Capítulo 55

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Kilayra estava nervosa. Não era possível ignorar o imenso desconhecido que se aproximava. Não conseguia desviar o olhar do homem que pretendia arrumar-se ao seu lado, com seus quase dois metros. Ela não percebeu a tempo de impedir seus olhos. Pareciam ter assumido uma identidade própria, e propriamente mais teimosa que ela conseguia ser, encarou-o de cima à baixo. Mapeou o corpo à sua frente sem perceber a tempo de impedir que fosse pega no flagra. O corpo musculoso, embora sem demonstrar exageros, apenas atlético. Olhos azuis. O cabelo liso e loiro, não muito curto. A franja era de lado e ficava meio arrepiada na frente. Possuía as características físicas do povo que habitava a área central do Daran, região de Varshan. Pensou em Sorin. Desviou o olhar e a viu sentada entre os convidados ilustres de outras terras ao lado do pai. Havia uma cadeira vaga à direita do Rei Sharláh. Certamente reservada para o príncipe. Onde estaria o moço? Continuou o trajeto com os olhos possuídos e viu Joice. Ela a encarou de volta. Desviou o foco para o lado e viu sua família. Sorriu para Ritshy. Percebeu que a prima também olhava para a sua amiga. Esperava de todo o coração e alma que a bruxa não tivesse poder suficiente para ver a real identidade da jovem sentada ao lado de Lucas e Sara, para que não incorressem no risco de serem desmascaradas a tão pouco tempo de completar sua missão. Seu olhar em seu passeio voluntarioso, utilizando-se do livre arbítrio, pousou novamente em seu lado direito. Encarando o belo gigante. Alvoroçou-se ao perceber que a observava de volta, curioso. Remexeu-se inquieta. Com seu um metro e setenta, parecia baixa demais para um homem, embora não fosse uma mulher baixa.

Reparou atentamente sua fisionomia, uma vez que havia sido pega no ato, não precisava disfarçar. A pele estava bronzeada, denunciando que havia se exposto aos sóis nas horas mais quentes do dia. Técnica que também foi utilizada por ela, em seus treinamentos, antes do torneio. Usava as horas mais quentes para brandir sua espada e treinar concentração. O rapaz corpulento exibia algumas marcas de expressão no rosto que demarcavam quais músculos movimentava mais ao se expressar. Alguns situados na testa e outros nas bochechas. Notava, mesmo com a barba levemente crescida. E lá estavam novamente, as charmosas covinhas, abrindo-se em um sorriso avassalador. Os lábios não eram grossos, nem finos demais e exibiam aquela tonalidade rosada. Eram donos de um contorno significativo. O queixo, levemente dividido ao meio, completava a simetria daquela face longânime. Antes um pouco, notou o andar majestoso e firme e... as mãos. Que mãos eram aquelas? Apesar de estarem sujas e calejadas, exibiam uma beleza difícil de ser encontrada em meras e corriqueiras mãos. Por que reparou as mãos do sujeito desmesurado? Grandes e com os dedos longos. Talhadas de tal firmeza que demonstravam perícia absoluta ao segurar as armas trazidas consigo tão naturalmente. Encaixava-se naquelas mãos uma espada larga. Uma batalha com aquele oponente seria um feito memorável. Ao observá-lo devolver o olhar nada sorrateiro, a moça sentiu algo entre o absoluto desconcertante e o extremo agradável. Parou com suas tentativas de precisar a definição em uma só palavra para descrever. A sua voz era ao mesmo tempo suave e dona de um tom grave impecavelmente charmoso. Impressionou na primeira sentença falada.

— Posso me sentar aqui?

A pergunta veio enquanto ele realizava o movimento indicativo de apoderar-se do lugar vago ao lado dela. Deu de ombros. Não entendeu a razão da pergunta, sendo que sentaria independente da resposta. Ajeitava-se. Olhou de esgueio e sorriu. Que sorriso era aquele? Achou engraçada a tentativa do colosso ao sentar rapidamente para que não fosse notado chegando com atraso. Esperava o que era improvável, levando em consideração seu tamanho. Não tirava o maldito sorriso do rosto!

— É comigo? — tentando esconder sua indignação, pois ele havia pedido permissão para apoderar-se da lacuna no banco ao lado direito dela, enquanto já se apossava independente da resposta. Desviou o olhar. Ficou tão surpresa com a figura que falou com sua voz sem o disfarce da tonalidade. Preferiu não corrigir repetindo para não enfatizar o erro. Talvez ele nem tivesse notado. Mas definitivamente, precisava melhorar essa entonação. Preferia não ser descoberta antes da hora.

— Exato — respondeu o estranho. Ainda sorrindo zombeteiro.

— Por que não poderia? Senta aí! — já impostando o correto timbre.

— Não acha que é muito jovem pra participar disso aqui?

— Por que todo mundo me pergunta isso? Não acha que esse assunto não te diz respeito?

— Quanta agressividade! Desculpe-me, só quis ser simpático e ajudar.

— Não pedi sua ajuda. Não atrapalhe minha concentração. Sei que sou capaz.

— Vi como tratou aquele guarda na entrada. Ele mereceu, mas não é qualquer um que falaria assim com um guarda real.

— Falo assim com qualquer imbecil que se coloque entre eu e meus objetivos.

— Se for tão bom quanto é arrogante, terei um valioso adversário! Minhas desculpas se o incomodei — Aprumou-se olhando para frente.

— Contanto que fique calado daqui em diante, desculpas aceitas — rosnou Kilayra. "E que tire esse sorriso estúpido da cara", pensou, mas não externou.

— Desejo-lhe boa sorte, rapaz! Mas que não seja maior que a minha!

Os locais reservados aos expectadores estavam todos tomados. Aqueles que foram deixados às outras cortes das Terras Aliadas, também. O rei havia tomado providências mágicas para cobrir o local e proteger do calor todos os assentos. Os sóis alinhados provocam calor insalubre. Apenas o vão que havia na arena estava completamente descoberto. Os competidores estavam agora bem no centro, de frente para a família real de Montherran. Os clarins cortaram o ar. Reverências feitas por todos ao rei, que acabara de levantar. Difícil com tantas pessoas presentes, mas o silêncio foi absoluto.

— Esta disputa é de suma importância — quebrondo a ausência de sons. — Quero o melhor entre os melhores. Este será o meu chefe da guarda e meu protetor mais honrado. Espero que todos estejam preparados para a responsabilidade, afinal um de vocês será o primeiro cavaleiro real, do primeiro reino das Terras Aliadas. Num tempo onde a guerra não é mais um perigo iminente e o mal que nos cerca é intangível, como já dizem os feiticeiros! Espero que o jovem ganhador deste torneio seja um leal protetor e amigo. Saiba que será uma imensa honra que me acompanhe para o resto de meus dias e dos seus. Está iniciado o torneio e que vença o melhor! — Lucas sentou-se, os clarins tocaram marcando o fim do discurso e o início dos jogos.      

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E que os jogos comecem!
Votos, comentários e indicações continuem!

Aquele Abraço,



A Senhora do Caos - A Viajante e o DragãoWhere stories live. Discover now