Tempos Sombrios

807 97 11
                                    

Ellie havia percebido, depois de um dia inteiro testando magia com diferentes elementos, fogo, terra, ar e água, que tinha uma maior afinidade com o elemento água.

Niara lhe dissera que as bruxas sempre tinham maior facilidade com um tipo específico de elemento e que era importante descobrir qual era. Por isso, Ellie se sentara de frente para uma vela, uma vasilha contendo água e um montinho de terra.

Com o fogo, quase incendiara todo o bosque que as rodeava, se não fosse a ação rápida da bruxa que a supervisionava. Utilizando o ar, tudo o que conseguira fora criar um fraquíssimo sopro que não faria nem mesmo uma pena flutuar. Com a terra, o que conseguiu fazer foi sujar suas vestes e seu cabelo com partículas do solo ao seu redor que praticamente explodiram em sua cara quando ela tentou manipula-la.

Mas foi substancialmente melhor sucedida com a água, embora não tivesse sido perfeita. Ellie conseguiu fazer uma bolha de água flutuar doze centímetros acima da vasilha de vidro antes de explodir e cair novamente no recipiente. Conseguiu até mesmo congelar a água quando segurou a vasilha.

– Me parece que você é boa com o gelo. – Niara comentou.

– Acho que eu sou mais descontrolada com o gelo, na verdade – Ellie pensou no homem que congelou até a morte e depois em seu quarto. Niara conseguiu desfazer o estrago que ela fizera no cômodo, mas Ellie tinha a certeza de que não conseguiria fazer sozinha.

– Você é forte, Ellie. Precisa apenas aprender a amenizar um pouco sua força.

Assim que Niara a deixou sozinha, Ellie ficou repetindo o mesmo exercício, fazia uma bola com a neve que a rodeava com magia, depois a desfazia, fazendo com que ela ficasse em sua forma líquida, então, transformava a água novamente em neve. Niara havia lhe dito que repetição poderia ser uma forma de deixar Ellie familiarizada com a sensação.

Quando voltou para a cabana, com a saia do vestido imunda de lama, tirou as roupas sujas no quarto e foi tomar um banho. Enquanto estava na banheira de água perfumada, ela movia os dedos para cima, erguendo uma bolha de água e depois a devolvendo a banheira.

Seu progresso era ridiculamente lento, considerando qual era seu dever. Deter Salvatore Lex, como a Magia havia lhe dito. Mas como faria isso sem a ligação com Vincent, um feiticeiro tão poderoso como Salvatore? Como faria apenas criando bolhas de água?

Ela afundou mais na banheira e fitou o teto do quarto, que tinha aquela pintura realista de um céu no crepúsculo, as nuvens arroxeadas, e o manto celeste intercalado nas cores amarela, laranja, rosa e roxo. A pintura era mágica, porque mudava de acordo com o horário do dia em que estava. Foi Vincent quem fizera, porque aquele era o quarto dele.

Não pela primeira vez desde que o laço foi rompido, ela tentou novamente alcançar Vincent de algum jeito, pensando nele, em seu cheiro, rosto, até mesmo no beijo. Pensar nos lábios de Vince tocando-lhe os seus fazia com que ela ruborizasse instantaneamente e sentisse o corpo todo quente. Tinha desejado aquilo durante muito tempo, sequer tinha percebido antes, mas quando aconteceu foi como se tudo dentro dela se agitasse em pura catatonia.

Mas nada daquilo foi real, Ellie percebia agora. Vincent apenas a beijara para que a deixasse vulnerável, para que pudesse romper a ligação, apenas isso. Não significou nada para ele.

Aquilo rasgava o peito dela, a dor era insuportável e ela podia se sentir estilhaçar. Então, aquilo era um coração partido? Doía mais do que ter a coxa rasgada por uma garrafa quebrada, mais do que um soco no rosto, mais do que todos os tapas furiosos que seu pai tivesse lhe dado. Porque ela nunca amou seu pai, mas amava Vincent. E ele a feriu.

June não podia acreditar no que seus olhos viam. Era real, ou era apenas uma ilusão?

O castelo se erguia bem diante dela, com suas pedras beges envelhecidas, os telhados vermelhos escurecidos pelas chuvas durante décadas, a hera que cobria suas paredes como se as tivessem engolindo, as janelas de vidros limpos refletindo a luz fraca do sol que se esgueirava através de esparsas nuvens. As faias estavam novamente ali, erguendo-se imperiosamente rodeando o caminho de pedra que levava a entrada do castelo.

O FeiticeiroWhere stories live. Discover now