A nossa vez

By Tay-SS

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Tudo parecia acontecer rápido demais. Uma traição, o divórcio, e um teste de gravidez dizendo positivo. Isso... More

P r ó l o g o
U m
D o i s
T r ê s
Q u a t r o
C i n c o
S e i s
S e t e
O i t o
N o v e
D e z
O n z e
D o z e
T r e z e
Q u a t o r z e
Q u i n z e
D e z e s s e i s
D e z e s s e t e
D e z o i t o
D e z e n o v e
V i n t e
V i n t e e U m
V i n t e e d o i s
V i n t e e t r ê s
V i n t e e q u a t r o
V i n t e e c i n c o
V i n t e e s e i s
V i n t e e s e t e | P e d r o
V i n t e e o i t o | Pedro
V i n t e e n o v e | P e d r o
T r i n t a
T r i n t a e u m
T r i n t a e dois
E p í l o g o

T r i n t a e t r ê s

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By Tay-SS

Sugestão de música: To build a home - The Cinematic Orchestra (ouçam essa música)

Tapei o sol com as mãos e fechei os olhos sentindo o vento bater no meu rosto.

Pedro olhou pra mim e beijou minha bochecha enquanto sorria.

— Eca! — Duda tapou os olhos e sujou as bochechas de terra.

Dei risada olhando e ela tentou limpar sujando ainda mais.

— Meu Deus do céu Eduarda, vamos lavar isso. — Pedro chamou ela e sorri observando os dois.

Os dias agora estavam começando a ficar ensolarados e quentes, decidimos plantar as flores que a mamãe deu, mas estava sendo mais desastroso do que bom.

Eu ficava cansada toda hora, o que em partes era normal, mas eu estava um pouco preocupada, ainda estava no começo do oitavo mês e me sentia um peso gigante que não consegue fazer nada... além de que as tonturas haviam voltado, mas eu ainda não tive coragem de falar pra ninguém pra não preocupa-los.

— Mamãe, você não vai ajudar a gente?! Você tá sentada aí tem um tempão! — Duda chamou correndo de volta pro buraco que tinha aberto.

Levantei do degrau quase morrendo e andei na direção observando as sementinhas plantadas, algumas estavam tão mal cobertas que ainda dava pra ver.

— Vem, a mamãe vai te ajudar a colocar mais terra, senão o sol vai secar elas e não vai germinar pra crescer. — Falei pegando mais terra e jogando encima. — Eita, seu irmão tá agitado.

Sua mãozinha suja de terra foi parar encima do meu vestido e fiz uma careta mas sorri mesmo assim, ele estava agitado e as dores no pé da barriga tinham começado.

Na consulta de rotina da semana passada a Nancy disse que ele já estava grande, e estava tudo certo, tentei falar sobre as tonturas mas o Pedro estava junto e isso complicaria as coisas... mas não era nada, elas eram fracas e não faria mal, era isso que eu esperava.

— Será que ele quer me ajudar a plantar também?! — Ela perguntou e sorri. — Quando ele vai poder me ajudar mãe?

— Daqui pouco tempo... bem pouco tempo. — Passei a mão na sua bochecha.

Vi ela repetir o que eu fiz nas sementinhas, fiquei observando e senti o Pedro me abraçar de lado.

— Ela cresceu tanto que as vezes me dá medo de pensar como vai estar daqui um ano. — Ele falou e assenti. — Esses dias estávamos conversando e ela me disse que um menino puxou o cabelo dela na escola e agora eles se odeiam... tem alguma chance de se tornarem namorados futuramente?!

— Para de ser paranoico Pedro. — Fiz uma careta encarando ele. — Mas as vezes isso me preocupa também, o tempo tá passando tão rápido, as vezes sinto medo de perder ela ou algo do tipo... quero congelar o tempo pra sempre.

Senti uma leve tontura e fechei os olhos respirando fundo pra passar, abri novamente e ele me encarava com a sobrancelha erguida.

— Amor você tá bem, não tá? — Ele perguntou mordendo os lábios. — As vezes eu vejo você se apoiando nas coisas, fechando os olhos e... você não tá sentindo as tonturas, né? Me diz que não Maju.

— Não tô. — Menti segurando seu rosto. — Eu to bem, vai dar tudo certo.

Um sorriso se formou, mesmo que ele não tivesse acreditado em mim. Me senti culpada por não contar, mas eu sabia como ele era preocupado e iria fazer um escândalo por nada.

