L2|| X. No Lugar Certo, No Mesmo Dia

Começar do início
                                    

 Humanos destilam e fermetam verdadeiras iguarias que são difícieis de encontrar em outras dimensões. E  aprendendo que devo me importar com quantas vezes o planeta terra gira em torno do sol desde quando um humano nasceu, vim aqui hoje unir o útil ao agradável: comemorar isso e conseguir mais iguarias para negociar por ai.

Jaqueline me apresenta suas amigas, as quais dizem simpáticos "ois" com sorrisos enormes e vozes estridentes. Elas são as próximas a entrarem e isso é absolutamente maravilhoso pois é aqui mesmo que eu vou ficar para entrar também. Não fui feita para esperar e de forma alguma voltarei para o final da fila. 

Pequenos truques que se aprendem quando se passa algum tempo nesse lado do universo.

Após explicar á elas que trouxe alguém comigo, elas dão alguns pulinhos de alegria e eu acho interessante como fêmeas humanas demonstram seu empolgar com dócil facilidade. Aceno para Alexis vir até mim e quando ela chega, as meninas a encaram da mesma forma que me encararam.

— Uau! Vocês são modelos? Vocês são tão altas e elegantes! — uma de óculos pergunta.

— Verdade! Se eu colocar vocês no meu insta vou receber chuva de like. — comenta outra e eu não sei o que isso significa.

Modelos. Quê que isso? Não sei, mas não é a primeira vez que ouço. De qualquer forma pelo jeito que elas falam parecem genuínos comentários positivos sobre nossa aparência. Agradeço, pois humanos gostam de apontar em voz alta caracteristicas obvias uns aos outros o tempo todo. 

O segurança do lugar nos chama e enquanto revista a todas nós, tento fingir que não furei fila e entrei na tal "caruda" que ás vezes acho que aprendi aqui, ás vezes acho que já nasci com ela. Alexis entra atrás de mim, provavelmente pensando o mesmo que eu.

Eu adoro trazê-la comigo em qualquer lugar, em qualquer mundo. É, e sempre será minha melhor amiga. A única parceira que eu preciso pelo resto da minha vida. E ela faz essas caretas me julgando mas eu sei que ela apóia cada atitude minha. E se não apoia, diz na minha cara e sabe que eu a ouço. Ou ao menos considero ouvir. Temos um relacionamento verdadeiro que jamais mudará.

Dentro do primeiro bem iluminado espaço do lugar, damos formas de identificação. Humanos gostam disso, precisam de papéis confirmando informações pois não confiam na palavra um do outro e acham que documentos resolvem isso. Balela, pois eu já preparo para mostrar o meu falso que consegui com Dona Martinha, mãe de Jaqueline. Só que a hostess do lugar está á nossa frente dizendo algo que não pude ouvir exatamente mas que chateia as meninas que estão com Jaqueline.

— Desculpe, mas são as regras. — a mulher de cabelos negros e curtos diz com seu queixo resoluto, balançando uma caneta prateada no ar.

Me aproximo do pequeno balcão dela, curiosa.

— Algum problema? — questiono, fazendo a baixinha levantar os olhos até os meus e se intimidar a princípio.

— E-elas não podem entrar. — engole em seco, parecendo ter que criar coragem para soltar a frase.

— E por que não? — sei que tem esse bla bla bla de idade por aqui, mas tenho certeza de que elas não são menores. Ao menos não em suas identidades, já que Dona Martinha também pode providênciá-las com RGs falsos.

— Temos códigos de vestimenta rígidos. Não aceitamos calças jeans nem certas... roupas. Precisam estar sob um certo padrão para entrarem na Libertine.

Olho para a trupe que acompanha Jaqueline e tento pensar em como resolver isso. Daí olho para Alexis, depois para elas novamente, que apenas me encaram com carinha de cachorrinhos sem dono, pedindo com o olhar que eu resolva isso com conversa ou "propina", assim como as que sua mãe Martinha recebe para ficar quieta a respeito das coisas ilícitas que provê a pessoas importantes.

A que me mais me implora com os olhos é Jaqueline, pois sabe como eu posso resolver isso sem conversa e sem propina. Me sinto numa sinuca de bico pois eu devo e gosto tanto de sua mãe que me sinto na obrigação de fazer algo.

Mesmo sabendo que não devo.

Olho novamente para Alexis que apenas me revida uma enfática resposta.

— Não.

Ela já sabe o que eu pretendo fazer.

Trocamos olhares, ela e eu. Alexis oferece resistência a idéia mas já sabe que não adianta. Eu sempre a convenço quando o assunto é trivial assim. Ou ela sempre se deixa convencer por mim, pois sabe que o que eu não resolvo na lábia, ela resolve na violência. De qualquer forma, quase sempre ela vira cúmplice de meus pequenos crimes. Especialmente nos que ela quer participar.

— Alexis, você poderia levar as mocinhas para um canto e voltar em dois minutos? — pergunto para o rostinho enfezado que me fuzila com os olhos que ficam mais verdes que de costume. — Meninas, vão lá com ela. — inclino a cabeça em direção a Alexis e elas me obedecem, entreolhando-se entre si.

— Moça, a fila precisa andar. — a nanica me diz. 

— Eu sei. Elas vão se trocar e já voltam. — menti, resolvendo ficar ali para "guardar lugar." 

Olho para trás e vejo Alexis balançando a cabeça em censura, tentando segurar uma risada para parecer verdadeiramente brava. Apenas pisco para ela em resposta, convencendo-a a confiar em mim.

Algumas outras pessoas mostram seus RGs e entram enquanto me olham de cima abaixo pendurada no balcão, não sabendo se correspondem aos meus sorrisos ou se falam com a hostess.

O olhar de uma pessoa entre essa pequena multidão me chama atenção. Um homem alto, eu diria até alto demais para a espécie que popula essa terra. Está parado, sussurrando algo sério com o segurança que me revistou. Seus cabelos loiro-escuro complementam bem os olhos castanhos que ao me olharem, não parecem gostar nada do que veêm. Eu o fito de volta, e nosso pequeno stand-off se dá prolongada e silênciosamente. Desviando o olhar primeiro, termina sua conversa e passa por mim o mais rápido possível.

Os minutos necessários se passam, e Alexis volta com o grupinho de garotas.

Não, elas não mudaram uma peça de roupa sequer. Mas a hostess não precisa saber disso. Apenas precisa de uma pequena dose de ilusão por alguns minutos para acreditar que viu uma mudança. 

Magia leve, coisa besta. Para ficar mais convincente, Alexis as levou para "trocarem-se" e voltam. Nem a hostess sabe o que aconteceu, nem as garotas, apenas Jaqueline. Funciona. Saíram normais e voltaram maravilhosas, pelo menos aos olhos da mulher que permite quem entra ou não, tudo com um leve toque de minha varinha-de-condão. Ou melhor dizendo, bracelete.

Sou ou não sou uma fada-madrinha?

Por fim, entramos. Alexandrai me encara pingando a costumeira censura que me dá sempre que eu desobedeço ordens explícitas, uma mania que tenho sempre que quebrá-las parece ser a opção mais viável.

Não, não é a mais segura.

Mas é sempre a mais interessante.

ADARISOnde as histórias ganham vida. Descobre agora