Capítulo 2 - Miguel

15.6K 1.2K 64
                                    

O dia já tinha começado perfeito, pra não dizer outra coisa. Meu irmão tinha descoberto umas furadas na contabilidade do morro.

Ele me mostrou toda aquela papelada logo cedo me enchendo a cabeça com os problemas que eu teria que resolver.

- Tá na cara que estão fazendo caixa dois irmão. Não tem outra explicação. - João Vitor falou.

Ele era mais novo que eu dois anos, ele era o cérebro da família, enquanto eu sou os músculos.

- Sim, o foda é descobrir quem tá metido nisso. Não posso chegar lá na boca acusando geral, sabe que isso acabaria comigo.

Se eu começasse a apontar o dedo pra todo lado não ia sobrar um parça que me apoiasse quando eu precisasse, duvidar de geral era perigoso e meu pai tinha me ensinado aquilo.

- Eu sei, eu sei! - ele jogou mais um papel na minha frente e se virou pro fogão. - Mas você tem que dar um jeito nisso, ou vai ficar no prejuízo.

Cocei minha cabeça sabendo que ia ser um longo dia.

- Porra, nem em uma quinta-feira a gente tinha sossego!

Eu estava afim de pensar só no bailão na sexta, mas agora tinha que me preocupar com esses comédia me roubando.

Ouvi passinhos pela casa e me virei a tempo de ver o Juninho chegando na mesa, o muleque ainda estava sonolento, também era só oito da manhã e ele costumava acordar lá pras dez.

- O que tá fazendo acordado pequeno?

- Sadelo. - ele resmungou coçando os olhinhos e esticou os braços pra mim.

- Outro pesadelo hein? - Vitor falou chegando perto e sacudindo a cabeleira loira dele. - Vou fazer um leite pra você.

Juninho tinha três anos e nossa mãe morreu dando a luz a ele.

Dona Lúcia já estava toda decepcionada da vida depois de perder o marido.

Meu pai, Pezão como era conhecido aqui no morro, morreu numa troca de tiros com a polícia, ele nem fazia ideia que estava deixando três filhos pra trás e não dois.

Aquele dia teve muitas perdas no complexo todo, foi aí que o morro do Adeus passou pras minhas mãos. Eu já acompanhava meu pai em todos os bagulhos e sabia como desenrolar com todos os outros chefes dos morros em volta.

Mas ali também passou a responsa de cuidar da minha família. A minha mãe grávida, meu irmão que tava terminando a faculdade de direito e o pequeno que tava por vir.

- Toma seu leite, que vou te deixar na dona Isabel.

- Eu não que, ela chata. - ele resmungou já agarrando a mamadeira.

Vitor e eu rimos, dona Isabel era chata desde que nós éramos crianças e não tinha melhorado com o tempo. Mas era a única pessoa que confiamos em deixar muleque.

Depois de muito Juninho reclamar e me fazer prometer comprar um doce pra ele consegui descer até a boca.

Vitor tava comigo, era meu braço direito além de contador e investidor da parada toda. Ele sabia bem como lavar dinheiro pra gente poder investir nas coisas que os grã fino investia. Assim mesmo se um dia a casa caísse a gente tinha grana suficiente pra viver com esses investimentos malucos.

Eu não entendia nada disso, tinha largado a escola e acompanhado meu pai. Desde cedo o velho dizia que eu tinha que aprender com a rua.

Quando Vitinho nasceu ele mudou a cabeça e disse que era pro garoto estudar, mesmo sem querer porque íamos precisar de um que soubesse resolver as parada jurídica.

Os Chefes do MorroUnde poveștirile trăiesc. Descoperă acum