Desde aquele dia as coisas tinham melhorado, ele tinha se mudado pra casa, contamos pra Duda que estávamos juntos... foi meio embaraçoso mas o pior de tudo foi ela dizer que já sabia, do jeito dela pensar é claro, mas sabia.

— To pensando em dar um gato pra ela... toda vez que ela vai na casa da sua mãe fica atrás da Maggie, o que você acha?! — Mudei de assunto e ele ergueu a sobrancelha. — Ah Pedro qual é, não é só porque você não gosta de gatos que ela não pode ter um, e outra, que ser humano no mundo não gosta de gatos?! Você é péssimo.

— Eu nem disse nada! — Ele deu risada. — Mas bom, eu já tinha pensado nessa ideia, depois que o Rafa nascer a gente pensa nisso... e falando em Rafael, durante a noite as vezes eu sinto ele mexer quanto coloco a mão encima da sua barriga, os chutes dele não doem??!

— Muito... parece que ele vai rasgar minha barriga a qualquer momento. — Cocei a barriga e me repreendi. — Você ainda vai me amar quando eu estiver um lixo, gorda e acabada depois que ele nascer?

— É claro que vou te amar Maria Júlia. — Pedro revirou os olhos. — Eu vou te amar de qualquer jeito.

— Acho que acabei, o que eu faço?! — Duda falou e encarei o chão torcendo os lábios.

A mamãe surtaria se visse isso... mas eu acho que dava pra salvar.

— Agora é só molhar... todos os dias até elas crescerem. — Pisquei e ela correu pegando o regador.

— Achei vocês. — Isabel entrou pela porta e arregalei os olhos pelo susto. — Chamei lá na frente mas ninguém abriu e... a Duda não tá mexendo com terra, está?!

Assenti vendo as meninas entrarem e ela fazer uma careta de desespero. As duas mal olharam pra gente e já correram pra terra.

— Céus, eu vou entrar antes que tenha um treco. — Ela sussurrou vendo as três enfiarem a mão na terra e sorri.

Segui ela até a sala e vi uma caixa embrulhada de papel de presente.

— Eu sei que vai fazer o chá de bebê do Rafael, mas não quis esperar... eu achei muito fofo e quis comprar, ser tia é isso né? Se não tomar cuidado vamos ficar pobres. — Ela riu e abri a boca abrindo a caixa.

Dentro tinha uma luminária e um quadrinho com o nome "Rafael" e um ursinho costurado dentro.

— Isso vai ficar lindo no quarto dele Isa! Eu amei. — Abracei ela enquanto segurava os presentes. — A gente finalmente terminou tudo, ainda falta um mês, agora são só as roupinhas e as fraudas.

Subi a escada enquanto ela e o Pedro me seguiam. Nós mantemos o guarda-roupa e comprados um berço que virava uma cama... era melhor porque quando ele crescesse não precisaríamos gastar mais dinheiro.

Algumas decorações estavam chegando aos poucos, tínhamos colocado uma cortina e comprado uma cômoda pra colocar as coisas encima... eu acho que não precisava de mais nada.

Coloquei a luminária azul encima do criado mudo do lado do berço e pensei em onde colocar o quadrinho.

— Encima do berço vai ficar perfeito. — Sorri medindo e ela assentiu.

— O quarto ficou lindo. — Isa falou tocando o berço.

— A ansiedade tá cada vez maior... imaginar ele dormindo no berço, mamando, eu quero tanto ver seu rostinho. — Pedro sorriu encarando minha barriga.

— Eu também Maju... espero que dê tudo certo dessa vez. — Ela tocou minha barriga e estremeci imaginando como seria se as coisas não dessem certo. — Eu vou mimar tanto esse neném.

— Assim espero. — Abracei ela de lado.

Passamos a tarde conversando enquanto o Pedro cuidava das crianças, o Léo estava na casa da mãe, ele ia entregar o convite do casamento pra eles.

— Vai ser daqui dois anos, eu sei... mas a gente já tá planejando tudo, acho que vamos nos casar na praia. — Isabel deu de ombros e abri a boca surpresa.

— Na praia?! Misericórdia, nossos filhos vão se comportar pra isso? — Perguntei rindo e ela negou se lamentando.

— Mas vai ser na praia de São Francisco, uma coisa bem simples, e depois a gente viaja ou sei lá... não quero muito, só quero que seja algo pra gente lembrar que tá junto, eu não imaginava que depois de tudo que passei encontraria o amor da minha vida, graças a você. — Isabel sorriu segurando minha mão. — De verdade Maju, obrigada, se não fosse por ele ser seu amigo talvez nunca tivéssemos nos conhecido.

