15. Fingir que Não Aconteceu. Não Está Acontecendo

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Eu insisti até quando já não era mais possível, para que Izis conseguisse me atender hoje. Minhas sessões costumam ser nas quartas-feiras, mas depois de ontem, eu preciso de uma sessão hoje.

Ela tinha um tempo livre e me deixou vê-la. Fiquei surpresa, pois não sei como funciona lá: se precisa da permissão de outra pessoa para atender alguém fora de data, se ela mesma que faz seus horários. Eu não sei.

Mas aqui estou, falando sobre toda a tempestade que se formou dentro de mim com Izis.

- Acha que se eu me entregar, viver isso de uma forma intensa, ele vai me machucar?

- Pelo o que me falou sobre ele, não. Christian parece gostar de você, Bruna. Por que não dá uma chance?

- Ah, quer saber? Deve ser só uma paixãozinha besta de escola. Eu o conheço há só, o quê? Um mês e meio? Logo isso passa.

- Bruna, nem sempre é assim. Sabe disso, não sabe? Se está apaixonada, não pode simplesmente fingir que não está acontecendo.

- O problema não é estar apaixonada, mas sim, acabar me machucando por causa disso. Eu sou muito nova para ter estrutura emocional forte o suficiente para lidar com isso.

- Você pode ter noventa anos, se estiver gostando de alguém, gostando de verdade, ver essa pessoa com outra ou outro que não seja você, vê-la partir, ou qualquer coisa do gênero, ainda irá doer. Mas o importante é saber que não precisa desse alguém para viver e saber seguir em frente. Quiser chorar, chore! Se quiser passar meses sem fazer absolutamente nada, passe! Se quiser viver a tristeza, viva! Com tanto que saiba seguir em frente depois e saber que o que passou, passou! Mas não sabe se toda essa saga da desilusão vai acontecer e só saberá se tentar. Existem chances, muitas chances, de dar certo. - Gesticula com as mãos para dar ainda mais ênfase em suas palavras.

- Mas e se essa saga acontecer? E se der errado?

- E se der certo, Bruna? Sabe o que é pior do que dar errado? - Nego com a cabeça - Não tentar e passar a vida inteira se perguntando como seria se, ao menos, tivesse tentado.

- Não ouviu que eu disse que existem grandes chances dele ir embora?! É claro que não vai dar certo. Sem contar que eu nem tenho certeza. E nem sei se ele sente isso por mim.

Izis solta um suspiro exaustivo.

- Por que não escreve para entender isso? - pergunta ainda com seu olhar de tédio.

- Estou bloqueada! - respondo pela milésima vez, já com a minha paciência esgotada.

- Estou falando de escrever algo diferente. Às vezes o problema pode não ser você, mas sim o gênero que você escreve. Por que não tenta ficção? Escrever uma história, realmente? Talvez se dê bem com isso.

- Pode ser. Mas independente do que eu escrever isso não vai passar... O que acabaria com esse sentimento? - pergunto com a voz baixa.

- Só o tempo. E acredite, vai demorar.

- Mas tem como acelerar isso, não tem?

- Bom...

- Se eu não falar mais com ele? Se eu me afastar? Isso acelera, não?

- Sim, mas...

- Ótimo! Eu vou me afastar do Christian!

- Bruna, eu não acho que isso seja uma boa...

- É isso! Já está decidido. Em menos de um mês, tudo isso já terá passado!

- Bruna, você disse que ele vai embora, não? - Assinto com a cabeça - Então! Não tem porque parar de falar com ele, quando daqui a pouco, Christian irá embora e você nunca mais irá vê-lo!

- É por isso mesmo que vou me afastar. Assim, quando ele for embora não irá doer tanto. Foi uma ótima sessão, obrigada. Você ajudou muito. - Levanto-me e sigo em direção a porta.

- Bruna, eu não disse que...

- Tchau, Izis. Até quarta. - Fecho a porta e sigo com confiança até minha casa.

Ótimo. Eu vou simplesmente fingir que Christian não existe! Eu irei me "desapaixonar" tão rápido que nem sequer irá parecer que um dia, já estive apaixonada.

Talvez essa ideia de escrever um gênero diferente não seja tão ruim assim. Talvez até ajude com esse processo de "desapaixonização". Ao em vez de um mês, eu poderia esquecer esse sentimento em uma semana! Ah, Deus, seria ótimo!

Ao chagar em meu quarto, simplesmente sento-me na cadeira da escrivaninha, abro o notebook e tento escrever.

Escrever.

Não é algo tão difícil. Eu escrevo há mais de onze anos.

Mas, sobre o que escrever?

Olho para trás e encontro os papéis com textos não terminados sobre a cama. Eu passara a noite, ou melhor, a madrugada inteira tentando escrever em folhas de papel, como costumava fazer aos cinco anos de idade, talvez isso pudesse resolver o problema, mas não.

Hillary dormia tão profundamente que nem sequer ameaçou acordar com a luz acesa. Os três foram embora hoje de manhã, Adam e Mateo ainda estão dormindo. Não quero nem estar aqui quando acordarem com a maior ressaca do mundo!

Desvio o olhar dos textos interminados para a estante de livros. Alguns eu já li milhões de vezes, outros estavam quase apodrecendo. Já havia lido Garota Exemplar, O que Aconteceu Com Annie, O Homem de Giz, Pequenos Inssêndios Por Toda Parte... e mais outros suspenses, distopias, clássicos, ficção científica... Os que estão apodrecendo ali, são todos os Romances Românticos e os de ficção adolescente.

A Seleção está naquela estante há anos. Os vários livro da Júlia Quinn, então... Deve ter algum que nem lembro que existe.

Caminho até lá e procuro por algum livro que ache interessante e que nunca li, mas os únicos que não havia lido, eram os Romances. Sem ter outra escolha a não ser uma bela história de amor, decido pegar Uma Dama Fora Dos Padrões.

...

Passei horas lendo aquele livro, tanto que acabei de ler todas as 354 páginas hoje! Ou melhor, ontem, já que são duas da madrugada.

É oficial: românce de época é meu novo gênero favorito.

E se eu escrevesse meu próprio românce de época?

Sobre o que seria?

Passo a andar em círculos pelo quarto. Isso sempre me ajudou a pensar. Várias cenas se passam pela minha cabeça, essas cenas em um livro com certeza ficaria ótimas. Mas eu não tenho nenhum conflito.

... Humm...

... E se esse livro contar a história de uma jovem adulta que está sendo forçada a se casar com um ser que ela nunca nem viu na vida e por conta de sua frustração, ela foge, a fim de finalmente poder fazer suas próprias escolhas?

É isso! Tenho uma trama minimamente descente. Acho que o problema realmente era o gênero textual.

Volto para a escrivaninha e inicio a criação do meu primeiro original.

     Volto para a escrivaninha e inicio a criação do meu primeiro original

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