Capítulo 6

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A escola deu início às férias que viabilizaria adequadamente a reforma. Os alunos que ficaram em recuperação somente poderiam participar das aulas extras em meados de janeiro. Mas essa realidade não afetaria Joice, Vivi ou mesmo Rodrigo. Eles haviam conseguido aprovação escolar ao final do período, sem maiores dificuldades. A média que atingiram era mais do que suficiente. Os danos que o incêndio causou foram incontáveis. Os extintores foram todos substituídos. Todavia, Joana, a tia de Vivi e diretora da instituição, seria capaz de jurar que todos estavam carregados e dentro da validade. Ela tinha inclusive as notas fiscais de todas as recargas efetuadas. A única explicação que se encontrou foi a de que um, ou um grupo de alunos poderiam tê-los esvaziado por vandalismo. Interessante seria descobrir, onde? Esvaziar um extintor era algo difícil de ser escondido!

Nesse último mês os sentimentos de Joice quase entraram em colapso. Ela vivia dois lados opostos e conflitantes, sentia culpa pela felicidade que vivenciava. Como poderia ser tão feliz numa época que sua mãe atravessava a pior dor de sua vida? E ainda por cima, uma dor que compartilhava com ela: a perda de seu amado pai. Havia também a decepção que causara a Vivian, sua amiga de infância.

O mês de dezembro passava tão rápido que nem percebia os dias avançando. Possivelmente alguém estava girando a roda do tempo mais rápido e com isso acelerando o ritmo da vida de todos. Férias eram sempre boas demais! As provas das faculdades que tinha escolhido haviam terminado e ainda aguardava o resultado de algumas. Esperaria que o da segunda fase fosse divulgado, para ter o resultado oficial em janeiro. Havia prestado vestibulares em várias universidades públicas. A prioridade era passar na Unicamp e estudar ciências biológicas e talvez depois fizesse uma pós ou mestrado em biotecnologia. No mês de dezembro tudo sempre parecia mais fácil, vinha cheio de promessas de um ano novo, com tudo novo. Fazer planos para o futuro parecia mais divertido, mais tangível. Entretanto naqueles dias o "tudo" não era exatamente peculiar. As festas de fim de ano passaram sem serem festejadas apropriadamente, mas foi tudo que conseguiu.

Janeiro chegou e avançou rápido. O pai de Joice estava desaparecido a mais de quarenta dias, a esperança de que ele retornaria era mínima. Os sequestradores não mandaram nenhum pedido de resgate, deixando claro que realmente não existia sequestrador algum. Ele tinha simplesmente desaparecido. Algo em seu íntimo permanecia repetindo que ele ainda estava vivo. Mas não havia se convencido se esse sentimento era real ou apenas um desejo do seu coração. Essa vontade enorme de que ele estivesse bem atrapalhava o seu raciocínio lógico, misturando dentro de sua mente, razão, emoção, desejo e esperança. A polícia arquivou o caso por falta de pistas e colocaram-no na lista de desaparecidos. Havia, oficialmente, entrado para o grupo de homens que sai para "comprar cigarro e nunca mais retorna". Sua mãe tinha certeza do sequestro, mas isso era compreensível, uma vez que não haveria como, aquela mulher aceitar o fato de ser abandonada pelo grande amor de sua vida. Essa ideia era mesmo perturbadora, diria que até mesmo inconcebível. Joice aprendeu a respeitá-la nesse último mês por sua força, coragem e determinação. A moça acreditava que de certa forma sua mãe estava certa: seu pai não poderia tê-las abandonado daquela maneira. Mas, ao contrário de Raquel, também cogitava a possibilidade de que ele estivesse mesmo morto. Preferiria isso a crer que ele as havia abandonado deliberadamente. Mas como convencer disso o coração e retirar dele a esperança que ainda pulsava de que havia chance? Era bom acreditar que o tempo não seria problema. Ele poderia ter sofrido algum acidente e permanecido inconsciente. Poderia ter sido acometido por um episódio de perda repentina de memória. Existiam tantas incertezas até ali e nada de concreto afinal. Ela preferiu parar com as adivinhações e desejou que ele estivesse vivo e bem. Ainda que tivesse realmente ido embora e não as quisesse mais em sua vida, era preferível poder odiá-lo por isso do que descobrir que jamais o veria novamente.

A Senhora do Caos - A Viajante e o DragãoWhere stories live. Discover now