— Desde o momento em que vocês flertaram eu sabia que iria dar em algo. — Dei de ombros piscando. — Acho que nenhuma de nós duas imaginava nada, só deixamos a vida levar e conseguimos... e graças a Deus porque eu não aguentava mais.

— Você tá bem né? Não sentiu nada? Lembro que você começou a piorar depois do oitavo mês. — Isa perguntou e engoli em seco. — Você está bem inchada, não é muito normal isso.

— Dessa vez está tudo bem. É normal sim, a doutora disse. — Menti sem conseguir sorrir, isso estava me preocupando cada vez mais.

— Que bom amiga, eu rezo pra que dessa vez tudo seja melhor... já deu pra ver pelo seu sorriso que está sendo. — Ela falou levantando. — Tenho que ir, amanhã eu vejo se dá pra dar um pulinho aqui.

Fomos até o fundo e encontramos o Pedro todo sujo de terra enquanto as meninas se divertiam, elas estavam esfregando terra nele e brincando de salão de beleza.

— Sua esfoliação está pronta papai. — Duda sorriu esfregando mais um pouquinho. — Agora tem que lavar... — Ela falou indo pegar a mangueira.

— Opa pode parar!! — Isabel falou ainda perplexa. — A gente precisa ir embora meninas, lavem a mão antes que eu tenha um treco.

— Você disse que ia ter um treco há uma hora atrás mamãe. — Lua revirou os olhos e segurei a risada.

— Eu tive, mas agora vou ter outro se não me obedecerem!! — Ela quase berrou e as meninas levantaram indo se lavar na mangueira. — Vai ter volta Pedro, você vai ver.

— Qual é Isabel, só uma sujeirinha de nada, nem da trabalho pra lavar. — Ele zoou e ela semicerrou os olhos.

— Tchau meninas... — Acenei enquanto elas saiam.

— Tchau, depois a gente brinca mais!! — Pedro berrou e olhei torto pra ele.

— Eduarda, as vezes seu pai é mais criança que você. — Falei balançando a cabeça e entrando.

Sentei no sofá sentindo minhas costas reclamarem, meus pés estavam inchados e eu me sentia uma bola de gordura.

— Vou dar banho na Duda, e depois tomar. — Pedro falou e abri os olhos.

— Por favor.

Depois dos dois tomarem banho, jantamos e a Duda dormiu. Eu estava morrendo de sono, mas estava sentindo um mal estar horrível, não conseguiria dormir.

— Ainda sinto cheiro de terra em mim. — Pedro falou sentando do meu lado e cheirei seu braço rindo. — Quer uma massagem?!

— Ah com certeza eu quero. — Sorri virando as costas pra ele.

Ele começou a fazer a massagem e fechei os olhos quase dormindo com aquilo, suas mãos me provocavam arrepios.

— Você não tem ideia do quanto to me segurando. — Pedro sussurrou beijando meu ombro.

— A gente ainda pode fazer isso... você sabe. — Falei de volta e ele me deu um leve mordida.

— Não amor, eu sei o quanto foi cansativo pra você hoje... e sei que agora o que você mais quer é conseguir ter uma noite de paz. — Pedro falou e virei de frente pra ele.

— É por isso que eu amo você. — Beijei seus lábios e em seguida abracei ele.

Fomos deitar e como sempre passei a noite toda acordada, a barriga me atrapalhava dormir, e uma leve dor no pézinho dela tinha começado a ficar mais forte... eu sempre pegava no sono quase perto da hora de acordar.

— Bom dia amor, acorda... Já fiz o café e acordei a Duda. — Pedro falou e resmunguei. — Nem adianta reclamar, você quem quis continuar trabalhando.

— Não precisa jogar na minha cara sempre, sabia? — Falei e ele revirou os olhos entrando no banheiro.

Assim que levantei senti minha visão ficar turva, me escorei na cama e dei graças a Deus por ter passado rápido.

Arrumei a cama e me troquei, percebi que algumas estrias tinham aumentado ainda mais... merda, demorou mil anos pra eu conseguir tirar as que ganhei da Duda, e agora voltaram.

Desci a escada e encontrei ela tomando café parecendo uma mocinha.

— Mamãe, as panquecas do papai são melhores que as suas. — Duda falou e ergui a sobrancelha.

— Hmmm... é bom que seja mesmo, porque ele vai fazer isso por um bom tempo. — Sorri pegando uma.

Uma dor de cabeça tinha começado bem leve... hoje era um daqueles dias horríveis em que você só desejava deitar de novo e dormir até o parto.

