suas mentes e percebeu uma voz distante. Uma voz do passado. Estava abafada e bloqueada. Abriu os olhos da mente viu uma série de manchas negras. Forçou a passagem e recolheu as manchas viscosas. Seu coração acelerou e percebeu o traço do objeto que quase o matou, o Orbe do Progresso. Estava ali, diante de si, quase imperceptível, a obra de Rodevarsh. Lembrou-se de quando mergulhou na mente de Kyle e da luta que tiveram contra um lobo negro de olhos vermelhos e brilhantes. Sim, era algum resíduo daquele feitiço. Agora fazia sentido, era um feitiço lançado pelo Orbe do Progresso para fazer alguma coisa com a mente de Kyle. Mas o que?

O muco negro parecia fácil de remover, talvez porque estivessem longe do Orbe, imaginava Noran. Ao poucos escutava a voz que tentava falar. Escutou uma linda voz dourada de uma mulher dizer, – Calma, eu vim para buscá-lo. Já é hora...Fique calmo, tudo vai dar certo. Quem é você? Não lhe desejo mal, apenas vá! O que? Não... Não... Você não deve fazer isso. Ahhhhhhhhh! – Era uma seqüência de frases que não faziam sentido por completo. Pareciam parte de um diálogo. Um nome então veio à tona: Lila. Quem seria Lila? Sim. Fazia algum sentido. Lila, seja lá quem fosse fora atacada por Rodevarsh apoiado pelo Orbe do Progresso. Noran assustou-se, num instante viu com os olhos da mente o corpo de Kyle ser revestido por uma estranha chama de brilho azulado e com isso perdeu seu contato. Ao observar Kyle no plano físico, percebeu que todos os pelos de seu corpo estavam arrepiados.

Kyle despertou e constatou, – A mesma sensação.

– Que sensação? – quis saber Noran.

– De quando lutei contra o Cavaleiro Roi na estrada para Lacoresh.

– E então? Descobriu alguma coisa?

– Sim. – E Noran contou-lhe sobre o que descobrira sobre o lobo negro e o Orbe do Progresso. No final mencionou o nome Lila. Perguntou se esse nome tinha algum significado especial. Kyle fez que não.

***

– Como pode ter essa certeza? – Indagava Shark desconfiado.

– Acredite em mim, sei do que estou falando. – retrucou Fernon confiante.

– Mas isso é loucura, ou melhor, é suicídio!

– Pois sim, chame os Lacoreses de loucos, mas acredite-me. Eles virão e será esta noite.

– Talvez você esteja certo Fernon. Talvez eu os tenha subestimado. Afinal, afundaram um navio de Madame Lefreishtra. Se quiserem suicídio, podemos oferecer-lhes as lâminas, não é mesmo? – E sorriu. – Será divertido! Minha irmã Hyunda chegará esta tarde. Podemos armar um belo espetáculo. Estou certo de que ela irá adorar. – Shark riu e seu riso transformou-se em uma terrível gargalhada enquanto deliciava-se com as idéias cruéis que surgiam em sua mente.

***

A noite chegava novamente. Zoros, o feiticeiro Sílfico do navio de Melgosh observava o céu preocupado. Lia sinais e comparava a posição das luas. – Estou lhe dizendo senhor, não é prudente atacar Shark.

Melgosh parecia preocupado e tentava imaginar por que razão estaria fazendo coisa tal. – Eu sei. Isso não é nenhuma novidade.

– Pois sim, senhor! Escute-me, há sinais terríveis nos céus. E as luas...

– Vamos Zoros, pare com esse mau agouro. Pense no seguinte. Se você trabalhasse para Shark e observasse o céu, o que lhe diria?

Zoros sorriu. Resolveu mudar de estratégia. – O senhor sabe, as autoridades toleram disputas comerciais como as suas e de Madame Lefreishtra. Sabe que casas rivais afundam navios e eliminam vidas preciosas por vez ou outra. Mas uma ação como estas? Não consigo ver uma justificativa razoável para não classificá-lo como um fora da lei. Após essa insensatez o senhor será perseguido, não haverá mais sossego!

– Entendo sua preocupação meu amigo.

– Pois então meu senhor, escute-me! Deixe essa loucura de lado enquanto ainda há tempo.

– Mas se Sinevall...

– Por favor meu senhor, esqueça Sinevall!

– Zoros! – disse Melgosh irritado pressionando os lábios. – Essa história de meu senhor já está passando dos limites! Ordeno-lhe que me chame de Melgosh!

– Sabe que não posso senhor. Minha dívida e minha educação... Mesmo tentando eu não consigo.

– Pois tente!

– Não senhor... Depois de tantos anos! Castigue-me se desejar...

– Castigar-lhe? É um louco Zoros! Castigar-lhe por me tratar respeitosamente?

– Mas se lhe irrito...

– Pare de choramingar, seu velho safado! Não entende? Depois de tantos anos, depois que perdi tantos companheiros... E você! Sempre fiel, sempre a me auxiliar. Só queria que pudesse me tratar como igual, que pudéssemos ser como amigos.

– Nunca senhor! Nunca! O senhor é mais que um amigo. É como um pai para mim. Mesmo tendo idade para ser meu filho. O senhor me acolheu, tirou-me da desgraça, salvou minha vida quando pensei que a perdera.

– Eu entendo Zoros. Fico feliz por você ainda estar por perto.

– Então senhor, eu lhe imploro. Desista disso. Explique para sua filha. Faça por sua filha.

– Chega Zoros! Eu já estou decidido. Vou fazer, a partir de hoje, tudo que sempre quis!

– Mas será banido! Não haverá para onde irmos!

– Sempre há lugar para nós em Shind, e você sabe disso. E além disso...

Zoros olhou para os céus novamente. – Eu sei.

– Pressinto algo grande acontecendo em breve. Alguma coisa vai mudar, sei disso. O imperador está negligenciando ações como as de Shark, e do Duque marítimo Hiokar. Os Hiokar são perigosos... Se chegarem ao poder, tudo mudará. O pouco de moderação que ainda há em nosso povo acabará, e então... só consigo pensar no pior.

Zoros acenou positivamente, pensativo.

Melgosh tinha um semblante sombrio e sua voz expressava preocupação. –Entende o porquê de minha ação? Tenho que agir, especialmente agora, com minha filha de volta. Isto faz com que meu sangue ferva. Precisamos agir Zoros. Precisamos fazer alguma coisa antes que seja tarde.

– Meu senhor! Talvez... talvez... eu, eu, devesse contatar meu, meu...

– Seu irmão! Diga o que pensa de uma vez, velho amigo!

S..sim, sim... Meu irmão Zoroastehf...

Maré VermelhaWhere stories live. Discover now