— Vocês estão atrasadas. — Ele entrou na cozinha olhando o relógio.

Nos apressamos pra sair, ele tinha inventado de que era melhor irmos juntos, de carro, porque ele tinha medo de eu cair e minha barriga estourar... as vezes ele imaginava coisas tão idiotas que eu acabava ficando paranóica.

— Sabe o que eu estava pensando?! — Ele falou assim que entramos no carro e o encarei. — Da gente dar uma voltinha no parque esse final de semana, o que acham?!

— Eu quero!! — Eduarda foi a primeira a se manifestar.

— Acho que o Rafael vai gostar... os dias estão mais quentes, fica melhor. — Sorri e ele assentiu.

— Agora vamos levar uma princesa até o portão. — Pedro falou quando paramos de frente a escola.

Observei ele pegando a Duda no colo e levando até lá na frente, o modo como ela se divertia quando estava com ele era único, eu sentia que ficar com ele foi a melhor decisão que tive.

Senti uma pontada no pé da barriga e estremeci me segurando no banco. Elas tinham começado a incomodar ainda mais, mas essa foi bem forte.

— Olhei feio pro menino que puxou o cabelo dela e... tá tudo bem? — Ele perguntou e assenti. — Então por que você tá grudada no banco?!

— Medo do carro sair andando sozinho. — Sorri amarelo e ele fez uma careta. — Enfim, a mãe do menino não quis te matar?!

— Eu sei lá, nem prestei atenção.

Continuamos o caminho em silêncio, eu estava morrendo de sono e ele parecia pensativo... as vezes eu ainda tinha medo de saber o que estava acontecendo na cabeça dele.

— Se cuida tá bom? Eu sei que parece loucura mas eu to com um aperto super estranho no peito... eu só senti isso uma vez, e foi no dia em que tudo deu errado na minha vida. — Pedro falou baixinho quando cheguei no escritório.

— Não se preocupa... tá tudo certo com a gente. — Sorri pegando sua mão e colocando encima da minha barriga.

O Rafael se mexia demais, e hoje ele estava agitado.

— Eu amo vocês, muito. — Ele falou beijando o topo da minha barriga e em seguida minha testa. — Promete que me liga se passar mal ou algo assim?

— Claro que te ligo amor, amo você. — Falei saindo do carro.

Fui a primeira a chegar... eu estava evitando pensar em desastres ou coisas do tipo, mas parecia cada vez mais difícil evitar, eu estava com medo de tudo dar errado, tinha certeza que se deixasse isso me consumir entraria em pânico.

Comecei a adiantar algumas coisas, meu fluxo de serviço tinha diminuído muito, as idas no banheiro e horas de enrolação me atrapalhavam muito.

— Você ainda está vindo?! — Dei um pulo e coloquei a mão no peito. — Me desculpa, não queria te assustar!!

— Pelo amor de Deus Bruno, quer me matar! É claro que eu to vindo, vou vir até ganhar o Rafa. — Dei de ombros passando por ele. — Você sumiu... tá indo bem como juiz?

— É mais chato do que eu pensava... bem mais chato. — Ele revirou os olhos me ajudando com a pilha de arquivos. — To pensando em voltar pra cá quando você entrar de licença.

— Mas vai largar seu sonho?! — Perguntei me apoiando na mesa, outra pontada daquelas me fez arfar.

— Tá tudo bem?! — Ele perguntou se aproximando e assenti. — Maria Julia, você já contou pra eles que voltou a ter as tonturas?!!

— Não foi uma tontura!! São leves dorzinhas na barriga, minha pressão está normal. — Retruquei nervosa.

— Meu pai já te liberou pra você ficar em casa Maria Júlia, você sabe que isso é perigoso... sabe que um descuido seu e as coisas podem acabar mal pra você e pro Rafael, o Pedro ao menos sabe que nem trabalhando você deveria estar?! — Ele perguntou em tom ameaçador.

— Cuida da sua...

— Bom dia gente. — Gabe entrou no escritório sorrindo e mudou seu semblante assim que viu nós dois. — Vocês não estavam brigando, estavam?

— Não. — Falei com um olhar de alerta pra ele. — O Bruno só estava me ajudando com um processo aqui.

Ficamos sem conversar a manhã toda, hoje a Isabel não viria porque precisava levar as meninas na consulta de rotina... Bruno foi embora depois do almoço e só sobramos eu e a Gabe.

Eu estava me sentindo mal o tempo inteiro, era um mal estar horrível, minha visão ficava turva e estava cada vez mais difícil de se concentrar.

— Meu irmão passou lá em casa hoje... ele parecia preocupado, vocês brigaram?! — Ela perguntou e ergui meu olhar.

— Não... ele disse algo de manhã sobre estar com um pressentimento ruim, mas eu acho que é só mal humor. — Balancei a cabeça e ela assentiu. — O Pedro é muito preocupado, não consigo nem imaginar quando os nove meses chegarem.

— Acho que é normal, é como se fosse o primeiro filho dele... ele deve ter medo de que algo aconteça com vocês. — Gabe deu de ombros. — Mas já está tão perto de nascer, eu tô muito ansiosa pra poder ver o rostinho rechonchudo dele.

— Gabe você faria um favor pra mim?! — Pedi me levantando. — Eu to muito cansada, tão cansado que não to conseguindo fazer mais nada... vou ir embora pra casa.

— Quer que eu ligue pro Pedro? Se eu tivesse de carro te levaria. — Ela levantou também e neguei.

— Eu vou ligar pra ele avisando, mas se por acaso ele passar aqui você fala que fui embora?! — Perguntei tentando parecer o melhor possível.

— Tem certeza que tá tudo bem?

— Tenho... é só cansaço, acho que o Bruno tinha razão quando falou pra eu não vir mais. — Engoli em seco sentindo meu estômago se embrulhar.

Ela concordou ainda me olhando estranho e me despedi saindo, tentei ligar pro Pedro mas seu celular estava desligado, merda... mas era até melhor, assim ele não ficava preocupado.

Voltei andando sentindo um peso gigante nas costas, parecia que meu corpo todo era uma bola de ar quente e eu iria explodir.

Assim que cheguei em casa deitei na cama, graças a Deus peguei no sono... mesmo que tenha durado só duas horinhas já estava ótimo, pelo menos a sensação ruim tinha passado.

Vi que ainda estava de dia... tinham algumas roupinhas do Rafael que eu tinha passado e precisava guardar, era melhor eu aproveitar e fazer isso agora.

Ele já tinha bastante coisa ganhada, a Fran tinha dado algumas, a Gabe deu um sapatinho lindo e o Pedro não podia ver nada que comprava, era literalmente pior do que eu.

Comecei a organizar dentro do guarda roupa, eu estava sentindo uma sensação no peito, um medo de não poder viver tudo aquilo, medo de tudo dar errado e eu não ver meu menininho crescer.

Talvez fosse melhor eu ir na Nancy amanhã, falar pra ela sobre isso... talvez fosse algo grave e tivesse uma solução, ou talvez não, talvez eu não conseguisse suportar a pressão alta e algo de muito ruim desce errado.

E então eu não poderia ver a Duda crescer, não poderia ver meu bebê, cuidar dele... deixaria o Pedro sozinho com tudo, tendo que suportar toda dor sozinho.

Quando percebi já estava chorando, eu me sentia louca em partes, meus hormônios estavam descontrolados... teve um dia em que só porque eu não conseguia arrumar o cabelo acabei chorando.

Mas tinha sanidade naquilo, eu sentia sim medo... e eu tinha plena consciência de que algo podia dar errado e ser fatal, e eu realmente podia perder tudo na vida deles...

— Maju? — Ouvi o Pedro me chamar. — Maju o que Aconteceu?

Ele me abraçou apertado e solucei sem conseguir falar, Pedro afagava meu cabelo sem entender nada, eu não queria estar tendo esses pensamentos.

— Promete que vai cuidar de tudo? Promete que vai cuidar da Duda e do Rafael se alguma coisa acontecer comigo?! — Perguntei soluçando e ele me encarou por alguns segundos. — O bebê acorda a noite, tem que ficar monitorando pra não engasgar com o leite, a água do banho não pode ser muito quente, a Duda ama escolher as coisas dela no mercado e... não vai dar tempo de te ensinar tudo Pedro, o que eu faço, o que eu faço?

Ele fechou os olhos por alguns instantes e segurou meu rosto, minhas lágrimas saiam desenfreadamente e por um momento tive medo da sua resposta.

— Amor, respira comigo... — Ele pediu respirando fundo enquanto secava minha bochecha com os dedos. — Você precisa se acalmar, precisa lembrar que vai ficar tudo bem... precisa lembrar que eu amo você e não vou deixar nada te acontecer, entendeu?!

— Mas você me promete?! Me promete Pedro! — Pedi olhando nos seus olhos e ele respirou fundo sem saber o que fazer.

— Eu prometo, de verdade, que vou cuidar deles... mas não vai acontecer nada meu amor, você confia em mim? — Pedro perguntou e assenti ainda chorando.

Ele me abraçou apertado até a crise de nervoso passar, suas mãos passeavam pelas minhas costas me afagando. Mesmo me achando louca, um resquício de medo ainda fazia parte de mim.

— Escuta Maria Júlia, vai dar tudo certo, porque você foi forte uma vez, e vai ser forte de novo. — Pedro segurou meu rosto olhando nos meus olhos.

— Se eu morrer você vai arrumar outra mulher?! — Perguntei fungando e ele revirou os olhos.

— É claro que não! Pelo amor de Deus, eu amo você, só você, e ninguém no mundo nunca, nunquinha vai te substituir. — Ele me beijou demorado e me senti culpada. — Você tá melhor, acha consegue ficar bem?

— Acho. — Sussurrei voltando a abraçar ele. — Cadê a Duda? Você esqueceu ela?

— Deixei ela na casa da mamãe, tá tudo bem, amanhã ela volta pra cá... A gente vai jantar, e depois você vai tomar um banho junto comigo, tudo bem?! — Assenti secando as lágrimas.

Jantamos juntos em absoluto silêncio... eu mal consegui comer, ele tentava puxar assunto mas eu estava perdida nos meus pensamentos e paranóias, será que isso iria se repetir?!

Senti outra pontada mais forte e mordi os lábios me segurando na mesa, agradeci por ele não ter visto.

— Preciso de ajuda... — Falei quase morrendo pra tirar o vestido. — A alça não passa.

Ouvi sua risada enquanto ele se aproximava terminando de puxar meu vestido pra cima, seu olhar percorreu meu corpo e me senti envergonhada.

Eu estava mais inchada que o normal, meus pés pareciam um pão e meu rosto estava rechonchudo.

— Você tá tão linda assim... não sei porque vive se escondendo e evitando que a gente tome banho juntos, cada estria dessas me mostra que a gente tem uma história linda juntos. — Pedro beijou meu ombro e sorri. — Vem...

Tomamos banho juntos e ele me ajudou em tudo, eu percebia seu olhar e sua excitação, mas eu morria de medo de cair no banheiro ou alguma coisa acontecer. Eu tinha me tornado muito paranóica e isso me preocupava um pouco.

Vesti minha camisola e deitei na cama. Ele se deitou fazendo carinho nas minhas costas, me virei de frente pra ver seu sorriso.

Beijei seus lábios com calma, mesmo me sentindo um pão inchado eu queria tentar aquilo... sei que ele estava louco por isso, e eu também queria muito.

— Tem certeza disso?! — Ele perguntou passando os dedos pela minha bochecha.

— Se você quiser ter a imagem mais constrangedora de sexo do mundo, sim. — Falei sorrindo e ele riu me encarando.

Ficamos em uma posição extremamente esquisita, tudo em mim estava sensível e ele foi tão calmo que me senti a pessoa mais amada do mundo.

— Você é linda, sabia? — Pedro sussurrou tocando meus lábios assim que terminamos.

— Obrigada por estar aqui e... por me amar, por aturar minhas crises de pânico, por ser a melhor pessoa que você poderia estar sendo. — Sorri o beijando.

— Eu sempre vou estar aqui.

Essa foi a primeira noite em que consegui dormir, mesmo minha mente estando um turbilhão, eu estava com o Pedro, e só isso importava.

Acordei no meio da noite sentindo uma vontade absurda de fazer xixi. Assim que levantei senti uma pontada forte na costela e arfei.

Andei até o banheiro com certa dificuldade, senti uma leve tontura e me apoiei na parede... eu estava soando, e muito.

Sentei na privada me sentindo fraca, mesmo que eu estivesse com a sensação de xixi, não saiu nada. Me levantei achando estranho e vi uma linha fina de sangue escorrer pela minha perna.

Senti outra pontada na costela e uma cólica forte, abri a boca prestes a gritar mas me contive... tentei continuar mantendo o ritmo de respiração, mas estava difícil.

Meu bebê não podia estar nascendo agora, estava muito cedo... ele não podia nascer agora.

Andei devagar até a cama respirando pela boca, minhas mãos estavam sujas de sangue e naquele momento eu só queria ir pro hospital e ouvir que estava tudo bem, mesmo sabendo que era o contrário.

— Amor... amor acorda. — Chamei ele me apoiando na cama e sentindo outra cólica forte.

— Maju?! Maju você tá suja de sangue!! — Pedro deu um pulo da cama e acendeu a luz. — Meu Deus, o que eu faço?! O que eu faço porra?! Por que você tá sangrando?

Ele estava andando de um lado pro outro desesperado, acho que estava procurando a bolsa de hospital... mesmo que eu quisesse dar as instruções, minha voz não saia... eu só conseguia sentir dor.

Arfei novamente sentindo outra pontada na costela, olhei pro chão vendo água e percebi que a bolsa tinha estourado.

— Pedro a bolsa estourou!! Meu Deus. — Gritei desesperada.

— Que bolsa?! A bolsa tá aqui Maju vamos!! — Ele mostrou a bolsa do bebê e fiz uma careta olhando pro chão. — Você fez xixi?! Eu não to entendendo nada Maju, por que você fez xixi e tá sangrando?!

— A bolsa Pedro, pelo amor de Deus, a placenta estourou, o líquido que o bebê tava saindo saiu e... — Gemi de dor e me apoiei na cama. — Eu não vou aguentar, me ajuda por favor.

— Calma, vamos. Com calma, vou precisar da sua ajuda, preciso que respire igual um cachorrinho. — Pedro pediu enquanto me ajudava a sair do quarto. — Ah merda, eu vi isso em um filme, por que inferno eu não pedi instrução pra médica?! Eu não sei o que fazer, não era pra ele sair daí agora!

Enquanto descíamos a escada percebi medo no seu olhar... a dor estava cada vez mais forte, parecia que todos os meus ossos estavam sendo quebrados, um por um.

Ele me ajudou a sentar e entrou no carro. Gritei de dor quando outra contração me atingiu, Pedro me olhava desesperado, tentando segurar minha mão e trocar a marcha, revezando.

Estava cada vez mais difícil de respirar, a dor parecia maior que isso.

— Maju olha pra mim!! Olha pra mim. — Ele pediu. — Respira, eu preciso que respire!! Preciso que fique acordada, só falta alguns minutinhos. Respira por mim, pela Duda e pelo Rafael.

Assenti sentindo que não conseguiria. Tentei manter o ritmo de respiração e ouvi ele rezando, mordi meus lábios sentindo as lágrimas... eu não ia conseguir, eu não iria suportar.

Se eu prestasse atenção e repensasse na minha semana, tudo foi um despedida. O dia em que vi a mamãe, o almoço na casa da Fran, as conversas com a Gabe, o dia em que a Isabel foi em casa... tudo estava se encaminhando pro fim e só eu não percebi.

Senti meu coração se despedaçar quando lembrei da Duda, eu nem vi ela ontem.

— Vou buscar a cadeira de rodas, aguenta firme!! — Sua voz me falou distante e vi um borrão correr até dentro do hospital.

Fui colocada em uma cadeira de rodas enquanto entrava na sala da obstetra, ela me perguntava coisas que eu não conseguia assimilar, e nem ao menos responder.

— Vamos ter que fazer um parto de emergência! — Ouvi ela gritar pros outros. — O senhor vai precisar se vestir com a bata, iremos começar...

Olhei pro Pedro que mordeu os lábios antes de sair.

— Ouça Maria Júlia, fique me ouvindo, tudo bem? Não durma, vamos conseguir. — Ela sorriu e minha visão ficou turva novamente.

Senti a agulhada do soro e quando ela fez o toque, seu olhar foi de desespero e percebi que não daria certo.

— Respira fundo, e faz força no três... um, dois, três!! — Empurrei sentindo uma dor de cabeça horrível. — De novo, um, dois, três, empurra!! — Gritei de dor enquanto empurrava. Vi o Pedro se aproximar, tentei alcançar sua mão, mas ele não podia se aproximar. — Só mais um pouco, ele tá quase vindo, vamos... um, dois, três, empurra!!!

Empurrei com toda minha força sentindo tudo dentro de mim rasgar, ouvi seu choro estrondar na sala e as lágrimas aparecerem.

Ela colocou ele perto de mim e pude ver aquela coisinha minúscula, por um momento toda dor e confusão sumiu, aquele era meu filho, meu bebê... o que nos uniu novamente.

Pedro se aproximou chorando, ele nos encarou e tirou a máscara.

— Nosso bebê... amor, é nosso bebezinho. Você conseguiu!! — Ele apertou minha mão e sorri me sentindo fraca.

Rafael chorava, seus traços eram perfeitos e ele parecia uma anjo. Meu bebê, meu fruto... eu queria tanto poder tocar seu rostinho, mas não tinha forças pra isso.

Senti minha visão embaralhar e minha cabeça dar um latejo forte, eu parecia uma bolha de ar quente... senti que não tinha controle sob meu corpo e a imagem do Pedro foi ficando cada vez mais distante.

— O que tá acontecendo?! — Ouvi sua voz gritar enquanto o Rafael chorava.

— Ela está tendo uma convulsão, levem o bebê, se afasta!! — A médica gritou e ouvi o choro ficar cada vez mais longe até sumir.

— Vocês não podem deixar ela morrer! — Pedro gritou chorando.

Senti que minha cabeça explodiria enquanto meu corpo se debatia... eu estava me sentindo cada vez mais fraca, não conseguia falar, não consegui olhar pra ele, tentar melhorar e sair daquilo.

— Me diz o que tá acontecendo porra!!!!

— Ela teve Eclâmpsia durante o parto, não deveríamos ter feito um parto normal porque isso contribuiu para um aumento súbito da pressão arterial. Ela foi forte o suficiente pra aguentar o parto, mas é raro que os dois sobrevivam à isso. — Ouvi ela explicar enquanto colocava a máscara de oxigênio em mim. — Agora peço que se acalme e se afaste, precisamos esperar a convulsão passar!

— Se não podia fazer o parto, por que fez?! Que inferno eu vou perder ela! — Pedro estava chorando, desesperado.

Senti meu corpo amolecer e consegui abrir os olhos, ele me encarava chorando com as mãos juntas, estava rezando... eu também faria isso.

Assim como o previsto, eu não iria aguentar.

Estendi minha mão na sua direção, eu sabia que aquele momento estava chegando, precisava me despedir, precisava dizer adeus do meu jeito.

Seus dedos tocaram os meus de leve... algumas lembranças começaram a passar pela minha cabeça como um filme.

Me lembro da primeira vez que seus olhos azuis se cruzaram com os meus, não paramos de nos encarar um minuto naquela noite... uma semana depois nos vimos na escola, e tivemos nosso primeiro encontro.

Lembro do dia em que ele se declarou, me pediu em namoro... de como o papai surtou e quase expulsou ele de casa. Planejamos toda nossa vida e enterramos junto com uma foto nossa no parque da cidade, juramos que iríamos nos casar e ter filhos, desenhamos nossa casa e planejamos do que iríamos trabalhar.

Anos depois, mesmo que fora de ordem, tudo aconteceu... eu jamais poderia imaginar que eu amaria ele, e que ele seria minha vida.

Lembrei da primeira vez que a Duda chamou meu nome, correndo desesperada com medo do aspirador ela soltou um "mamãe" eufórica, quase chorando. O dia em que pensei em morrer porque minha dor estava insuportável e ela entrou no quarto mostrando uma borboleta na janela, me lembro de ter chorado a tarde toda com remorso.

Do dia em que o papai morreu, e como aquilo doeu, de como a mamãe sofreu, de como nos apoiamos... me lembrei de quando ela fazia bolo e me dava um pedaço escondido pra eu levar pro Pedro. De como ela cuidou de mim e me amou, mais do que qualquer pessoa seria capaz de amar.

De quando conheci a Isabel, de como ela parecia descolada e maluca, mas na verdade era tão mole quanto eu... lembro de todas as nossas brigas, e de como ela me ajudou, de como ela me amou.

Lembrei de cada detalhe da minha vida, de tudo que me fez feliz, de tudo que fez eu me sentir viva... e de todas as lembranças, a última foi de como o Pedro me fez uma pessoa feliz, de como seu amor me mudou, me fez nascer de novo e enxergar a vida, ele me deu a Duda, e agora eu deixava o Rafael. Eu esperava que ele fosse forte.

Apertei sua mão sentindo uma dor horrível no peito, aqueles eram meus últimos segundos, e agradeci a Deus por ter me deixado enxergar o quão maravilhosa foi minha vida.

Sorri sentindo uma única lágrima escorrer pelo meu rosto, meu corpo foi enfraquecendo enquanto eu via seus olhos azuis, chorando desesperadamente. Ele apertou minha mão enquanto gritava algo que eu não conseguia assimilar pros médicos.

— Eu te amo. — Consegui sussurrar pela última vez.

Ouvi o caos lá fora, mas não me importava mais, porque ali dentro eu encontrei a calma, e esperava que ele se lembrasse de mim, assim como eu me lembraria — mesmo que de forma impossível — dele.

Vi tudo ficar claro enquanto o barulho dos meus sinais vitais começavam a sumir no aparelho ao lado. Voltei meu olhar pro teto sentindo a dor no peito ficar cada vez menor... antes de ir embora, pude enxergar o quanto fui feliz ao seu lado, e de como minha vida valeu a pena, só por ter amado ele.

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